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Resumo
INTRODUÇÃO
A responsabilização ambiental comporta três acepções distintas, quais sejam, a responsabilização administrativa, penal e a civil. No presente artigo, o foco será dirigido à esfera administrativa deste tríplice responsabilização.
O presente estudo tem como objetivo central examinar o funcionamento do Processo Sancionador Ambiental (PSA) no âmbito federal, analisando seus princípios, estrutura e mecanismos de responsabilização aplicados aos infratores. A pesquisa busca avaliar a contribuição das sanções administrativas para a proteção ambiental e a dissuasão de condutas lesivas ao meio ambiente, bem como a efetividade desse instrumento dentro do arcabouço normativo brasileiro.
A análise se insere no contexto da Lei nº 9.605/1998, que dispõe sobre crimes ambientais, com especial enfoque no papel desempenhado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) na condução do PSA. Dessa forma, serão investigados os critérios e procedimentos adotados na aplicação das sanções administrativas e seus impactos na preservação ambiental.
A pesquisa também se propõe a averiguar os principais desafios associados à aplicação das sanções ambientais, tais como a morosidade processual, a complexidade normativa e as dificuldades inerentes à fiscalização e execução das penalidades. Além disso, será avaliada a questão da segurança jurídica para os administrados, considerando o equilíbrio necessário entre a proteção ambiental e os direitos dos investigados.
A efetividade do PSA será abordada sob a perspectiva de sua capacidade de prevenção e repressão das infrações ambientais, com a análise do impacto das sanções aplicadas, da taxa de cumprimento das penalidades e do papel dos órgãos ambientais na fiscalização. Paralelamente, discutir-se-á a necessidade de aprimoramento desse processo, propondo medidas para torná-lo mais célere, transparente e equitativo.
Por fim, espera-se que este estudo contribua para o debate sobre a importância do PSA no contexto da governança ambiental no Brasil, fornecendo subsídios para o aperfeiçoamento do sistema sancionador e para a formulação de estratégias que garantam a efetividade das sanções, a preservação do meio ambiente e o desenvolvimento sustentável.
FUNDAMENTOS JURÍDICOS DO PROCESSO SANCIONADOR AMBIENTAL
Atribui-se o nome do processo administrativo sancionador ao rito da administração pública em prover a responsabilização administrativa (ambiental) ao administrado decorrente de suas condutas e atividades que transgrediram as normas, cabendo a ele a aplicação de sanções (Schmitt, 2015). O objetivo da responsabilidade administrativa ambiental é fazer com que as irregularidades ambientais sejam apuradas e punidas na própria esfera administrativa, sem necessariamente recorrer ao Poder Judiciário (Farias, 2018).
No Brasil, o PSA tem seus fundamentos iniciais em diversos dispositivos jurídicos que estabelecem normas e diretrizes para a responsabilização de infratores ambientais. A Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/1988), em seu artigo 225, impõe ao poder público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Esse dispositivo inaugurou a base para a responsabilização ambiental, o que inclui a aplicação de sanções administrativas como forma de coibir práticas lesivas à natureza (Brasil, 1988).
A mesma CRFB/1988 estabelece que o dever de fiscalizar e aplicar as sanções é cabível aos órgãos governamentais por meio de seu poder sancionador, conforme art. 225, § 3º “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados” (Brasil, 1988).
Além da Constituição, a Lei nº 9.605/1998, designada como Lei de Crimes Ambientais, é um dos principais instrumentos normativos que regulamentam a aplicação de sanções administrativas, civis e penais em matéria ambiental. Embora a lei trate amplamente das infrações ambientais e das penalidades aplicáveis, ela não disciplina de forma detalhada o PSA. No entanto, estabelece diretrizes gerais sobre as infrações administrativas ambientais e as respectivas sanções, que são aplicadas dentro de um processo administrativo conduzido pelos órgãos ambientais competentes.
Em seu artigo 70, a norma define infração ambiental como “toda ação ou omissão que viole as normas jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente” (Brasil, 1998), ao mesmo tempo em que indica as autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo próprio, quais sejam: órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA, designados para as atividades de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da Marinha.
