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Resumo
INTRODUÇÃO
A síndrome de Down é uma doença cromossômica, devido a presença de três cópias de genes que se localizam no par do cromossomo 21, tendo como uma das conseqüências mais frequentes a deficiência mental. Cerca de 18% do total dos portadores desta frequentam instituições especializadas (Moreira et al 2000).
A causa dessa síndrome é caracterizada por um erro na distribuição dos cromossomos nas células, ou seja, um cromossomo extra no par 21 (na grande maioria dos casos), e pode ocorrer de 3 modos:1) a não-disjunção cromossômica total, 2) quando a trissomia não afeta as células e 3) translocação gênica, esses três tipos provocam o desequilíbrio na função reguladora que os genes exercem sobre a síntese de proteína e isso leva a desarmonia no desenvolvimento e nas funções das células (Moeller 2006)
Os sinais físicos que acompanham a síndrome de Down em geral são: hipotonia muscular que é responsável pelo atraso do desenvolvimento motor, abertura das pálpebras inclinadas com a parte externa mais elevada, prega da pálpebra no canto interno dos olhos, dentes pequenos, língua protusa, palato elevado, mãos grossas e curtas com prega única na palma das mãos, entre outros, que podem variar de pessoa para pessoa (Cardoso 2003)
Algumas patologias geralmente estão associadas a síndrome de Down: 40% possuem problemas cardíacos, 12% anomalias do trato gastrintestinal, 30% problemas visuais como miopia e 40 a 75% apresentam perdas auditivas. E a incidência é de 1 :700 bebês nascidos vivos e aumenta a chance quando a mãe tem uma idade igual ou superior a 40 anos, devido a degradação do processo meiótico associado à idade (Ribeiro et al 2003)
Quando uma mãe gera uma criança, muitos sentimentos estão envolvidos, não é diferente com uma mãe de uma criança com síndrome de Down. A família ao receber a notícia passa por alguns estágios, o luto que é a perda do filho perfeito, negação, isolamento, raiva, barganha, depressão e aceitação. Essas fases não acontecem de forma organizada e estruturada, também não são obrigatoriamente uma a uma vivenciadas pela família. Na fase da aceitação os pais estão mais estruturados e vão buscar apoio com profissionais da saúde ou em instituições especializadas para que o filho tenha uma melhor qualidade de vida , pois o desenvolvimento é mais lento comparado com outras crianças. Essas crianças dependem do suporte da família, por isso deve ser consistente, e quanto antes a criança for estimulada melhor será o seu prognóstico (Silva e Dessen 2003)
A família exerce um papel importante em todo o desenvolvimento de um indivíduo e quando um de seus membros está acometido, essa relação pode desestruturar. Ao nascer um filho, está envolvido um monte de sentimento e a espera de um filho saudável, portanto quando isso não ocorre as respostas de negação ou de aceitação poderão aparecer e interferirá nos cuidados, crescimento e desenvolvimento da criança. A criança necessita dos cuidados básicos e fisiológicos e, além disso, de carinho, afeto, fala e do toque para que ocorra um vínculo mãe-filho (Iervolino 2005)
Neste sentido, este estudo tem como objetivo identificar como os pais de crianças com síndrome de Down vivenciaram as diferentes fases da vida de seus filhos.
METODOLOGIA
Estudo descritivo – exploratório, de natureza qualitativa desenvolvido junto a cinco mães de crianças com síndrome de Down, acompanhadas pela APAE de Mandaguaçu – PR.
O município de Mandaguaçu está situado no norte do Paraná e segundo os dados do IBGE, a população estimada até 01 de julho de 2006 é de 18.403 habitantes.
A APAE de Mandaguaçu, que existe desde agosto de 1986 é uma instituição especializada no atendimento de crianças com necessidades especiais, contando para isto com uma equipe formada por zelador, professor, coordenador, diretor, secretária, professor de educação física, professor de educação musical e educação artística, fisioterapeuta, assistente social, fonoaudiólogo, psicólogo e médico psiquiatra.
