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Resumo
INTRODUÇÃO
A psicologia financeira é um campo emergente que une princípios da psicologia com a economia para entender como as pessoas tomam decisões financeiras. Em um mundo onde as finanças pessoais têm impacto direto no bem-estar individual e coletivo, compreender os mecanismos psicológicos que influenciam essas escolhas torna-se cada vez mais relevante. Este artigo tem como objetivo explorar como os comportamentos financeiros da população, são moldados por emoções, vieses cognitivas e influências sociais, oferecendo uma visão abrangente e crítica sobre a psicologia financeira e sua aplicação prática.
A relevância dessa área de estudo é evidenciada em sua capacidade de explicar por que as pessoas muitas vezes gastam além do permitido em seu orçamento mensal. Em vez de apenas dizer como economizar, ela mostra que emoções e fatores psicológicos desempenham um papel significativo nas escolhas financeiras. Estudos recentes da fintech Onze em parceria com a Icatu (MoneyLab, 2024) indicam que 70% dos brasileiros acreditam que a falta de dinheiro afeta sua saúde emocional. Esses dados revelam a importância de investigar como as emoções e os aspectos psicológicos influenciam as decisões financeiras.
Como Housel (2021, p. 12) afirma, “O sucesso financeiro não é uma habilidade técnica. É uma habilidade pessoal, na qual o seu comportamento é mais importante do que o seu conhecimento. […] as habilidades pessoais são mais importantes do que o lado técnico do capital”. A situação financeira precária está diretamente relacionada à saúde emocional de uma vasta parcela da população. Dados da pesquisa mostram que 59% dos brasileiros não possuem uma reserva financeira de emergência, 41% afirmam que a renda mensal não cobre todos os gastos e 54% dizem que a maior preocupação atual é com dinheiro, acima de família (17%), saúde (13%) e trabalho (8%).
Esses números enfatizam a necessidade urgente de estratégias de educação e planejamento financeiro. A instabilidade econômica não só compromete a saúde financeira, mas também a emocional, gerando um ciclo vicioso de estresse e ansiedade. Como Zruel (2016, p. 90) observa, “quando nos encontramos em uma situação de endividamento, é muito difícil controlar o emocional. Problemas com dinheiro fere nosso orgulho, abalam nosso ego”. Assim, abordar o cruzamento entre finanças e emoções pode fornecer ideias valiosas para intervenções eficazes.
Uma das principais discussões em psicologia financeira é a dualidade entre racionalidade e emoção nas decisões financeiras. Enquanto a racionalidade sugere escolhas fundamentadas em lógica e análise, as emoções podem levar a decisões impulsivas e frequentemente precipitadas. Por exemplo, o medo de perdas pode levar um investidor a vender ações precipitadamente durante uma queda no mercado, enquanto a ganância pode levar à tomada de riscos excessivos durante uma bolha financeira. Essa dualidade é central para entender como e por que as pessoas se desviam de comportamentos financeiros considerados “racionais”.
O objetivo aqui é analisar como essas forças opostas interagem e impactam as escolhas financeiras das pessoas, promovendo uma gestão financeira mais equilibrada e consciente. De acordo com Housel (2021, p. 23), “toda decisão financeira que uma pessoa toma é fruto da informação que ela tem à disposição no momento, associada ao seu modelo mental único sobre a forma como o mundo funciona”. Compreender a psicologia financeira não é apenas uma questão acadêmica, mas tem implicações práticas significativas. Ao identificar e entender as visões e emoções que influenciam o comportamento financeiro, a população pode desenvolver estratégias para melhorar sua gestão financeira.
Por exemplo, considerar a tendência de aversão à perda pode ajudar alguém a tomar decisões de investimento mais equilibradas e menos impulsivas. Além disso, o estudo dos aspectos psicológicos das finanças pode ser utilizado para promover o bem-estar pessoal, ajudando as pessoas a estabelecer metas financeiras realistas, evitar armadilhas comportamentais e tomar decisões mais conscientes e racionais. Dessa forma, a aplicação desses princípios pode resultar em uma vida financeira mais saudável e satisfatória.
A programação mental, ou a mentalidade de uma pessoa, é um fator crucial que define se ela terá sucesso ou fracasso financeiro, como Zruel (2016, p. 31) explica: “com frequência, as pessoas tentam melhorar sua situação financeira sem mudar sua programação mental. Infelizmente, essas tentativas serão muito frustrantes”. A relevância deste estudo está baseada na realidade financeira de muitos brasileiros, onde a falta de conhecimento sobre a psicologia financeira pode levar a decisões precipitadas que afetam emoções e bem-estar emocional e financeiro. Segundo a mesma pesquisa da fintech Onze, 68% dos trabalhadores brasileiros afirmaram que preocupações financeiras afetam seu desempenho no trabalho, enquanto 64% já sentiram que as contas afetam sua qualidade de vida.
Esses dados não apenas justificam a importância de estudar o comportamento financeiro, mas também sugerem que intervenções baseadas nesse conhecimento poderiam ter um impacto significativo na vida das pessoas. Portanto, este artigo fornece uma base teórica que ajuda os indivíduos a melhorar sua saúde financeira e emocional por meio de um entendimento mais profundo dos mecanismos psicológicos que influenciam suas decisões, contribuindo para um bem-estar mais equilibrado.
Para alcançar esses objetivos, a metodologia deste estudo envolve uma revisão abrangente da literatura existente sobre psicologia financeira, incluindo trabalhos de autores como Morgan Housel, Dan Ariely e Daniel Kahneman. Serão analisados estudos empíricos que exploram as visões cognitivas e emocionais que influenciam as decisões financeiras, bem como pesquisas que examinam o impacto do ambiente social e cultural nessas escolhas. Além disso, serão apresentados exemplos práticos para ilustrar como os princípios dessa área podem ser aplicados na vida cotidiana. A abordagem será descritiva e analítica, focando em apresentar informações de forma objetiva e crítica, permitindo que o leitor forme sua própria opinião sobre o tema.
Assim, espera-se que este estudo contribua para a compreensão e aplicação prática dessa área, fornecendo ferramentas acessíveis para melhorar a vida financeira e emocional da população brasileira.