Dessa forma, a legislação confere aos órgãos ambientais, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), a competência para instaurar e conduzir processos sancionadores. Isso porque, em momento prévio, a Lei nº 6.938/1981, reconhecida por instituir a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA) e a Lei nº 7.735/1989 que cria o IBAMA, destacaram para o instituto a função de órgão executor.
Conforme disposto na Lei nº 6.938, de 1981:
IV – órgãos executores: o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – Instituto Chico Mendes, com a finalidade de executar e fazer executar a política e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente, de acordo com as respectivas competências. (Redação dada pela Lei nº 12.856, de 2013).
Já a Lei nº 7.735, de 1989, estabelece:
Art. 2º É criado o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, autarquia federal dotada de personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de: (Redação dada pela Lei nº 11.516, 2007).
I – exercer o poder de polícia ambiental; (Incluído pela Lei nº 11.516, 2007)
II – executar ações das políticas nacionais de meio ambiente, referentes às atribuições federais, relativas ao licenciamento ambiental, ao controle da qualidade ambiental, à autorização de uso dos recursos naturais e à fiscalização, monitoramento e controle ambiental, observadas as diretrizes emanadas do Ministério do Meio Ambiente; e (Incluído pela Lei nº 11.516, 2007).
A normatização específica do PSA ocorre no Decreto nº 6.514/2008, que regulamenta as infrações administrativas ambientais e estabelece os procedimentos para a aplicação das penalidades. O decreto detalha as etapas do processo sancionador, desde a lavratura do auto de infração até a decisão final, garantindo ao infrator o direito ao contraditório e à ampla defesa, conforme previsto no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal Brasileira.
A Lei Complementar nº 140/2011 (LC 140/2011), reforça e complementa os dispositivos da CRFB/1998 no que tange à regulamentação das competências comuns dos entes federativos na fiscalização ambiental. Essa lei contribuiu significativamente para a organização do PSA quando estabeleceu a repartição de competências entre os entes federativos para a fiscalização e a aplicação de sanções ambientais no Brasil com definição mais clara das atribuições.
As disposições contidas no artigo 17 da LC 140/2011, impedem a sobreposição de autuações por diferentes órgãos ambientais, conferindo maior segurança jurídica, celeridade e eficiência ao PSA quando estabelece que as infrações devem ser apuradas pelos entes competentes dentro de suas esferas de atuação. Essa diretriz evita a morosidade causada por disputas entre os entes federativos e melhora a eficácia da punição dos infratores.
No âmbito da estrutura do IBAMA, a portaria nº 92/2022 reconhece uma unidade organizacional específica para tratar do PSA, o Centro Nacional do Processo Sancionador Ambiental – CENPSA, com atribuições de supervisionar as atividades inerentes à instrução de processos de apuração de infrações ambientais, desenvolver e apresentar plano nacionalizado e continuado de capacitação para os servidores, normatizar os procedimentos de apuração.
O procedimento para apuração das infrações ambientais é organizado em etapas na Instrução Normativa nº 19/2023 (IN 19/2023), a qual define o objetivo do processo sancionador como instrumento de repressão a ilícitos ambientais que visa a apuração de toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente, a determinação das responsabilidades administrativa e civil e a imposição de sanções administrativas.
Todas essas normas dialogam com a Lei nº 9.784/1999, que regula e estabelece os princípios e regras gerais do processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, incluindo aqueles de natureza sancionadora. No contexto do PSA, a IN nº 19/2023 do IBAMA segue as disposições da Lei nº 9.784/1999, garantindo que a apuração de infrações ambientais seja conduzida em consonância com os princípios da Administração Pública.
Portanto, os fundamentos jurídicos do PSA estão alicerçados na Constituição Federal, em leis, decretos e instruções normativas, bem como nos princípios do direito administrativo sancionador. Esses elementos normativos buscam a garantia a efetividade das sanções aplicadas e reforçam a importância desse instrumento para a proteção do meio ambiente e a promoção do desenvolvimento sustentável.