Os dados foram coletados por meio de entrevista semi-estruturada, individualizada, gravada e realizada na instituição. Foi utilizado um roteiro semi-estruturado, elaborado pelas próprias autoras com base nos objetivos do estudo e na revisão de literatura.
Após a coleta de dados, os mesmos foram transcritos na íntegra e submetidos a um processo de categorização e análise do tipo temática (Minayo, 1995)
O desenvolvimento do estudo obedeceu aos preceitos disciplinados pela resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que estabelece normas para pesquisa com seres humanos. O projeto foi aprovado pelo Comitê de ética em Pesquisa com seres humanos da UEM – COPEP. A solicitação de autorização para a realização do estudo foi feita através de ofício da pesquisadora entregue á direção da instituição. A solicitação de participação no estudo foi feita verbalmente, onde foi marcado previamente um horário adequado tanto para a mãe quanto para a pesquisadora realizar a visita na instituição. Nesta ocasião foi informado os objetivos do estudo, tipo de participação desejada, a livre opção em participar ou não e o de desistir desta participação em qualquer momento sem qualquer prejuízo para o atendimento da criança na instituição. As mães que concordaram em participar do estudo assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido em duas vias.
APRESENTAÇÃO DOS DADOS
Os pais que foram entrevistados nesse estudo apresentavam de 26 a 71 anos de idade, todos alfabetizados no mínimo o ensino fundamental completo e nenhum possuía curso superior. A renda mensal das famílias era na média de três salários mínimos, sendo a da mãe 1, um salário mínimo. Quatro famílias são do tipo nuclear, consideradas pequenas, pois no máximo 3 filhos (mãe 1) ou 2 filhos (mãe 2, mãe 3 e mãe 4 ) e uma família considerada monoparental (mãe 5) (Centa e Elsen, 1999)
Observa-se que duas mães ficaram sabendo do diagnóstico de seus filhos no hospital, ao nascimento da criança e três mães suspeitaram de algo estranho com a criança e por isso foram em busca de um pediatra. Das cinco entrevistadas, três delas receberam o diagnóstico pelo pediatra, uma pelo clínico geral que realizou o parto e a outra por um profissional da saúde que fez a coleta do material para a realização do cariótipo, e nos relatos identifica-se que existem diferentes maneiras dos profissionais comunicarem aos pais o diagnóstico de uma doença congênita.
No momento da notícia do diagnóstico todas as mães estavam presentes, porém em dois casos os pais se ausentaram. Três mães receberam o diagnóstico até o 4º dia de vida de seus filhos e duas mães até o 40º dia.
“Percebi que alguma coisa estava diferente, o médico pegou a minha filha no colo e começou a falar dos olhinhos, que ela tinha que ir para a Apae, se eu conhecia alguém com Síndrome de Down e pediu para a hora que saíssemos do hospital procurássemos a Apae. Eu fiquei em estado de choque, pois esperava uma filha normal. E meu marido não estava comigo naquela hora”… (mãe 2)
“O médico encaminhou a minha filha para um pediatra por causa do amarelão, chegando no pediatra ele olhou para a minha filha e falou: sua filha é mongolóide, Síndrome de Down e não tem nada a ver com o amarelão, e isso aconteceu quando ela tinha 4 dias de nascida”… (mãe 3)
“Ficamos sabendo que a minha filha era Síndrome de Down quando ela tinha completado 40 dias, quando o homem do laboratório, que tirou o sangue da minha filha para o cariótipo nos informou”… (mãe 4)
As cinco mães deste estudo relataram que ao receberem a notícia do diagnóstico ficaram muito comovidas, choraram muito, levaram um choque e tiveram medo do que iria acontecer daquele momento para frente. Entretanto quatro pais queriam descobrir quem era a culpa e o porque o meu filho Síndrome de Down? e um pai aceitou tudo mesmo não sabendo direito sobre o que era Síndrome de Down.