COMPREENDENDO OS MECANISMOS PSICOLÓGICOS NAS DECISÕES FINANCEIRAS
A mente humana, com seus processos e comportamentos complexos, exerce um papel fundamental nas decisões financeiras, tanto em nível individual quanto empresarial. Compreender os mecanismos psicológicos que moldam essas decisões é crucial para navegarmos pelos mercados financeiros de forma mais consciente e alcançarmos melhores resultados. Nesse contexto, o impacto de emoções como medo, ganância, otimismo e pessimismo, bem como vieses cognitivos, o papel do ambiente social e cultural nas decisões financeiras, são elementos essenciais a serem considerados.
Segundo Morgan House (2021, p. 24), diz que:
Uma coisa importante, que ajuda a explicar por que é tão complicado tomar decisões financeiras e por que existem tantos comportamentos inadequados, é perceber o quanto esse assunto é recente. O dinheiro circula entre nós há bastante tempo. Acredita-se que tenha sido o rei Alíates da Lídia, parte da atual Turquia, quem criou a primeira moeda oficial, por volta de 600 a.C. Mas os fundamentos modernos das decisões financeiras — poupar e investir — têm por base conceitos que ainda estão engatinhando (Housel, 2021, p. 24).
Essa observação destaca a complexidade própria das decisões financeiras, evidenciando o tempo curto de vida desses conceitos modernos de poupança e investimento. A partir dessa perspectiva, é essencial entender como as emoções e vieses cognitivas influenciam as escolhas financeiras das pessoas, e como poderá ser gerenciado essas influências para alcançar um futuro financeiro próspero e tranquilo. Na próxima seção, será explorado em detalhes como emoções e vieses cognitivas impactam nossos comportamentos financeiros e quais estratégias poderão ser adotadas para reduzir esses efeitos, promovendo uma gestão financeira equilibrada e consciente.
EMOÇÕES E FINANÇAS: O IMPACTO DO MEDO, GANÂNCIA, OTIMISMO E PESSIMISMO
As emoções exercem uma influência decisiva nas escolhas financeiras. Sentimentos como medo, ganância, otimismo e pessimismo são forças poderosas que podem desencadear comportamentos extremos e decisões impulsivas, potencialmente conduzindo qualquer pessoa à ruína financeira.
O IMPACTO DO MEDO E DA GANÂNCIA NAS DECISÕES FINANCEIRAS
O medo e a ganância são particularmente influentes, podendo levar a comportamentos irracionais que comprometem a saúde financeira. Compreender e gerenciar esses vieses emocionais é essencial para tomar decisões financeiras conscientes e equilibradas.
O medo é uma emoção que pode levar à aversão ao risco e a decisões conservadoras. Napoleon Hill (2020, p. 130) destaca a gravidade do medo da pobreza: “É crucial entender que o medo, especialmente o medo da pobreza, pode levar a um espiral negativo, onde decisões financeiras são tomadas com base em pânico e não em raciocínio lógico” (Hill, 2020, p. 130).
Em momentos de crise, muitos investidores, dominados pelo medo, vendem seus ativos a preços baixos para evitar perdas maiores. Essa reação impulsiva, muitas vezes, resulta em perdas concretizadas que poderiam ter sido evitadas com uma abordagem racional e de longo prazo. Hill descreve o medo da pobreza como o mais destrutivo de todos, afetando várias faculdades mentais e emocionais:
O medo da pobreza é, sem dúvida, o mais destrutivo de todos os medos, ele paralisa a faculdade da razão, destrói a da imaginação, mata a autossuficiência, mina o entusiasmo, desencoraja a iniciativa, conduz à incerteza de propósito, incentiva a procrastinação, elimina o entusiasmo e torna o autocontrole impossível. Ele tira o charme da pessoa, destroi a possibilidade de um pensamento correto, desvia a concentração do esforço, mata a persistência, reduz a força de vontade a nada, destroi a ambição, anuvia a memória e convida o fracasso em todas as formas imagináveis (Hill, 2020, p. 325).
Essa fala do autor enfatiza como o medo pode comprometer a capacidade de tomar decisões racionais. Em tempos de crise, é essencial desenvolver estratégias para gerenciar o medo, como manter a calma, realizar análises cuidadosas e planejar a longo prazo, um objetivo bem traçado pode lhe ajudar muito a enfrentar essa emoção.
Por outro lado, a ganância pode levar a comportamentos de risco e decisões financeiras precipitadas. Robert Kiyosaki (2018, p. 56) destaca como a ganância, juntamente com a ignorância, pode ser uma armadilha perigosa, quando diz que a:
Causa principal da pobreza ou das dificuldades financeiras está no medo e na ignorância, não na economia, no governo ou nos ricos. É o medo que instalamos em nós mesmos e a ignorância que mantêm as pessoas presas na armadilha (Kiyosaki, 2018, p. 56).
A ganância pode fazer com que os investidores busquem retornos rápidos e elevados, frequentemente ignorando os riscos associados. Kiyosaki (2018, p. 56-57) enfatiza a necessidade de controlar essas emoções e usá-las a favor dos objetivos financeiros a longo prazo, ele fala que:
Sempre sentiremos emoções de medo e ambição. Daqui para frente, o mais importante será usar essas emoções a seu favor e em longo prazo e não apenasdeixar que os conduzam e controlem seus pensamentos. A maioria das pessoas usa o medo e a ambição contra si mesmas. Isso é o começo da ignorância (Kiyosaki, 2018, p. 56-57).
Ele alerta que permitir que essas emoções controlem os pensamentos pode levar a decisões impulsivas e desastrosas. Para Kiyosaki, a educação financeira é fundamental para ver além das ilusões criadas pela ganância e tomar decisões mais conscientes e racionais:
O que aumenta o medo e o desejo é a ignorância. Por isso que pessoas ricas com muito dinheiro muitas vezes têm mais medo à medida que ficam mais ricas. O dinheiro é a cenoura, a ilusão. Se o burro pudesse entender todo o contexto, pensaria duas vezes antes de sair correndo atrás da cenoura (Kiyosaki, 2018, p. 57).
Essa analogia ilustra como a ganância pode ser uma ilusão que pode levar a qualquer pessoa a perseguir objetivos financeiros de maneira cega. A educação financeira é fundamental para uma tomada de decisão mais esclarecidas e menos impulsiva.