ETAPAS DO PROCESSO SANCIONADOR AMBIENTAL
O PSA constitui um instrumento essencial para a aplicação das normas ambientais no Brasil, garantindo a responsabilização administrativa por infrações cometidas contra o meio ambiente. Para cada infração ou irregularidade ambiental identificada o órgão competente deverá impor a sanção administrativa ambiental correspondente, podendo ser aplicadas duas ou mais sanções de forma simultânea, de acordo com a previsão normativa (Schmitt, 2015; Farias, 2018). O trabalho de Strapazzon (2024), destaca que no âmbito da gestão das Unidades de Conservação, o PSA constitui uma das mais importantes formas de materialização do dever fundamental de proteção ao meio ambiente instituído pelo Art. 225 da Constituição da República de 1988.
O procedimento para apuração das infrações ambientais pode ser organizado em quatro etapas: detecção, ação fiscalizatória, julgamento e execução das sanções (Schmitt, 2015), sendo que a primeira etapa da instauração do PSA ocorre com a lavratura do auto de infração, documento que formaliza a constatação da infração ambiental por autoridade competente. Conforme o art. 97 do Decreto nº 6.514/2008, o auto de infração deve conter informações essenciais, como: “identificação do autuado, a descrição clara e objetiva das infrações administrativas constatadas e a indicação dos respectivos dispositivos legais e regulamentares infringidos…
A IN nº 19/2023 reforça que a lavratura do auto deve ocorrer no momento da fiscalização ou após a análise documental que comprove a infração e, conforme Schmitt (2015), existem várias formas, técnicas e instrumentos para se detectar as infrações, dentre elas, o monitoramento ambiental, denúncias, investigação administrativa, atividade de inteligência, patrulhamento, postos de controle, sistemas informatizados para controle de produtos, entre outros.
Instaurado o PSA e após a notificação do autuado, este possui o prazo de 20 dias para apresentar defesa administrativa para contestar os fatos descritos, apresentar provas e argumentos jurídicos ou mesmo aderir a uma das soluções legais possíveis para o encerramento do processo. Superada a fase formação do processo e escoado o prazo para oferecimento da defesa, o procedimento administrativo segue para as fases de instrução, julgamento em primeira instância e julgamento em segunda instância/recursal, conhecidas como contencioso administrativo.
Caso o infrator não concorde com a primeira decisão, os Art. 126 e Art. 127 do Decreto nº 6.514/2008 admitem recurso administrativo no prazo de 20 dias a partir da notificação da penalidade aplicada. Para a IN 19/2023, o julgamento em segunda instância cabe aos servidores designados pelo presidente do IBAMA para essa função, ou ao próprio presidente do IBAMA que deverá, no caso de homologação da autuação, confirmar ou modificar o valor da multa dia, decidir o período de sua aplicação e consolidar o montante devido, para posterior cobrança e execução.
A regra geral é que não cabe recurso após a segunda decisão. No entanto, quando se tratar de decisão de segunda instância proferida em processo formado para apurar infração contra o patrimônio genético e o conhecimento tradicional associado, caberá um terceiro recurso ao Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), nos termos do Decreto nº 8.772, de 2016.
Na circunstância em que o autuado faça um pedido que vise desconstituir ou modificar o julgamento após a coisa julgada administrativa, tem-se a fase revisional, conforme o art. 120 da IN nº 19/2023. Para que seja considerado, o pedido revisional será processado em autos apartados para facilitar a operacionalização do processo administrativo que já estiver em fase de cobrança. Na sequência, serão analisados dois requisitos: que ele se fundamente em fatos novos ou que apresente circunstâncias relevantes para justificar a inadequação das sanções aplicadas.
