Autor
Resumo
INTRODUÇÃO
A educação, enquanto prática social historicamente constituída, tem atravessado gerações e se reconfigurado constantemente, especialmente diante da incorporação progressiva de Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDIC) aos processos de ensino e aprendizagem. Evidentemente, os métodos educacionais empregados na atualidade diferem substancialmente daqueles utilizados em períodos anteriores, e, considerando o ritmo acelerado das transformações tecnológicas, é plausível afirmar que novas formas e modelos de ensino seguirão emergindo, sobretudo no contexto da Educação a Distância (EaD).
Nesse cenário de transformações, o surgimento de ambientes imersivos e tridimensionais, como o metaverso, destaca-se como uma inovação disruptiva com potencial de impactar profundamente o campo educacional. A popularização do termo “metaverso” ganhou notoriedade global a partir de 2021, quando a empresa Facebook, ao anunciar sua mudança de nome para Meta, sinalizou interesse estratégico no desenvolvimento dessa nova plataforma digital. Desde então, outras corporações tecnológicas de grande porte, como a Microsoft, também passaram a investir nesse ecossistema virtual, reconhecendo seu potencial em diversas áreas do conhecimento.
Atualmente, o metaverso tem sido explorado em múltiplos contextos, incluindo jogos online, treinamentos corporativos e simulações em ambientes profissionais. Diante de sua alta qualidade imersiva e de sua versatilidade de aplicação, o metaverso se apresenta como uma promissora ferramenta de mediação pedagógica, especialmente no âmbito da EaD. Por isso, torna-se imprescindível compreender seus fundamentos, suas aplicações e suas possíveis contribuições para os processos educacionais mediados por TDIC.
A realização de uma pesquisa exploratória em bases digitais de dados acadêmicos evidenciou a escassez de publicações científicas em língua portuguesa que tratem, de forma sistematizada, sobre a utilização do metaverso como recurso didático na EaD. Essa lacuna justifica e motiva a produção deste artigo, que visa contribuir para o debate educacional, trazendo à luz reflexões sobre como o metaverso pode transformar a experiência de ensino-aprendizagem a distância. É esperado que, nos próximos anos, essa tecnologia esteja cada vez mais integrada ao cotidiano educacional, sendo a modalidade a distância uma das mais beneficiadas por seus recursos imersivos e interativos.
Diante desse contexto, torna-se urgente que os profissionais da educação, em especial os docentes atuantes na EaD, estejam preparados e atualizados quanto às potencialidades do metaverso, para que possam utilizá-lo de forma crítica e criativa como ferramenta de mediação pedagógica. Assim, este estudo propõe uma revisão narrativa da literatura disponível, abordando tanto autores consagrados quanto produções recentes, com o objetivo de identificar os principais conceitos, desafios e práticas associadas ao uso do metaverso na educação a distância.
METODOLOGIA
Para alcançar os objetivos propostos neste estudo e analisar o metaverso enquanto ferramenta de mediação pedagógica na Educação a Distância (EaD), optou-se pela realização de uma revisão narrativa da literatura, fundamentada em pesquisa bibliográfica. Conforme exposto por Carvalho et al. (2021), a pesquisa bibliográfica é uma abordagem metodológica eficaz no levantamento e na sistematização de informações já disponíveis sobre determinado tema, permitindo uma análise crítica e aprofundada. Nesse mesmo sentido, Mascarenhas (2018) ressalta que esse tipo de investigação tem como foco a análise de materiais publicados, como livros, artigos científicos e dissertações, o que possibilita acesso a um amplo conjunto de dados e perspectivas teóricas.
A escolha por essa abordagem justificou-se pela necessidade de mapear e discutir os principais conceitos relacionados ao metaverso e sua aplicabilidade educacional, especialmente em ambientes virtuais de aprendizagem. Assim, a pesquisa baseou-se na coleta e análise de publicações científicas e fontes oficiais, como documentos institucionais do Ministério da Educação (MEC), além de materiais encontrados por meio de buscas nos portais Google, Google Acadêmico e SciELO.
Foram utilizados os seguintes descritores para a busca de conteúdos: “metaverso”, “EaD”, “educação a distância”, “ciberespaço” e “ferramenta de mediação”. Como critério de seleção, priorizou-se a inclusão de produções científicas recentes, publicadas por autores reconhecidos nas áreas de educação e tecnologias digitais, de modo a garantir a atualidade e a relevância do conteúdo analisado. No entanto, também foram considerados estudos clássicos e publicações de referência que contribuíram significativamente para a consolidação teórica da temática.