O medo e a ganância são emoções poderosas que podem influenciar profundamente as decisões financeiras. Enquanto o medo pode levar a escolhas conservadoras e aversão ao risco, a ganância pode resultar em comportamentos de risco e decisões precipitadas. Compreender e gerenciar esses vieses emocionais é essencial para alcançar uma saúde financeira sustentável. A mensagem central de Hill e Kiyosaki é clara: a educação financeira e o autoconhecimento são ferramentas fundamentais para dominar essas emoções e tomar escolhas financeiras sábias e prudentes.
O IMPACTO DO OTIMISMO E DO PESSIMISMO NAS DECISÕES FINANCEIRAS
Emoções são determinantes e fundamentais no processo de tomada de decisões econômicas. Especificamente, o otimismo e o pessimismo exercem uma influência notável, configurando padrões de comportamento que têm o potencial de impactar de maneira expressiva a estabilidade financeira pessoal. A habilidade de reconhecer e moderar essas alterações emocionais é vital para a realização de escolhas financeiras mais conscientes e ponderadas.
O otimismo, uma emoção frequentemente associada a uma visão positiva do futuro, pode influenciar positivamente as decisões financeiras, proporcionando a confiança necessária para assumir riscos calculados.
Morgan Housel (2021, p.118) destaca essa dinâmica, como:
Um importante primo dá margem para imprevisto é o que chamo de viés de otimismo na relação com o risco, ou síndrome de “as estatísticas são favoráveis na roleta-russa”: apegar-se às probabilidades positivas mesmo quando o lado negativo não é aceitável sob hipótese alguma (Housel, 2021, p. 118).
Esse pensamento do autor mostra a importância do equilíbrio entre otimismo e realismo. O otimismo pode motivar os investidores a buscar oportunidades de crescimento, mas é crucial que essas decisões sejam baseadas em análises sólidas e uma compreensão clara dos riscos envolvidos.
Por outro lado, o otimismo exagerado pode levar a uma visão distorcida da realidade, resultando em decisões financeiras precipitadas.
Housel (2021, p.119) enfatiza que:
No entanto, se algo tem 95% de chance de dar certo, os 5% restantes de chances de dar errado significam que é muito provável que você experimente o lado negativo em algum momento da vida. E se o custo do lado negativo for a falência, o lado positivo em 95% do tempo restante não vale o risco, independentemente do quão atraente pareça (Housel,, 2021, p. 119).
Investidores otimistas podem subestimar os riscos associados aos seus investimentos, levando a perdas financeiras. A ideia central do autor é clara: o otimismo deve ser balanceado com cautela e uma análise minuciosa dos riscos envolvidos.
O pessimismo, por sua vez, é uma visão frequentemente associada à expectativa de resultados negativos.
Housel (2021, p. 147) aponta que o pessimismo recebe mais atenção do que o otimismo, quando diz que:
O pessimismo recebe mais atenção do que o otimismo porque, quando se trata do bem-estar, o que importa não é tanto a média da experiência passada, mas o pior dos cenários possíveis. Um acontecimento ruim pode anular dezenas de acontecimentos bons. Como resultado, o pessimismo parece mais inteligente e mais plausível do que o otimismo (Housel, 2021, p. 147).
Esse ponto de vista sublinha a tendência de que o pessimismo aparenta ser mais racional e convincente devido ao foco nos piores cenários. Tal perspectiva pode levar os investidores a evitar riscos, mesmo quando as chances de um resultado positivo serem elevadas.
Em contrapartida, o pessimismo exagerado pode levar a uma aversão ao risco que poderá limitar o crescimento financeiro. A visão pessimista pode fazer com que os indivíduos evitem oportunidades de investimento que, embora apresentem algum risco, também oferecem um potencial de crescimento significativo.
Housel (2021, p. 146) fala que:
Os verdadeiros otimistas não acreditam que tudo vai dar certo. O nome dessa atitude é complacência. O otimismo é a crença de que as chances de um bom resultado estão a seu favor ao longo do tempo, mesmo que haja contratempos pelo caminho (Housel, 2021, p. 146).
Manter uma atitude pessimista pode proteger contra perdas, mas também pode impedir que se aproveitem as oportunidades que surgem. O equilíbrio entre pessimismo e otimismo é essencial para tomar decisões financeiras conscientes e equilibradas. Manter um equilíbrio saudável entre essas duas emoções é fundamental para escolhas financeiras sólidas.
VIESES COGNITIVOS: COMO NOSSAS MENTES PODEM NOS ENGANAR
Vieses cognitivas são distorções sistemáticas no pensamento que afetam as decisões e julgamentos das pessoas. Esses vieses podem levar as pessoas a tomar decisões financeiras que não são necessariamente racionais ou adequadas. A seguir serão evidenciadas alguns dos vieses cognitivos mais comuns que afetam as escolhas financeiras das pessoas em seu cotidiano.
AVERSÃO À PERDA: QUANDO O MEDO DE PERDER SUPERA O PRAZER DE GANHAR
A aversão à perda é um conceito central na economia comportamental que descreve a tendência das pessoas de preferirem evitar perdas ao invés de adquirir ganhos elevados. Daniel Kahneman, um dos principais estudiosos desse fenômeno, afirma que “as perdas pesam aproximadamente o dobro do que os ganhos de igual tamanho” (Kahneman, 2012, p. 302). Segundo Dan Ariely e Jeff Kreisler, essa tendência pode ser observada em vários contextos, desde decisões de consumo até investimentos financeiros (Ariely; Kreisler, 2019, p. 120).
A aversão à perda pode fazer com que os investidores evitem oportunidades de investimento que envolvem risco, mesmo quando as probabilidades de ganho são favoráveis.
Kahneman (2012, p. 302) menciona que:
Para alcançar o sucesso financeiro, é crucial que as pessoas mantenham uma atitude otimista, mas fundamentada em um planejamento cuidadoso e uma compreensão clara dos desafios e riscos. Housel (2021, p. 146) define claramente as nuances entre essas duas emoções quando diz: “Agora, sim, podemos falar sobre o irmão mais atraente do otimismo: o pessimismo”.