Fora do contencioso, e para o breve encerramento do processo quanto à sanção pecuniária, o autuado tem a opção de adesão à solução legal, instituto previsto no Decreto 6.514/2008 e inserido no rito de apuração de infrações ambientais. Ao aderir a uma das soluções legais possíveis para o encerramento do processo, o autuado poderá escolher dentre as opções contidas no Art. 96, § 5º, II do Decreto 6.514/2008: pagamento da multa com desconto de trinta por cento (30%), parcelamento do valor integral da multa em até 60 vezes, ou conversão da multa em serviços de preservação, de melhoria e de recuperação da qualidade do meio ambiente. Destaca-se que para requerer adesão a uma das soluções legais o Art. 97-B do Decreto 6.514/2008 é exigente quanto aos deveres do autuado: a confissão irrevogável e irretratável do débito, a desistência de impugnação judicial ou administrativamente a autuação ambiental ou de prosseguir com eventuais impugnações ou recursos administrativos e ações judiciais e renúncia a quaisquer alegações de direito sobre as quais possam ser fundamentadas as impugnações e os recursos administrativos e as ações judiciais.
A legislação permite a conversão de multas em serviços de recuperação ambiental, conforme disposto nos artigos 142 e 142-A do Decreto nº 6.514/2008. Essa conversão pode ocorrer mediante proposta do infrator e aprovação do órgão ambiental.
Art. 142. O autuado poderá requerer a conversão de multa de que trata esta Seção até o momento da sua manifestação em alegações finais, na forma estabelecida no art. 122.
Art. 142-A. O autuado, ao pleitear a conversão de multa, deverá optar pela:
I – conversão direta, com a implementação, por seus meios, de serviço de preservação, de melhoria e de recuperação da qualidade do meio ambiente, no âmbito de, no mínimo, um dos objetivos previstos no caput do art. 140; ou
II – conversão indireta, com adesão a projeto previamente selecionado pelo órgão federal emissor da multa, na forma estabelecida no art. 140-B, observados os objetivos previstos no caput do art. 140.
Uma vez cumpridas as exigências e deferido o pedido, o interessado receberá um desconto que a autoridade ambiental concederá de acordo com o tipo de conversão, e a fase processual em que o autuado requereu, nos moldes do Art. 143 do Decreto nº 6.514/2008.
Art. 143. O valor dos custos dos serviços de preservação, conservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente será igual ou superior ao valor da multa convertida.
§ 1º Independentemente do valor da multa aplicada, o autuado fica obrigado a reparar integralmente o dano que tenha causado.
§ 2º A autoridade ambiental, ao deferir o pedido de conversão, aplicará sobre o valor da multa consolidada o desconto de:
I – quarenta por cento, na hipótese prevista no inciso I do caput do art. 142-A, se a conversão for requerida juntamente com a defesa;
II – trinta e cinco por cento, na hipótese prevista no inciso I do caput do art. 142-A, se a conversão for requerida até o prazo das alegações finais;
III – sessenta por cento, na hipótese prevista no inciso II do caput do art. 142-A, se a conversão for requerida juntamente com a defesa; ou
IV – cinquenta por cento, na hipótese prevista no inciso II do caput do art. 142-A, se a conversão for requerida até o prazo das alegações finais.
O PSA no Brasil segue um rito estruturado, garantindo que infrações ambientais sejam apuradas e penalizadas conforme os princípios da legalidade, ampla defesa e proporcionalidade. A combinação da Lei nº 9.605/1998, do Decreto nº 6.514/2008 e da IN nº 19/2023 têm o objetivo de possibilitar um processo administrativo mais eficiente e justo, contribuindo para a proteção ambiental e o desenvolvimento sustentável.
DESAFIOS NA APLICAÇÃO DO PROCESSO SANCIONADOR AMBIENTAL
A responsabilização administrativa ambiental inicia-se com a ação da fiscalização, que tem o papel de averiguar possíveis infrações às normas ambientais. Conforme o trabalho de Santos e Nunes (2022), a dissuasão pretendida pela ação coercitiva é a somatória das penalidades e restrições que podem ser impostas pela fiscalização ambiental aos infratores. Em complementação, para Schmitt (2015), mesmo havendo casos em que não foi constatada nenhuma infração, isso também é salutar, porque contribui para a percepção social de controle.
Caso seja constatada uma irregularidade, pode haver a lavratura de um auto de infração, resultando em penalidades como multas, embargos ou outras sanções previstas na legislação. É nesse momento que é realizada a intervenção para cessar ou mitigar o dano ambiental adotando medidas cautelares e orientativas como, embargo, suspensão de atividade, destruição de algum produto ou objeto que esteja dando continuidade ao dano e, notificando ao administrado a adotar outras medidas de sua responsabilidade (Schmitt, 2015).