“Foi um choque pra mim, chorei muito, não conseguia entender nada do que o médico falava. Agora o pai conversou tranqüilamente mesmo não entendendo o que era a Síndrome de Down”… (mãe 1 )
“Na hora fiquei em choque, esperava uma criança normal e pensava na minha família de como eles iam reagir e o meu esposo queria saber de quem era culpa”… (mãe 2)
“Eu senti medo, medo da sociedade, medo do futuro da criança, medo de não saber cuidar dela e chorei, o pai dela só se perguntava porque com minha filha?… (mãe 4)
Antes de ter um filho Síndrome de Down nenhuma mãe conhecia sobre isto, apenas conhecia algumas crianças e ao ter contato com estas crianças pensavam como os pais cuidavam delas, como superaram o preconceito das pessoas.
“Eu olhava para as crianças e pensava nos pais dessas crianças, do preconceito das pessoas, de como os pais se sentiam e nos cuidados”… (mãe 3)
Após o nascimento de seus filhos, todas as mães do presente estudo foram em busca de informações teóricas a respeito da Síndrome de Down, porém apenas dois pais acompanharam as mães.
Entre as entrevistadas, duas mães revelaram o diagnóstico de seus filhos para a família antes da confirmação do exame cariótipo e três preferiram esperar a confirmação do cariótipo para contar a todos os familiares.
O número de três mães referiu que os profissionais da saúde explicaram sobre o desenvolvimento de seus filhos e duas relataram não receber essas informações. No que se refere ao encaminhamento dessas crianças para uma instituição especializada com a criança Síndrome de Down, quatro mães informaram que os profissionais da saúde encaminharam e uma mãe referiu que ninguém encaminhou e ela que foi em busca. Quanto ao desenvolvimento de seus filhos, as cinco mães identificam a ajuda dos profissionais da saúde no desenvolvimento de seus filhos, pois os profissionais realizam orientações à família que podem dar continuidade do tratamento em casa. Quatro mães identificaram que a ajuda dos profissionais da saúde facilitou no processo de cuidar das crianças e uma relatou que foi o apoio da família. E as dificuldades que encontraram foram as seguintes: duas mães enfatizaram o preconceito dentro e fora da família, outra mãe falou que ficava comparando as filhas, ou seja, como era diferente o desenvolvimento da filha com Síndrome de Down com a que não era, por final a mãe 2 comentou do atraso do desenvolvimento global do filho.
“O pessoal que atende meu filho na APAE, explicaram sobre o desenvolvimento dele e sempre me escutaram em todos os momentos que eu precisei. Me passava orientações para eu continuar fazendo em casa e isso ajudou bastante as dificuldades que meu filho apresentava, e era a nossa maior dificuldade por ele ter Síndrome de Down”… (mãe 1)
“Todos os profissionais que atendeu a minha filha, até médicos falavam do que é esperado e do que não é esperado para ela. Eles sempre dão dicas conselhos e eu procuro ajudar em casa, e minha filha foi melhorando a cada dificuldade que ela tinha, e o atraso geral dela era o nosso maior desafio”… (mãe 2)
Todas as mães relataram que “hoje”, elas olham para seus filhos e sentem uma vitória, tanto para a criança como para eles, e tratam esses filhos como pessoas normais e que precisam de limites e regras.
“Hoje vejo que meu filho venceu tudo é uma criança normal e especial”…(mãe 1)
“Olho para a minha filha e sinto que uma vitória é uma criança normal mas especial, que tenho que pôr limites e regras”… (mãe 4)
Duas mães colocaram que na família existe o preconceito, porém três não referiram. Em relação ao preconceito fora da família, todas as mães entrevistadas referiram e relataram que para superar o preconceito é difícil e complicado e elas ignoram as pessoas da sociedade.
No que se refere às atividades que deixaram de fazer por terem um filho Síndrome de Down, três mães colocaram que trabalhavam fora de casa e por terem uma criança especial deixaram de trabalhar para atender os seus cuidados e duas mães continuaram trabalhando.