O otimismo e o pessimismo são forças poderosas que podem influenciar profundamente as decisões das pessoas. Enquanto o otimismo pode motivar a busca por oportunidades, o pessimismo pode servir como uma ferramenta de precaução. No entanto, ambos devem ser equilibrados com uma visão realista dos riscos e oportunidades em cada cenário distinto. As decisões financeiras devem ser baseadas em uma análise cuidadosa e um planejamento sólido, evitando tanto o excesso de confiança quanto a aversão ao risco que pode impedir o crescimento das finanças pessoais.
Para a maioria das pessoas, o medo de perder cem dólares é mais intenso do que a esperança de ganhar 150 dólares. Concluímos com base em inúmeras observações como essa que “as perdas assomam como maiores do que os ganhos” e que as pessoas são avessas à perda (Kahneman, 2012, p. 302).
Esse comportamento humano é uma manifestação do medo inato de perder, que leva os indivíduos a tomar decisões conservadoras em situações de incerteza. Um dos experimentos clássicos que ilustram a aversão à perda no comportamento das pessoas, funciona da seguinte maneira:
Imagine que você tem duas opções para ganhar dinheiro: Opção 1: Você pode ganhar
$ 900,00 com certeza. Opção 2: Você tem 90% de chance de ganhar $1.000 e 10% de chance de não ganhar nada. A maioria das pessoas escolhe a Opção 1, preferindo a certeza de ganhar
$900 em vez de arriscar para ganhar um pouco mais, mesmo que a segunda opção ofereça uma chance alta de um ganho maior. Isso acontece porque o medo de não ganhar nada (os 10% de chance de não ganhar) pesa muito na decisão (Kahneman, 2012, p. 298).
Agora, suponha que você tem duas opções para perder dinheiro: Opção 1: Você vai perder $900 com certeza. Opção 2: Você tem 90% de chance de perder $1.000 e 10% de chance de não perder nada. Neste caso, a maioria das pessoas escolhe a Opção 2, preferindo arriscar uma perda maior na esperança de não perder nada, mesmo que a primeira opção seja uma perda garantida, mas menor. Isso mostra como o medo da perda nos leva a tomar mais riscos para evitar uma perda garantida. Esse comportamento é um exemplo claro de como a aversão à perda influencia nossas decisões financeiras (Kahneman, 2012, p. 298).
Estudos experimentais revelam que a aversão à perda pode ser influenciada por diversos fatores, incluindo a forma como as opções são apresentadas (conhecido como “efeito de enquadramento”) e o contexto em que a decisão é tomada. O “efeito de enquadramento” ocorre quando a mesma escolha é apresentada de maneiras diferentes, afetando a decisão das
pessoas. Por exemplo, uma perda pode parecer menos dolorosa se for descrita como uma falta de ganho em vez de uma perda direta. Em outras palavras, se alguém disser “você não ganhou” ao invés de “você perdeu”, a reação emocional tende a ser menos negativa. Isso mostra como a forma de apresentar uma situação pode mudar a percepção das pessoas e influenciar suas decisões (Ariely; Kreisler, 2019, p. 122).
Empresas frequentemente exploram a aversão à perda para tornar suas ofertas mais atraentes. Por exemplo, as operadoras de telefonia celular muitas vezes agregam diversos custos em uma única cobrança para minimizar a percepção de múltiplas perdas pequenas. Ariely e Kreisler descrevem essa abordagem como “agregar perdas e segregar ganhos”, que consiste em dar aos consumidores uma só perda dolorosa em troca de muitos ganhos prazerosos. Essa prática faz o todo parecer mais atraente do que a soma de suas partes (Ariely; Kreisler, 2019, p. 124-125).
Para tomar decisões financeiras mais equilibradas, é essencial reconhecer e gerenciar a aversão à perda. Compreender essa habilidade pode permitir que as pessoas adotem uma abordagem mais equilibrada, pesando os riscos e os benefícios de forma mais objetiva. Outra abordagem prática para mitigar os efeitos da aversão à perda é evitar olhar constantemente para os investimentos.
Dan Ariely e Jeff Kreisler (2019. p.124) sugerem que:
Se somos sensíveis demais a pequenas flutuações no decorrer do tempo, uma solução é apenas tomar uma decisão de longo prazo e persistir nela, olhando a carteira de investimentos apenas uma vez por ano. Dessa forma, evitamos que a aversão à perda nos induza a agir de modo precipitado (Ariely; Kreisler, 2019, p. 124).
A ideia de Ariely e Kreisler nesse pensamento é de oferecer um informe valioso para quem busca tomar escolhas financeiras mais racionais e alcançar seus objetivos de longo prazo. Quando um indivíduo se concentra em um investimento de longo prazo, evita focar nas flutuações de curto prazo. Dessa forma, é possível reduzir o impacto da aversão à perda e aumentar suas chances de sucesso.
A partir do exposto, pode-se concluir que esse viés cognitivo desempenha um papel crucial na forma como são tomadas decisões financeiras, conduzindo a evitar riscos e optar por preferir estratégias conservadoras. Embora essa tendência seja uma resposta natural e protetora, ela pode limitar o potencial de crescimento econômico das pessoas. Ao Reconhecer e compreender a aversão à perda permite adotar estratégias que mitiguem seus efeitos negativos, como uma análise mais racional dos riscos e benefícios. Desenvolver uma abordagem equilibrada para a tomada de decisões auxilia na melhor gestão da incerteza e maximiza as chances de sucesso a longo prazo. A gestão eficaz desse viés é, portanto, essencial para alcançar um equilíbrio saudável entre segurança e crescimento nos investimentos de cada indivíduo.
ANCORAGEM: A INFLUÊNCIA DAS PRIMEIRAS INFORMAÇÕES NAS DECISÕES FINANCEIRAS
No livro “Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar”, Daniel Kahneman define o conceito de ancoragem como um fenômeno psicológico em que diferentes pontos de partida (âncoras) influenciam as estimativas finais das pessoas. Mesmo que o valor inicial seja aleatório ou irrelevante, ele afeta significativamente as respostas subsequentes. Kahneman explica que este viés ocorre tanto em situações em que o ponto de partida é sugerido externamente quanto em casos onde as estimativas são baseadas em cálculos incompletos realizados pelos próprios indivíduos (Kahneman, 2012, p. 131).