No entanto, a autuação não implica punição imediata, pois deve ser submetida a um processo de instrução e julgamento. Nesse ponto, é importante frisar que o trabalho da instrução depende muito do conjunto probatório apresentado no relatório de fiscalização, que é definido pelo Art. 6º, XIII da IN 19/2023 como: documento que consolida os resultados da ação fiscalizatória e expõe a motivação das medidas dela decorrentes. Sobre essa abordagem, Santos e Nunes (2022), asseveram que inefetividade do PSA também é afetada pela baixa execução das etapas do processo de trabalho da fiscalização ambiental, comprometendo os seus resultados, principalmente nas etapas de julgamento, pagamento das multas e cumprimento das demais sanções administrativas.
Portanto, o primeiro desafio para uma correta instrução está nos elementos necessários para a peça de imputação de responsabilidade, cabendo, ao agente autuante apresentar informações mínimas, conforme Art. 85 da IN 19/2023:
Art. 85. A lavratura do auto de infração será detalhada em relatório de fiscalização, que conterá:
I – a data de ocorrência da infração;
II – a descrição das circunstâncias que levaram à constatação da infração ambiental e à identificação da autoria, que se baseia na demonstração da relação da infração administrativa com a conduta do autuado, comissiva ou omissiva, e indicação do elemento subjetivo;
III – o registro da situação por fotografias, vídeos, mapas, termos de declaração ou outros meios de prova;
III – os critérios utilizados para a fixação da multa ambiental;
IV – a caracterização preliminar do dano ambiental e dos responsáveis pela reparação;
V – a informação sobre a possibilidade de consideração de circunstâncias majorantes e atenuantes, devidamente justificada;
VI – quando realizada a apreensão:
a) as condições de armazenamento dos bens, e informações sobre eventual risco de perecimento;
b) circunstâncias que relacionam os bens com a infração;
c) informações sobre modificação ou adaptação dos bens para a prática de infrações;
d) critérios usados para definir os valores atribuídos aos bens; e
e) individualização do proprietário ou possuidor, quando possível.
VII – quaisquer outras informações consideradas relevantes para a caracterização da responsabilidade administrativa.
Ainda, relativamente ao campo das ações de fiscalização ou mesmo do PSA, Strapazzon (2024), relata como sério obstáculo às dificuldades em se notificar os autuados, geralmente residentes de áreas não alcançadas pelo serviço dos Correios. E, sendo uma garantia constitucional, não há como fugir dela.
Sob o aspecto econômico, o estudo desenvolvido por Santos e Nunes (2022), sobre a análise da efetividade da fiscalização em três florestas nacionais no estado de Rondônia revela:
Apesar de terem sido lavrados termos de embargo e apreensões, essas sanções não comprometeram a renda de desmatadores, madeireiros e grileiros de terras, pois o longo período de tempo entre a autuação e o julgamento pode gerar a percepção de que a punição não se concretizou, dando ao autuado a sensação de que não ocorrerá responsabilização pelo ilícito ambiental por ele realizado.
Segundo o entendimento dos mesmos autores, os dados indicam baixa eficácia de todo o sistema de fiscalização do desmatamento nas áreas estudadas. Para efetiva ação do estado de Rondônia são necessárias medidas que exijam do autuado, após a conclusão dos processos e confirmação das condenações, a realização de ações de recuperação da área degradada. O mesmo relatado por Schmitt (2015), quando afirma que no período de seu estudo, a execução das sanções do PSA pelo IBAMA é a etapa em que houve o menor esforço institucional para sua operacionalização, o que pode repercutir significativamente no sistema dissuasório administrativo.