A seleção do material foi realizada com base em sua pertinência ao tema, sua qualidade metodológica e seu alinhamento com os objetivos desta pesquisa. Assim, compuseram o corpus do estudo livros, artigos acadêmicos, dissertações, documentos institucionais e textos disponíveis em domínio público, considerados relevantes para a discussão proposta.
A análise dos dados coletados deu-se por meio de leitura crítica e interpretação qualitativa dos textos selecionados, permitindo a construção de uma base teórica sólida sobre o metaverso e sua potencialidade como recurso de mediação na Educação a Distância.
BREVE HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Conforme expõem Souza Júnior et al. (2019), os primeiros registros históricos da Educação a Distância (EaD) remontam ao século XVIII, em um contexto marcado pelas transformações oriundas da Revolução Industrial e da ascensão da burguesia, as quais intensificaram a demanda por qualificação profissional como forma de impulsionar o crescimento econômico. Nesse cenário, surgem iniciativas pioneiras nos Estados Unidos, como a de uma instituição localizada em Boston, que passou a divulgar cursos por correspondência. Ainda nesse período, o professor Caleb Phillips, em 1728, deu início à oferta de um curso de taquigrafia, cujos materiais eram enviados semanalmente pelos correios para alunos de diferentes localidades. Essa prática pioneira foi gradualmente replicada em diversos países, contribuindo para a disseminação da modalidade.
No contexto brasileiro, de acordo com Bleicher, Mello e Schuelter (2023), os primeiros indícios da EaD surgiram em 1904, com a criação das chamadas “escolas internacionais”, instituições privadas que ofereciam cursos por correspondência. Todavia, o grande marco nacional da EaD ocorreu em 1923, com a fundação da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro – a primeira emissora de rádio do país. Conforme destaca o Atlas Histórico do Brasil (2024), essa iniciativa foi fruto de uma pesquisa científica coordenada por Edgard Roquette-Pinto, cujo propósito era democratizar o acesso ao conhecimento por meio da difusão de conteúdos educativos e culturais à população em geral.
No que se refere à evolução das tecnologias comunicacionais, Santaella (2010) propõe a existência de cinco gerações tecnológicas que não seguem uma lógica de sucessão linear, mas coexistem e se interconectam, formando uma complexa rede de interações. A primeira geração é composta pelas tecnologias do reprodutível, como jornais, fotografias e cinema, baseadas em processos eletromecânicos. A segunda geração, denominada tecnologias da difusão, caracteriza-se pela transmissão de conteúdos via satélite, ampliando o alcance do rádio e da televisão. Já a terceira, das tecnologias do disponível, impulsionou a chamada “cultura das mídias”, com dispositivos portáteis voltados a públicos segmentados, viabilizando a mobilidade da informação.
A quarta geração, por sua vez, compreende as tecnologias do acesso, fortemente impulsionadas pelo advento do computador, da internet e das linguagens hipermidiáticas, favorecendo a interatividade em ambientes digitais – o chamado ciberespaço, que se configura como um espaço eletrônico que está simultaneamente em todo lugar e em nenhum. Por fim, a quinta geração refere-se às tecnologias da conexão contínua, protagonizadas pelas redes móveis e pela virtualização constante dos meios de comunicação e informação.
Ainda segundo Santaella (2010), essas transformações tecnológicas têm promovido o surgimento de novas subjetividades, em constante mutação, sendo potencializadas pela incorporação da inteligência artificial e pela evolução dos dispositivos móveis, elementos que tornam possível o acesso à informação em tempo real e em qualquer lugar, resultando em processos de aprendizagem ubíqua.
Diante desse panorama, torna-se evidente que a EaD tem passado por significativas mudanças ao longo do tempo, acompanhando o avanço dos meios de comunicação e das tecnologias digitais. Apesar das transformações, mantém-se fiel ao seu princípio fundamental de promover o processo de ensino-aprendizagem mesmo na ausência física entre professor e aluno. Conforme definição do Ministério da Educação (Brasil, 2023), EaD é a modalidade educacional em que discentes e docentes encontram-se fisicamente separados – seja de forma temporária, seja permanente –, podendo ser aplicada tanto na educação básica quanto na educação profissional e superior.