A ancoragem é visível em muitos aspectos do dia a dia, desde compras no supermercado até negociações de preços imobiliários, automotivos entre outros.
Um exemplo clássico é o efeito de ancoragem em negociações de preços. Quando um corretor de imóveis apresenta um preço inicial elevado de uma casa, isso serve como âncora, e os compradores ajustam suas ofertas com base nesse ponto de partida. Mesmo que o preço inicial seja inflacionado, ele influencia a percepção do valor justo da casa. (Kahneman, 2012, p. 131). Por exemplo, suponha que você está comprando uma casa e o corretor de imóveis apresenta uma propriedade pelo preço inicial de R$ 200.000,00. Esse valor serve como âncora. Mesmo que você saiba que pode negociar, sua percepção do valor da casa está influenciada por esse preço inicial. Se, após negociações, o preço for reduzido para R$ 150.000,00, você pode sentir que está fazendo um bom negócio, mesmo que o valor real de mercado da casa seja apenas R$ 100.000,00. Nesse caso, é perceptível que preço inicial elevado faz com que o preço final pareça mais atraente do que realmente é.
Kahneman, cita outro exemplo onde um supermercado utilizou a ancoragem para aumentar as vendas de sopa. O supermercado colocou duas promoções em tempos distintos: uma com limite de 12 latas de sopa por pessoa e outra sem limite. O resultado foi, “Os clientes compraram uma média de sete latas quando o limite vigorava, o dobro do que compravam quando o limite era retirado” (Kahneman, 2012, p. 137). Isso acontece porque o número 12 serve como âncora, sugerindo uma quantidade razoável para se comprar. Essa é uma prática comum no marketing, onde os limites sugeridos ou ofertas iniciais influenciam
significativamente o comportamento de compra dos consumidores e ainda outros fatores psicológicos como a possibilidade de escassez, por conta da limitação da compra do produto.
Para entender a ancoragem, é essencial conhecer os dois sistemas de pensamento que Kahneman descreve: o Sistema 1 e o Sistema 2. O Sistema 1 é rápido, automático e intuitivo, enquanto o Sistema 2 é mais lento, deliberado e lógico. “Efeitos de ancoragem sempre foram estudados em tarefas de julgamento e escolha que são no fim das contas completadas pelo Sistema 2. Entretanto, o Sistema 2 funciona baseado em dados que são recuperados da memória, numa operação automática e involuntária do Sistema 1” (Kahneman, 2012, p. 138). Esse viés atua principalmente através do Sistema 1, que rapidamente processa a informação inicial (a âncora) e influencia o Sistema 2 durante a tomada de decisão.
Existem dois principais mecanismos que produzem efeitos de ancoragem: ajuste e priming.
A ancoragem como ajuste ocorre quando as pessoas ajustam suas estimativas a partir de um valor inicial. “O ajuste normalmente termina de modo prematuro, pois as pessoas param quando não têm mais certeza de que deveriam seguir adiante” (Kahneman, 2012, p. 132). Por exemplo, se alguém lhe pergunta se um indivíduo tinha mais de 144 anos quando morreu, você sabe que essa informação é absurda, mas ainda assim a ideia de uma pessoa muito velha influencia sua estimativa. Você começa a ajustar a partir deste número, mas pode parar antes de chegar a uma estimativa correta devido à incerteza.
Já esse viés cognitivo como efeito de priming envolve a ativação de associações na memória. Priming é um fenômeno psicológico onde a exposição a um estímulo influencia a resposta a um estímulo subsequente, sem que a pessoa esteja consciente dessa influência. “Sugestão é um efeito de priming, que evoca seletivamente evidência compatível” (Kahneman, 2012, p. 134). Por exemplo, se um investidor novato lê em um artigo que um determinado ativo teve um retorno de 30% no ano passado, essa informação pode servir como âncora. Mesmo que o retorno futuro esperado seja menor, o investidor pode ser influenciado pelo desempenho passado e ajustar suas expectativas e decisões de investimento com base nesse valor inicial. Essa âncora inicial faz com que outras informações relevantes sejam subestimadas ou ignoradas, influenciando negativamente as decisões de investimento das pessoas.
Para evitar ou minimizar esse fenômeno psicológico, considere as seguintes estratégias:
Reconhecer a âncora: Estar ciente de que se está sendo influenciado por uma âncora já é um passo importante para minimizar seu impacto. Muitas vezes, simplesmente saber que a ancoragem pode ocorrer, ajuda a reduzir seu efeito.
Questionar a âncora: Pensar em razões pelas quais a âncora pode não ser válida. Por exemplo, perguntar-se se o preço inicial de um imóvel que se pretende comprar é realmente refletivo de seu valor atual de mercado.
Análise racional: Para obter uma análise racional deve-se utilizar o Sistema 2, a parte mais analítica do cérebro, para avaliar a informação. Tentar separar a âncora inicial e focar em dados concretos e relevantes para a decisão.
Procurar informações adicionais: Não se basear apenas na primeira informação recebida. Fazer uma pesquisa mais ampla para obter uma visão mais completa e comparar diferentes fontes de dados. Verificar múltiplas fontes pode fornecer um panorama mais realista.
Usar contra âncoras: Segundo Kahneman, “os psicólogos Adam Galinsky e Thomas Mussweiler propuseram maneiras sutis de resistir ao efeito de ancoragem nas negociações. Eles instruíram os negociadores a focar sua atenção e buscar na memória argumentos contra a âncora” (Kahneman, 2012, p. 137). Por exemplo, se acredita que o preço inicial de um carro é muito alto, começar com uma oferta significativamente mais baixa do valor inicial ofertado para trazer a negociação para um nível mais razoável e justo para uma compra futura.
A partir do exposto, pode-se concluir que a ancoragem é um viés cognitivo poderoso que pode influenciar nossas decisões financeiras, muitas vezes de forma sutil e inconsciente. Entender como esse viés cognitivo funciona e estar ciente de suas armadilhas pode ajudar consumidores e investidores a tomar decisões mais conscientes e racionais. Ao aplicar estratégias para mitigar seu impacto, com uma análise cuidadosa de informações e a comparação de múltiplas fontes, é possível reduzir a influência negativa deste fenômeno psicológico e melhorar a qualidade das decisões financeiras.