De acordo com Hachem (2014), a Administração Pública tem o dever de decidir o processo administrativo em prazo razoável e obrigação de dar execução à decisão administrativa. Embora a tramitação administrativa siga o rito estabelecido pela Lei nº 9.784/1999, que prevê um prazo de trinta dias para decisão após a instrução do processo, o julgamento pode se estender por anos, dificultando a aplicação das penalidades e comprometendo a responsabilização dos infratores. Na prática, o cumprimento deste prazo é muito difícil de acontecer, devido à necessidade justificável de dilação de prazo para o autuado apresentar a defesa, prazo para a contradita da autoridade autuante, prazo para alegações finais do autuado, entre outras situações que poderiam violar o direito do contraditório e a ampla defesa do administrado (Schmitt, 2015).
Hachem (2014), revela que:
O conteúdo jurídico do direito à razoável duração se traduz no dever, imposto ao Poder Público, de dar uma tramitação célere ao processo administrativo, sem delongas ou paralisações injustificáveis, exarando a sua decisão dentro do mais curto espaço de tempo possível.
Para Schmitt (2015), um dos efeitos esperados do exercício do poder de política administrativa é a dissuasão administrativa, que consiste no temor de punição exercida pela fiscalização ambiental, por violar alguma regra ambiental. Nesse sentido, Santos e Nunes (2022) consideram que a demora no julgamento dos autos de infração provoca uma percepção de impunidade dos infratores, que com seus relevantes lucros auferidos, danos ambientais e dividendos originários, alimentam as atividades econômicas ilegais do Estado.
Na mesma linha, Strapazzon (2024), destaca que em termos de gestão, o PSA geralmente é bastante longo havendo risco de perder o poder de dissuasão junto aos infratores ambientais, seja pela demora na cobrança das multas e das outras penalidades, seja pela ocorrência de prescrição (quando o Estado perde o direito de punir) o que, para a autora, é a mais grave consequência na demora do julgamento.
Conforme os estudos conduzidos por Schmitt (2015), cerca de 73,7% dos autos de infração relacionados ao desmatamento na Amazônia, no período de 01/08/2008 a 31/07/2013, não haviam sido julgados, situação que demonstra baixa eficácia da fiscalização ambiental, gera risco prescricional e contribui para a percepção de falta de celeridade no estabelecimento e aplicação das medidas punitivas.
Outra vertente do mesmo problema surge quando a Administração não cumpre esse dever mais do que elementar, ou, ainda, quando o faz dentro de um lapso temporal desarrazoado, constrangendo o cidadão a esperar meses ou até anos para receber uma resposta administrativa (Hachem, 2014).
Interferências políticas e econômicas também têm dificultado a aplicação rigorosa das penalidades. Tal problemática foi citada no trabalho de Strapazzon (2024), a qual aponta que normas específicas do PSA tendem a mudar com bastante velocidade, especialmente quando os interesses políticos e econômicos sobrepujam os coletivos.
As alterações normativas são fontes de desestabilização, pois levantam dúvidas frequentes, ocasionando descontinuidades, intercorrências, impedimentos, o que gera uma sobrecarga significativa na atuação dos servidores e prejudica o fluxo de análise dos processos. Segundo Strapazzon (2024), as normativas que regem o PSA, juntamente com suas constantes alterações, representam uma situação problemática por si mesmas devido à complexidade e aos incessantes vais-e-vens, mas responde a apenas uma dimensão da problemática tratada em sua tese.
Outra questão sensível do PSA aprontada por Strapazzon (2024), vem com a necessidade de eventualmente corrigir ou questionar as decisões dos fiscais, pois os servidores ligados às atividades de instrução sentem-se desconfortáveis quando precisam, eventualmente, questionar ações de colegas que se encontram em posição bem mais consolidada e institucionalmente reconhecida.
A participação dos servidores diretamente relacionados à operacionalização das normas, com o apoio da área jurídica e sua técnica legislativa, de acordo com Strapazzon (2024), comprovou produzir efeitos significativos no aperfeiçoamento da prática organizacional relativa ao PSA. Neste ponto, a autora sugeriu que essa fórmula seja replicada quando da revisão de normas infralegais, como decretos regulamentares, instruções normativas e portarias relacionadas ao PSA.