DISCUSSÃO DOS DADOS
Devido ao grau de escolaridade dos pais fica evidente que eles compreendem sobre as limitações de seus filhos, optando assim por um adequado estímulo e tratamento para os mesmos, até mesmo porque buscam informações atuais sobre a síndrome de Down.
Ao receberem o diagnóstico de seus filhos referiram não estarem preparadas para a notícia, sentindo assim a necessidade de um apoio. O diagnóstico deve ser dado o quanto antes, pois a falta de informação inicial adequada poderá atenuar ainda mais todo o desenvolvimento da criança (Petean e Suguihura, 2005)
A notícia de um filho portador de uma doença congênita faz com que a família vivencie alguns sentimentos como a reação de choque, a culpa, a raiva, a tristeza e o de luto, sendo essencial à presença do pai junto à mãe nesse momento para superar e alcançar o equilíbrio da família (9). A ajuda e a mediação dos profissionais da saúde podem minimizar esses estágios, informando as famílias não só os pontos negativos e também os pontos positivos, a forma com que é divulgado o diagnóstico poderá refletir na superação da situação de desamparo dos pais (Bazon et al, 2004)
O impacto do diagnóstico pode comprometer a interação dos pais e familiares frente à criança, por isso é importante que os pais recebam todas as informações sobre o desenvolvimento de seus filhos pelos profissionais da saúde, com a finalidade de estimular adequadamente tendo um equilíbrio na oferta dos estímulos, respeitando as suas limitações (Silva e Dessen, 2001)
O fato das mães conhecerem outras pessoas com síndrome de Down, não facilitou o processo de aceitação, para que isto ocorra é preciso que a família vivencie todos os estágios para passar a aceitar as limitações de seus filhos (Bazon et al, 2004)
Os pais optaram por revelarem o diagnóstico a todos os familiares após a confirmação do cariótipo, tendo ainda uma esperança do cariótipo não acusar como síndrome de Down evidenciando a fase da não aceitação do diagnóstico (Bazon et al, 2004, Silva e Dessen, 2001)
Os profissionais da saúde muitas vezes são os que orientam as famílias, fazendo com que facilite nos cuidados das crianças (Carswell, 1993)
O preconceito dentro e fora dos familiares de crianças com doenças congênitas ainda existe, apesar de toda a divulgação em televisão, rádio entre outras. As pessoas por falta de conhecimento formam um (pré) conceito, ou seja, o preconceito é fruto de uma total desinformação sobre tal. O preconceito dentro da família demonstra-se como uma dificuldade de alguns pais para cuidar dos seus filhos e outra dificuldade é em relação o atraso de todo desenvolvimento ainda mais quando a criança é comparada a um irmão dito “normal” (Silva, 2007)
As mães na maioria deixam de trabalhar remuneradas para atender exclusivamente aos cuidados de seus filhos, já que apresentam uma certa limitação em todo o desenvolvimento dos mesmos (Sigaud e Reis, 1999)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As mães deste estudo informaram como é difícil receber um diagnóstico de doença congênita de um filho, e que existem alguns profissionais da saúde despreparados para revelar um diagnóstico, evidenciando a falta de apoio.
Os pais passam por vários estágios e até passar para a aceitação, eles mesmos tem preconceito de seus filhos por não divulgarem a probabilidade da criança ser síndrome de Down para todos os membros familiares.
Os profissionais da saúde tem que revelar o diagnóstico precocemente, levando em consideração o momento ideal, não informando apenas para a mãe e sim para o casal. A família deverá ser orientada quanto ao desenvolvimento e crescimento de seus filhos revelando as limitações para que os pais realizem adequadamente as estimulações aos seus filhos.
A família deverá ser caracterizada pelo profissional da saúde a fim de fortalecer, reconhecendo suas fragilidades, necessidades e potencialidades, assim o trabalho será efetivo.
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