O ENSINO A DISTÂNCIA NO BRASIL CONTEMPORÂNEO
De acordo com Almeida (2023), o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) divulgou uma pesquisa abrangente com dados referentes ao período de 2011 a 2021, a qual revelou um expressivo crescimento de 474% na Educação a Distância (EaD) ao longo dessa década. No setor privado, observou-se que o número de ingressantes em cursos de graduação a distância superou aquele verificado na modalidade presencial, representando 50,7% do total de alunos matriculados em instituições privadas no referido período.
Em consonância com esses dados, Antonucci (2023) destaca que o Instituto Semesp, na edição de 2023 do Mapa do Ensino Superior, apontou um avanço significativo na infraestrutura da EaD, com o número de polos de apoio saltando de 15,4 mil, em 2018, para 46,6 mil em 2023. Já segundo Craide (2023), o Censo da Educação Superior 2022, também conduzido pelo Inep, indicou que, entre os 789,1 mil ingressantes em cursos de licenciatura naquele ano – considerando tanto instituições públicas quanto privadas – aproximadamente 81% optaram pela EaD, dentre esses, 93,7% dos matriculados em instituições privadas escolheram essa modalidade de ensino.
Tais dados evidenciam não apenas o crescimento exponencial da EaD, mas também sua importância estratégica na democratização do acesso à educação superior no Brasil. Nesse sentido, Moreno (2023) ressalta que a EaD tem ampliado as oportunidades de acesso ao conhecimento e ao ambiente acadêmico, surgindo como alternativa viável ao ensino presencial tradicional.
Entretanto, a expansão acelerada da modalidade trouxe à tona desafios significativos. Conforme apontam Carvalho et al. (2021), a atual dinâmica educacional é marcada por pressões tecnológicas, excesso de informações e exigências profissionais, exigindo do professor mais do que a simples transmissão de conteúdo, o modelo tradicional torna-se insuficiente diante da velocidade e da ubiquidade das tecnologias digitais, que são facilmente acessadas pelos estudantes.
Dentre os principais desafios enfrentados pela EaD, os mais recorrentes na literatura consultada foram a alta taxa de evasão escolar e a inconsistência na qualidade da mediação pedagógica. Mello et al. (2023) afirmam que, embora a EaD contribua para a inclusão e equidade no acesso à educação, a modalidade apresenta índices preocupantes de evasão, que podem alcançar até 50% em determinados cursos, o autor Rua (2010 apud Mello et al., 2023) identifica os fatores sociais como determinantes para o abandono dos estudos nessa modalidade.
Outro aspecto crítico é a garantia da qualidade do ensino. Bielschowsky (2018) observa que, apesar da existência de instituições bem estruturadas, o desempenho dos estudantes da EaD no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), no ciclo de 2015 a 2017, foi insatisfatório. Entre os possíveis motivos estão a fragilidade da conexão entre o aluno e a instituição, a baixa qualidade dos materiais didáticos, a ausência de suporte pedagógico adequado e a precariedade dos polos presenciais de apoio.
Diante desse cenário, torna-se urgente o desenvolvimento de estratégias que visem enfrentar tais desafios e promover uma EaD de qualidade. Para Pereira (2021), é fundamental investir na criação de ferramentas voltadas ao ambiente virtual de aprendizagem, bem como capacitar alunos e professores para utilizá-las de forma eficaz, promovendo, assim, o crescimento pessoal, acadêmico e profissional dos envolvidos.
DEFINIÇÃO DE METAVERSO
De acordo com Geremias (2020), com base em estudos recentes promovidos pelo Fórum Econômico Mundial, realizado em Genebra, na Suíça, observou-se que cerca de 30% dos profissionais atualmente empregados atuam em ocupações que sequer existiam há uma década. Projetando esse cenário para o futuro, a expectativa é de que 65% da força de trabalho esteja inserida em funções ainda inexistentes nos dias atuais. Esses dados revelam, de forma contundente, a urgência da adaptação das práticas educacionais frente às transformações tecnológicas e às novas demandas do mercado globalizado.
Nesse contexto, o uso de ferramentas digitais para mediação do ensino e da aprendizagem assume papel essencial, especialmente na Educação a Distância (EaD). Entre as tecnologias mais promissoras que emergem nesse cenário está o metaverso, uma inovação que se alinha à cibercultura contemporânea e ao cotidiano dos estudantes, cada vez mais conectados digitalmente (MarqueS, 2024).