EFEITO MANADA: A TENDÊNCIA DE SEGUIR O GRUPO
O efeito “manada” é um fenômeno onde as pessoas tendem a seguir as ações e decisões de um grupo, ao invés dos indivíduos basearem suas escolhas em informações independentes ou análises pessoais. Este comportamento pode ser observado em várias situações do cotidiano, desde a escolha de produtos até investimentos financeiros.
Segundo Dan Ariely e Jeff Kreisler (2019, p. 100-101):
Comportamento de manada é a ideia de que seguiremos a multidão, de que supomos que algo é bom ou ruim baseados no comportamento de outras pessoas. Se as outras pessoas gostam de algo, fazem uma boa avaliação, imploram para vê-lo, fazem ou pagam por aquilo, nos convenceremos de que é bom. Supomos que algo é valioso porque outros parecem valorizá-lo (Ariely; Kreisler, 2019, p. 100-101).
Isso significa que muitas vezes as decisões são baseadas no que é observado ao redor. Se um restaurante está cheio ou se muitos elogiam um produto, há uma tendência em acreditar que essas escolhas são acertadas sem realizar uma análise própria. Esse comportamento é amplamente utilizado em estratégias de marketing e vendas para criar uma percepção de valor e qualidade.
Ávila e Bianchi (2015, p. 140) trazem uma perspectiva adicional ao discutir o comportamento de manada. Eles afirmam que:
Muitos supõem que o comportamento de manada é resultado de preguiça cognitiva. Em vez de descobrir qual é a coisa certa a fazer, escolhemos a opção mais simples: seguir a multidão. É uma explicação errada para esse viés. Muitas vezes seguimos a multidão porque tememos nos arrepender. Tomar a decisão errada doi menos quando todo mundo também errou. Afinal de contas, como diz o provérbio inglês, ‘a tristeza ama companhia’ (Ávila; Bianchi, 2015, p. 140).
Os autores sugerem que o comportamento de manada não é apenas uma questão de economizar esforço mental, mas também uma forma de minimizar o arrependimento. Seguir a maioria pode parecer menos arriscado emocionalmente, pois compartilhar um erro com muitas outras pessoas é menos doloroso do que enfrentá-lo sozinho.
Além disso, Ávila e Bianchi destacam que:
O Efeito-Manada (herding effect): decisões de investimento por imitação das escolhas de outros agentes financeiros (pares). Esse comportamento tenderia a ser frequente em situações de grande incerteza, ou seja, em que há falta de informações sobre empresas e mercados ou há excesso de informações contraditórias (Ávila; Bianchi, 2015, p. 181).
Eles explicam que em ambientes de incerteza, onde as informações são escassas ou conflitantes, os investidores tendem a imitar as decisões dos outros. Isso pode levar a uma série de problemas, como a formação de bolhas especulativas, onde os preços dos ativos são inflacionados além de seu valor real devido à compra massiva influenciada por decisões de outros investidores.
Outro aspecto importante relacionado ao efeito manada é o comportamento de auto manada. Ariely e Kreisler (2019, p. 101) afirmam que:
O comportamento de automanada é a segunda e mais perigosa parte da ancoragem. É a mesma ideia básica do comportamento de manada, exceto que baseamos nossas decisões não naquelas de outras pessoas, mas em decisões semelhantes que tomamos no passado. Supomos que algo tem grande valor porque nós o avaliamos bem antes. Avaliamos algo pelo que ‘normalmente’ custa ou ‘sempre’ custou porque confiamos em nossos comportamentos passados” (Ariely; Kreisler, 2019, p. 101).
Esse comportamento é particularmente perigoso porque perpetua decisões anteriores sem reavaliá-las criticamente. Por exemplo, se alguém decidiu anteriormente que um certo tipo de investimento era seguro, pode continuar a investir da mesma forma, mesmo que as condições de mercado tenham mudado. Esse tipo de ancoragem nas decisões passadas pode levar a erros contínuos e à falta de adaptação a novas realidades.
Portanto, o efeito “manada” e o comportamento de “automanada” são fenômenos comportamentais que influenciam significativamente as decisões das pessoas. Enquanto o primeiro se baseia na influência da maioria e pode ser exacerbado pelo medo de arrependimento, o segundo se fundamenta na confiança em decisões passadas, muitas vezes sem reavaliação crítica. Ambos os comportamentos podem levar a escolhas inadequadas e à perpetuação de erros. Para evitar cair nessa armadilha, é essencial desenvolver um pensamento crítico e independente, questionando as ações da maioria e realizando uma análise cuidadosa dos riscos e benefícios antes de tomar decisões financeiras, mesmo que pareça bem atrativo qualquer investimento ou compra. Reconhecer a existência do efeito manada e entender como ele pode influenciar as decisões individuais é um passo crucial para tomar decisões equilibradas.
EXCESSO DE CONFIANÇA: SUPERESTIMANDO NOSSO PRÓPRIO CONHECIMENTO
A tendência de acreditar que se sabe mais do que realmente se sabe ou que se tem mais controle sobre eventos do que realmente se tem é conhecida como excesso de confiança. Essa falácia é bem ilustrada quando Housel comenta em seu livro “A Psicologia Financeira: Lições Atemporais sobre Fortuna, Ganância e Felicidade” (2021) que “uma armadilha na qual muitos investidores caem é aquilo que chamo de ‘falácia dos historiadores-profetas’: uma confiança excessiva em dados do passado como se fossem um sinal das condições futuras, em um campo no qual a inovação e a mudança são a força vital do progresso” (Housel, 2021, p. 103). Esse pensamento revela como a confiança excessiva em dados históricos pode levar os investidores a ignorar as mudanças e inovações que moldam o futuro.
O esse viés cognitivo pode fazer com que os investidores subestimem os riscos e superestimem suas capacidades de previsão. Housel destaca que “a vivência de eventos específicos não obrigatoriamente qualifica um indivíduo para saber o que acontecerá no futuro. Na verdade, esse quase nunca é o caso, porque a experiência provoca mais um excesso de confiança do que uma capacidade de previsão” (Housel, 2021, p. 104). Aqui, Housel enfatiza que a experiência passada não garante previsões precisas, mas frequentemente leva a uma falsa sensação de segurança.