Em seu doutorado, Schmitt (2015), aponta óbices para a execução das sanções estabelecidas, destacando a dificuldade de fazer com que o infrator pague a multa, pois, mesmo com a possibilidade de parcelamento ou pagamento imediato com desconto, são poucos os casos em que o passivo é liquidado. O mesmo estudo também revela dificuldades em destinar os bens apreendidos ou de reaver esses bens que estão sob guarda de um fiel depositário e destiná-los. E, o mais importante sob o ponto de vista ambiental, dificilmente se consegue estabelecer medidas para recuperar os danos ambientais provocados pela infração ambiental o que implica em perda da qualidade ambiental.
Outro aspecto negativo destacado por Strapazzon (2024), foi a disparidade de procedimentos e entendimentos administrativos, técnicos e jurídicos entre as diferentes regiões do país. Em geral, a falta de estrutura compatível e procedimentos padronizados levou a uma abordagem fragmentada e desorganizada do processo de julgamento de autos de infração no ICMBio.
O PSA é um problema visível nacional e internacionalmente e que tem implicações significativas tanto para o Estado, quanto para a sociedade, na medida em que vultosos recursos financeiros e de pessoal são fortemente aplicados nas ações de fiscalização, que podem vir a gerar nenhum efeito de dissuasão como esperado, caso o processo não finalize em tempo hábil (Strapazzon, 2024). Sob o mesmo ponto de vista, a baixa quantidade de autos de infração julgados pode influenciar a percepção dos infratores sobre a certeza da punição e impactar negativamente a dissuasão almejada (Schmitt, 2015).
Em suma, as etapas do processo administrativo sancionador são interdependentes, funcionando de modo sistêmico. O sucesso de uma delas influi diretamente no sucesso da etapa subsequente de modo que, se ao final do processo não houver execução das transgressões detectadas no início, ou se não foram autuados ou julgados, não há como gerar o efeito dissuasório necessário para evitar que os ilícitos ocorram. Assim, a lógica coercitiva é fadada ao fracasso (Schmitt, 2015).
Dessa maneira, um procedimento estruturado para a responsabilização administrativa ambiental assegura que a aplicação das sanções ocorra de forma justa e proporcional à gravidade da infração, garantindo o direito à defesa do autuado, prevendo sanções proporcionais e estabelecendo prazos claros para cada etapa do processo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo demonstrou que o PSA consiste no conjunto normativo que disciplina o rito da Administração Pública na responsabilização administrativa por condutas e atividades que violem as normas ambientais, resultando na aplicação de sanções. Trata-se, portanto, do mecanismo pelo qual o Estado exerce seu poder punitivo, mobilizando sua prerrogativa sancionatória em resposta à prática de infrações ambientais. É um instrumento essencial para a proteção do meio ambiente, garantindo a responsabilização de infratores e a aplicação de sanções adequadas
Apontou as normas estruturantes, atualmente em vigor, para operacionalização do PSA no IBAMA consistentes na Lei nº 9.605/1998, Lei nº 9.784/1999, Decreto nº 6.514/2008 e IN nº 19/2023 as quais conferem um arcabouço robusto e seguro, seja para os servidores designados para atuarem no processo sancionador, ou para os administrados.
O artigo, no entanto, aponta que as dificuldades na fiscalização bem como os desafios da morosidade, da ineficácia na execução da cobrança de multas, embargos, apreensões comprometem sua efetividade, demonstrando baixa eficácia da fiscalização ambiental, gerando risco prescricional e contribuindo para a percepção de impunidade por parte dos infratores.
Como forma de melhoria, indica-se fortalecer a estrutura dos órgãos ambientais com mais força de trabalho, treinamentos especializados, participação dos servidores nas elaborações de normativas e aprimorar os sistemas de informação utilizados para garantir maior celeridade no processo eletrônico de apuração de infração ambiental e promover maior transparência na aplicação das penalidades.
Adicionalmente, a pesquisa identificou pontos positivos, mas ainda a serem aperfeiçoados, como a contínua organização do Centro Nacional do Processo Sancionador Ambiental do IBAMA, setor estruturado recentemente com servidores em dedicação exclusiva e com delegação de competência para julgar, mapear e padronizar o PSA.
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