Antes de compreendermos propriamente o conceito de metaverso, é necessário revisitar alguns conceitos fundamentais como realidade, virtualidade e cibercultura. Geremias (2017) destaca que a percepção humana é suscetível a ilusões que confundem o real com o simulado. Essa concepção é ilustrada na célebre cena do filme Matrix (1999), em que o personagem Morpheus questiona: “O que é real? Como se define real? Se você se refere ao que pode sentir, cheirar, provar e ver, então o real são apenas sinais elétricos interpretados pelo seu cérebro” (Marcello, 2023).
Segundo Marques (2024), o mundo real pode ser compreendido como o espaço físico e tangível em que vivemos, enquanto Rezende (2020) define o mundo virtual como um ambiente simulado digitalmente, criado com o intuito de reproduzir experiências reais e expandir as possibilidades de interação e comunicação. Este ambiente virtual, também conhecido como ciberespaço, é compreendido como um espaço onde ocorrem interações simbólicas, sociais, econômicas e educacionais por meio da tecnologia digital.
O autor Santos (2003) afirma que o ciberespaço não se limita a ser uma mídia ou um canal de comunicação; trata-se de um ambiente complexo que integra múltiplas mídias e interfaces, constituindo um ecossistema global de aprendizagem e interações sociotécnicas, assim, o ciberespaço permite a construção de comunidades virtuais formadas com objetivos específicos, incluindo os educacionais.
Do ponto de vista filosófico, Marilena Chauí (2014) problematiza os impactos da tecnologia na nossa compreensão de espaço e tempo. A filósofa afirma que as tecnologias digitais comprimem o espaço em um “ponto” (atopia) e o tempo em um “instante” (acronia), gerando crises existenciais, uma vez que somos seres que existem espacial e temporalmente. Essa compressão, segundo a autora, leva à desincorporação do sujeito no ambiente digital, permitindo que sua presença se estenda indefinidamente no ciberespaço, como uma forma de imortalidade virtual.
Sobre o tema, a filósofa explica:
[…]não faz sentido falar de “realidade virtual”, uma vez que, filosofica-mente, o virtual representaria potencialidades latentes na sociedade, logo, oposição ao conceito de “real”. Além disso, de acordo com a filó-sofa, a internet também alterou o sentido de “virtual”, o qual não se opõe mais ao real, mas ao atual, que sempre pode ser atualizado. É algo que existe sem estar presente em um tempo e em um espaço determi-nado, afirmando que a acronia e a atopia são suas formas de existência (Em conferência, 2014).
O autor Lévy (2011) contribui com a concepção de que o virtual não se opõe ao real, mas sim ao atual. Para ele, o virtual é uma potência, um conjunto de possibilidades que pode vir a se realizar sem, necessariamente, se concretizar de forma tangível. Esse conceito amplia a noção de tempo e espaço, possibilitando novas experiências interativas e educativas em contextos digitais. Mais recentemente, Lemos (2023) reafirma que a cibercultura deve ser compreendida como fruto da integração entre aspectos sociais e tecnológicos, sendo o termo mais atual para essa realidade a “cultura digital”. Isso reforça que as tecnologias não são neutras, mas moldadas pelas práticas sociais e, ao mesmo tempo, moldam essas práticas.
Abordando sobre o tema, Geremias (2020) observa, ainda, que a forma como os indivíduos percebem a diferença entre o real e o virtual varia de acordo com sua geração. Para os nascidos entre 1940 e 1979, há uma clara separação entre esses dois mundos. Já para aqueles nascidos após 1980, essa distinção começa a se diluir, uma vez que acompanharam a evolução tecnológica. Para os nascidos após 1990, o mundo virtual já é considerado tão real quanto o físico, sendo parte do cotidiano em atividades como compras on-line, interações sociais por meio de avatares ou reuniões em ambientes de realidade virtual.
Nesse sentido, Medeiros Filho (2018) define a realidade virtual como uma interface tecnológica que recria sensações do mundo físico em ambientes computacionais. Essa tecnologia utiliza dispositivos como óculos de realidade virtual e fones de ouvido para oferecer experiências imersivas em áreas como treinamentos, jogos, simulações e, especialmente, na educação. Já a realidade aumentada, segundo o mesmo autor, consiste na sobreposição de informações digitais ao ambiente físico real, proporcionando uma visão híbrida que pode ser aplicada na visualização de protótipos, catálogos interativos e experiências educacionais inovadoras.