Um exemplo prático desse fenômeno psicológico pode ser visto quando investidores acreditam que podem prever movimentos de mercado com precisão. Housel observa que:
Os analistas de ações dão a seus clientes metas de preços, não faixas de preços. Os analistas econômicos fazem previsões com cifras exatas, raramente com probabilidades amplas. O especialista que fala com segurança inabalável ganhará um número muito maior de seguidores do que aquele que diz “Não temos como saber ao certo” e menciona apenas as probabilidades (Housel, 2021, p. 116).
Essa observação de Morgan Housel ilustra como a confiança excessiva em previsões precisas pode atrair mais seguidores, apesar de ser uma abordagem menos realista e eficaz.
As consequências desse fenômeno psicológico são frequentemente desastrosas. Ele pode levar a decisões de investimento ruins, perda de capital e até falências.
Housel (2021, p. 104-107) explica que:
Quando confiamos demais na história dos investimentos como um guia para o que vai acontecer no futuro, duas coisas perigosas acontecem. 1. Aumenta a probabilidade de deixarmos passar despercebidos os eventos mais transformadores. […] 2. A história pode ser um guia enganoso para o futuro da economia e do mercado de ações porque não leva em conta as mudanças estruturais relevantes para o mundo atual (Housel, 2021, p. 104-107).
Para superar o excesso de confiança, é essencial reconhecer suas limitações e aceitar a incerteza. Housel sugere uma abordagem mais humilde e cautelosa: “a margem para imprevistos permite que você sobreviva a uma série de resultados possíveis, e a sobrevivência permite que você continue no jogo por tempo suficiente até tirar proveito de um resultado de baixa probabilidade” (Housel, 2021, p. 116-117). Para o autor, adotar essa estratégia é eficaz para reduzir os riscos associados à autoconfiança exagerada.
Esse fenômeno psicológico afeta a tomada de decisões financeiras, podendo levar a previsões errôneas e decisões arriscadas, resultando em perdas. Como Housel aponta, a chave para mitigar esse viés cognitivo é adotar uma abordagem mais humilde, reconhecer a incerteza e usar estratégias como a margem para imprevistos para proteger os investimentos.
Reconhecer e corrigir o excesso de confiança pode melhorar os resultados financeiros e ajudar a evitar os erros comuns que muitos investidores cometem (Housel, 2021, p. 115-118).
Essas abordagens de Morgan Housel fornecem uma visão abrangente sobre como esse viés cognitivo pode impactar as finanças pessoais e destacam a importância de uma conduta cautelosa e bem-informada. Através de uma análise cuidadosa e da adoção de estratégias adequadas, é possível reduzir os efeitos negativos desse comportamento e alcançar uma gestão financeira mais equilibrada e segura.
DESCONTO HIPERBÓLICO: A PREFERÊNCIA POR RECOMPENSAS IMEDIATAS
Desconto hiperbólico é a tendência de preferir recompensas imediatas em detrimento de ganhos futuros maiores. Isso pode levar a comportamentos financeiros míopes, como gastos impulsivos supérfluos, ao invés de poupar para o futuro. Por exemplo, alguém pode escolher gastar dinheiro em um bem de consumo imediato, como um novo smartphone, em vez de investir esse dinheiro para a aposentadoria.
O desconto hiperbólico é um conceito importante na economia comportamental que descreve como as pessoas tendem a descontar o valor de recompensas futuras de forma não linear. Laibson (1996, p. 449), afirma que “eventos no futuro próximo são descontados a uma taxa de desconto implícita mais alta do que eventos no futuro distante”. Isso indica que as pessoas atribuem mais valor às recompensas imediatas do que a futuras, mesmo que o valor total a ser ganho, seja maior no longo prazo.
Essa estrutura de desconto é caracterizada por uma taxa de desconto que diminui à medida que o evento descontado se projeta mais para o futuro, em contraste com o desconto exponencial, que possui uma taxa de desconto constante (Loewenstein e Prelec, 1992 apud Laibson, 1996, p. 449). Segundo Laibson (1996, p. 450), “a função de desconto hiperbólico generalizada é caracterizada por uma taxa de desconto instantânea que cai à medida que aumenta”.
Essa tendência de descontar de forma hiperbólica pode levar a problemas de auto regulação, como procrastinação e falta de poupança (Ainslie, 1975, 1986, 1992; Prelec, 1989; Loewenstein e Prelec, 1992 apud Laibson, 1996, P. 450). Isso ocorre porque as pessoas tendem a dar mais valor ao consumo imediato do que ao consumo futuro, mesmo que isso vá contra seus próprios interesses de longo prazo.
O desconto hiperbólico afeta a tomada de decisões financeiras a longo prazo de várias maneiras:
O desconto hiperbólico, é um conceito central na economia comportamental, oferecendo insights valiosos sobre o comportamento humano em relação ao tempo e à tomada de decisões financeiras. Compreender essa tendência permite que indivíduos e instituições adotem práticas e políticas que promovam um equilíbrio melhor entre consumo imediato e poupança futura, contribuindo para maior estabilidade e segurança financeira.
O PAPEL DO AMBIENTE SOCIAL E CULTURAL NAS DECISÕES FINANCEIRAS
O ambiente sociocultural exerce uma influência nas decisões financeiras, tanto em nível individual quanto coletivo. Normas culturais, valores e práticas sociais moldam atitudes e comportamentos relacionados ao dinheiro, à poupança, investimento e consumo. Conforme Housel (2021, p. 10), “o sucesso financeiro tem menos a ver com a sua inteligência e muito mais a ver com o seu comportamento”, ressaltando a importância do comportamento sobre o conhecimento técnico nas finanças pessoais. Kiyosaki (2018, p. 77) complementa essa ideia afirmando que “os ricos adquirem ativos e os pobres e a classe média, passivos”.