Enquanto Pereira (2009) afirma que, assim como o termo ciberespaço foi essencial para definir os primeiros ambientes virtuais da internet, o conceito de metaverso tornou-se central para a construção de espaços digitais imersivos, voltados para a interação social, a economia e a cultura digital. Já Garcia (2023) explica que o termo metaverso surgiu pela primeira vez na literatura de ficção científica, no livro Snow Crash, de 1992, escrito por Neal Stephenson. Nessa obra, os personagens acessam um universo digital para escapar de uma realidade distópica. Kovacs (2024) complementa que o termo é uma junção de “meta” (além) e “universo”, indicando um espaço que transcende o mundo físico. Outra referência importante é o romance Ready Player One, de Ernest Cline, que foi adaptado para o cinema em 2018 por Steven Spielberg. No filme, os personagens vivem em um ambiente virtual chamado OASIS, onde interagem por meio de avatares, expressando liberdade de identidade e socialização.
Segundo Rodrigues (2023), o metaverso pode ser definido como um universo hiper-realista e tridimensional, compartilhado por múltiplos usuários em tempo real, onde é possível interagir por meio de avatares personalizados. O metaverso pode ser classificado em dois tipos: centralizado e descentralizado. No modelo centralizado, o ambiente é controlado por empresas, como é o caso dos jogos Second Life, Fortnite e do metaverso da empresa Meta, nesses espaços, os desenvolvedores e empresas parceiras possuem o controle do conteúdo e das interações, visando principalmente fins lucrativos.
Em 2021, o conceito de metaverso ganhou destaque global quando a empresa Facebook passou a se chamar Meta, sinalizando sua nova missão de investir fortemente nesse universo digital (Garcia, 2023). Segundo Machado (2022), até 2022, a Meta já havia investido mais de US$ 50 milhões no desenvolvimento de tecnologias para o metaverso, além dela, empresas como Microsoft, Roblox Corporation e Epic Games também investem significativamente em soluções como Microsoft Mesh, visando integrar experiências imersivas com produtos como o Microsoft Teams.
Conforme sintetiza o blog da Pixit (2022), o metaverso representa a fusão de tecnologias como realidade aumentada e realidade virtual, elevadas a um novo patamar. Proporciona sensações imersivas e interativas em ambientes compartilhados, abrindo possibilidades vastas para os campos da educação, entretenimento, saúde, comércio e outras áreas. Andrade (2023) acrescenta que o metaverso pode ser compreendido como uma materialização tridimensional da internet, permitindo que os usuários não apenas naveguem, mas também habitem espaços digitais de maneira mais intensa, interativa e social.
O METAVERSO COMO FERRAMENTA DE MEDIAÇÃO NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM
O uso do metaverso na educação tem se mostrado uma alternativa inovadora e promissora para a mediação entre o ensino e a aprendizagem, de acordo com Freitas (2009), a formação docente inicial já deveria contemplar as transformações advindas do mundo digital e da cibercultura, promovendo ações concretas voltadas à inclusão digital tanto de professores quanto de estudantes. A autora destaca que a internet ampliou significativamente a produção textual dos discentes, facilitando a pesquisa e o compartilhamento de conteúdos, promovendo, assim, um novo paradigma na construção do conhecimento.
Historicamente, criou-se uma distinção entre nativos e imigrantes digitais, conceito formulado por Marc Prensky e discutido por Pescador (2010), para referir-se, respectivamente, àqueles que nasceram imersos nas tecnologias digitais e aos que se adaptaram a elas ao longo da vida. Os nativos digitais estariam mais familiarizados com o uso da internet, redes sociais, jogos online e dispositivos móveis como ferramentas naturais de interação e aprendizagem, enquanto os imigrantes digitais, geralmente professores e profissionais mais experientes, enfrentam desafios de adaptação a essas novas práticas tecnológicas.
Contudo, autores como Oliveira et al. (2016) propõem uma abordagem mais integrativa por meio da chamada “integração intergeracional”, que reconhece a importância da troca de saberes entre gerações, valorizando a experiência dos pioneiros e a fluência tecnológica dos mais jovens. Na mesma linha, Heinsfeld e Pischetola (2018) argumentam que é preciso superar a visão reducionista que categoriza gerações inteiras como digitalmente letradas apenas por sua data de nascimento, reforçando que o acesso desigual às tecnologias e a ausência de políticas públicas inclusivas ainda são barreiras significativas. As autoras defendem a importância de diferenciar habilidade técnica de letramento digital, destacando o papel da escola como mediadora crítica entre os sujeitos e as tecnologias de seu tempo.
Diante dessa nova realidade, os docentes de todos os níveis de ensino precisam urgentemente se inserir nessa cultura digital emergente. Geremias (2020) reforça essa perspectiva ao afirmar que a capacidade de adaptação se tornou uma das competências mais importantes da contemporaneidade, sendo imprescindível também para os educadores. Para ele, diante de um cenário de rápidas transformações tecnológicas, a adaptabilidade é essencial para a atuação pedagógica eficaz.
O metaverso, nesse contexto, surge como um campo fértil para reinvenção do processo educativo. Newman (2019) aponta que, em áreas como a medicina, a simulação de corpos humanos em ambientes virtuais pode substituir, em parte, a necessidade de corpos reais para o aprendizado, possibilitando experiências interativas, seguras e altamente eficazes. Clegg (2023), presidente de assuntos globais da empresa Meta, destaca que a tecnologia do metaverso é capaz de eliminar barreiras geográficas, promovendo ambientes de aprendizagem imersivos e colaborativos que reúnem alunos e professores de diferentes regiões em um mesmo espaço virtual.
Estudos citados por Clegg (2023) mostram que a realidade virtual promove uma aprendizagem mais significativa, com ganhos notáveis em termos de engajamento, retenção do conhecimento, motivação e foco. Um exemplo prático é o caso do Japão, onde mais de seis mil estudantes já utilizam a realidade virtual como parte integrante do processo de ensino. Também em uma escola da Geórgia (EUA), foi verificado que estudantes que utilizaram laboratórios virtuais de Química obtiveram melhor desempenho em comparação aos colegas do ensino tradicional.
No Brasil, o portal Sae Digital (2023) afirma que o metaverso já é uma tendência consolidada na educação. Ferramentas como realidade aumentada, gamificação, livros digitais e ambientes de aprendizagem imersivos estão sendo integrados progressivamente ao cotidiano escolar. Os alunos participam com avatares em salas de aula simuladas, podendo interagir com o conteúdo e entre si como se estivessem fisicamente presentes. No entanto, essa transformação exige reestruturações tanto nas instituições quanto nas práticas docentes, sendo essencial o desenvolvimento de habilidades específicas que possibilitem o uso pleno dessas ferramentas.
Ainda segundo o Sae Digital (2023), é fundamental que os professores compreendam e saibam aplicar a interseção entre o mundo físico e o virtual. O metaverso, como ferramenta de mediação pedagógica, propicia experiências imersivas, exigindo dos docentes um novo tipo de conhecimento técnico-pedagógico. Com isso, os estudantes deixam de ser apenas receptores passivos do conteúdo e passam a interagir ativamente com ele, vivenciando situações que intensificam o processo de ensino-aprendizagem.
De acordo com Murashima (2022), diretora de Gestão Acadêmica da FGV, cerca de 6% dos brasileiros já transitam por alguma forma de metaverso, e a educação tende a ser uma das áreas mais beneficiadas. A autora observa que o novo perfil dos estudantes exige práticas mais envolventes e experienciadas, e o metaverso pode oferecer essa vivência. Montini (2022) complementa ao afirmar que escolas e universidades brasileiras já estão elaborando projetos pedagógicos voltados à inserção do metaverso como ferramenta de mediação, com o objetivo de promover ambientes educativos mais interativos e tecnológicos.
Para Montini (2022), o avanço da educação está diretamente relacionado à preparação docente frente às transformações tecnológicas. É necessário desenvolver competências tanto estruturais quanto comportamentais, a fim de maximizar os benefícios que o metaverso pode oferecer. Leitão (2022) compartilha da mesma visão, ressaltando a importância de investir na formação docente para esse novo cenário, pois, como qualquer inovação tecnológica, o metaverso representa um caminho sem retorno.