Vale ressaltar que, em diversas sociedades, como as nações asiáticas, onde a poupança é altamente valorizada, observa-se uma maior propensão a acumular recursos. Por outro lado, em culturas que priorizam o consumo imediato, há uma tendência maior ao gasto e menor à poupança. Kiyosaki (2018, p. 45) observa que “a maioria das pessoas, se receber mais
dinheiro, apenas se endividará mais”, destacando a falta de hábitos de poupança em algumas culturas.
Expectativas familiares e pressões sociais também desempenham um papel crucial nas escolhas financeiras. A aquisição de bens, o financiamento da educação dos filhos e o planejamento para o futuro são exemplos de decisões fortemente influenciadas pelo contexto sociocultural. Segundo Kiyosaki (2018, p. 51), “a maioria das pessoas tem um preço. E isso por causa de duas emoções humanas, o medo e a ambição”, mostrando como emoções básicas podem direcionar decisões financeiras. Essas influências, embora sutis, são poderosas, sublinhando a importância de se compreender o contexto social e cultural em que os indivíduos e comunidades estão inseridos. Housel (2021, p. 12) reforça essa ideia ao afirmar que “o sucesso financeiro não é uma habilidade técnica. É uma habilidade pessoal, na qual o seu comportamento é mais importante do que o seu conhecimento”.
Na América do Sul, a cultura, com suas distintas nuances regionais e influências indígenas, africanas e europeias, desempenha um papel relevante na forma como as nações lidam com suas finanças. No Brasil, por exemplo, há uma forte tendência ao consumismo e à valorização do “viver o momento”, o que pode influenciar hábitos financeiros voltados ao gasto imediato, em detrimento da poupança a longo prazo. Como observa Zruel (2016, p. 13), “milhões de brasileiros estão endividados e desesperados. Iludem-se com o consumismo típico de sociedades capitalistas, estimulados diariamente por campanhas publicitárias, ofertas de oportunidades, novos produtos e promoções”. No entanto, essas generalizações culturais não são absolutas, havia e existe grande diversidade dentro do próprio país.
Além do mais, a pesquisa acadêmica é fundamental para a compreensão e análise das relações entre diversidade, desigualdade e comportamentos financeiros. Estudos interdisciplinares que integram psicologia, economia e ciências sociais fornecem insights sobre como fatores socioculturais, étnicos e de gênero influenciam atitudes e decisões financeiras. Housel (2021, p. 23) explica que “toda decisão financeira que uma pessoa toma é fruto da informação que ela tem à disposição no momento, associada ao seu modelo mental único sobre a forma como o mundo funciona”. Kiyosaki (2018, p. 57) acrescenta que “a escola é muito importante. Vocês vão à escola para aprender uma habilidade ou uma profissão e se tornar um membro útil da sociedade”. Esses estudos podem revelar padrões de desigualdade e discriminação, contribuindo para o desenvolvimento de políticas e programas que promovam a equidade e a inclusão financeira.
Portanto, compreender as nuances culturais e sociais que moldam o comportamento financeiro é essencial para o desenvolvimento de estratégias e políticas econômicas melhoradas. A pesquisa acadêmica, pode esclarecer as complexidades da diversidade e da desigualdade, auxiliando na construção de uma sociedade justa e equilibrada financeiramente. Conforme Zruel (2016, p. 31), “a programação mental, a sua mentalidade, é o fator principal que define se terá sucesso ou fracasso financeiro”. Além disso, pode-se perceber que o ambiente social e cultural é um componente fundamental no estudo dos comportamentos financeiros, contribuindo para a criação de políticas e iniciativas inclusivas e adaptadas às realidades locais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao concluir este artigo, ressalta-se sobre a importância vital da psicologia financeira na vida cotidiana e no planejamento financeiro. O objetivo principal deste estudo foi entender como os comportamentos financeiros, influenciados por emoções e vieses cognitivas, impactam as decisões econômicas e como podem ser gerenciados para promover um bem- estar financeiro mais eficaz.
Reconhecer e entender os comportamentos financeiros capacita a tomada de decisões mais racionais e seguras. A educação financeira proporciona as ferramentas e conhecimentos necessários para gerir os recursos financeiros de forma eficaz, enquanto o autoconhecimento permite que cada indivíduo entenda seus próprios comportamentos e emoções em relação ao dinheiro.
Os resultados deste estudo destacam que o aprendizado financeiro deve ser contínuo, adaptando-se às mudanças no mercado e às necessidades pessoais. Livros como “A Psicologia Financeira” de Morgan Housel e “Previsivelmente Irracional” de Dan Ariely são excelentes recursos para aprofundar o entendimento sobre como a psicologia afeta nossas finanças. O autoconhecimento envolve a reflexão contínua sobre como as emoções e experiências passadas influenciam nossas decisões financeiras, ajudando a identificar padrões de comportamento e a adotar estratégias para corrigir decisões prejudiciais.
A psicologia financeira oferece compreensões valiosas que podem contribuir para a segurança financeira a longo prazo. Compreender os mecanismos psicológicos que afetam as decisões financeiras permite que indivíduos e famílias adotem práticas financeiras mais saudáveis e resilientes. Aplicar os princípios desse campo de estudo, como reconhecer e mitigar vieses cognitivas, pode levar a uma gestão financeira equilibrada e ao crescimento patrimonial sustentável.
Vale salientar que este estudo possui limitações, como a dependência de literatura existente e a necessidade de mais pesquisas empíricas para validar as conclusões. No entanto, ele oferece uma base teórica sólida para futuras investigações.
Recomenda-se que pesquisas futuras explorem novas áreas e desenvolvam um entendimento mais profundo dos fatores que influenciam o comportamento financeiro, combinando insights da psicologia, economia, sociologia e neurociência. Isso pode levar a uma compreensão mais holística das decisões financeiras.
Com o avanço da tecnologia, especialmente no campo das finanças digitais e fintechs, é essencial investigar como essas inovações influenciam as práticas financeiras e como a psicologia pode ajudar a otimizar o uso dessas ferramentas. Estudar como diferentes contextos culturais afetam o comportamento financeiro pode fornecer insights para criar estratégias de educação financeira mais eficazes e culturalmente sensíveis.
Este estudo visa fornecer uma compreensão abrangente e aplicável da intersecção entre finanças e psicologia, oferecendo percepções para uma gestão financeira consciente, equilibrada e satisfatória.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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