Por fim, Kleis (2022) cita o exemplo da plataforma Roblox, que já oferece salas de aula interativas nas quais os professores podem construir cenários históricos, científicos ou culturais para ensinar de forma prática e atrativa. Nesses ambientes, os docentes mantêm o controle sobre as interações, podendo limitar comportamentos indesejados como o bullying, além de garantir a segurança dos alunos, dessa forma, o foco se volta inteiramente à aprendizagem, ampliando o potencial de uso pedagógico das tecnologias imersivas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante da análise apresentada, torna-se evidente que o metaverso representa uma ferramenta emergente de grande potencial para atuar como mediador no processo de ensino e aprendizagem, especialmente no contexto da Educação a Distância (EaD). Sua aplicação vai além de uma simples inovação tecnológica, pois possibilita a criação de ambientes educacionais imersivos, colaborativos e altamente interativos, promovendo maior engajamento e participação ativa por parte dos discentes. Essa tecnologia oferece aos estudantes não apenas o acesso ao conteúdo, mas a vivência prática de experiências educacionais personalizadas e mais significativas, o que contribui diretamente para o desenvolvimento de competências cognitivas e socioemocionais.
Além disso, o metaverso favorece uma abordagem pedagógica mais inclusiva, capaz de superar barreiras geográficas e temporais. Isso é especialmente relevante em um país com grandes desigualdades regionais como o Brasil, onde a democratização do acesso ao ensino de qualidade continua sendo um desafio. A possibilidade de reunir, em um mesmo espaço virtual, docentes e discentes de diferentes localidades permite a ampliação da diversidade cultural nas interações pedagógicas e o fortalecimento da equidade no ensino. A inclusão digital, portanto, torna-se um dos principais benefícios trazidos pelo metaverso, possibilitando que grupos historicamente marginalizados ou em situação de vulnerabilidade tenham acesso às mesmas oportunidades de aprendizagem.
A articulação entre cibercultura, tecnologias imersivas e EaD configura um novo paradigma educacional, que rompe com os modelos tradicionais baseados na transmissão unilateral do conhecimento. Nesse sentido, o metaverso surge como um campo fértil para a construção de práticas pedagógicas mais horizontais, nas quais o estudante assume um papel de protagonismo e o professor se torna um mediador do conhecimento. Essa mudança de postura demanda não apenas infraestrutura tecnológica adequada, mas também investimentos na formação continuada dos docentes, para que estejam aptos a utilizar essas ferramentas de forma crítica, criativa e eficiente.
O advento da pandemia de covid-19, conforme amplamente noticiado, evidenciou a importância da tecnologia para a continuidade do ensino em situações de crise. Ferramentas digitais foram fundamentais para a manutenção das atividades escolares durante o período de isolamento social. Assim, o metaverso pode ser compreendido como uma evolução dessas ferramentas, com potencial ainda maior de transformar a maneira como o ensino é concebido e praticado. Em contextos futuros de emergência, como novas pandemias ou desastres naturais, sua utilização poderá garantir não apenas a continuidade, mas a qualidade da aprendizagem.
Ainda que, atualmente, o metaverso possa parecer uma realidade distante para parte da população, é preciso reconhecer que, como toda tecnologia disruptiva, ele tende a se popularizar rapidamente. Os alunos das novas gerações, mais conectados e familiarizados com o mundo digital, estão preparados para absorver essa ferramenta com naturalidade. Cabe, portanto, às instituições educacionais, aos gestores e aos educadores se anteciparem a essa transformação, desenvolvendo competências e estratégias adequadas para integrá-la ao processo educacional de forma significativa.
Grandes empresas de tecnologia, como a Meta, têm investido massivamente no desenvolvimento de plataformas voltadas ao metaverso, sinalizando que essa será uma tendência irreversível nos próximos anos. Diante disso, a Educação a Distância também deverá se reinventar, acompanhando a chamada EaD 5.0, uma proposta de ensino mais humanizado, interativo, inclusivo e centrado nas necessidades do estudante contemporâneo.
Como proposição para estudos futuros, recomenda-se a realização de pesquisas que acompanhem a evolução do metaverso enquanto ferramenta de mediação do ensino, observando sua aceitação entre professores e alunos, e investigando os impactos reais dessa tecnologia na qualidade da aprendizagem. Será necessário avaliar, com base em evidências científicas, se o uso do metaverso realmente contribui para a elevação do desempenho acadêmico e para a formação integral dos sujeitos. Só assim será possível afirmar, com segurança, que essa tecnologia não apenas transformou o ensino, mas marcou definitivamente o início de uma nova era na educação.
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