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Resumo
INTRODUÇÃO
A cidade de Resende, situada na região sul do estado do Rio de Janeiro, destaca-se por sua relevância histórica, cultural e estratégica. Reconhecida nacionalmente por sediar a Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), a cidade também abriga um rico acervo de manifestações culturais, tradições populares e patrimônio arquitetônico que remonta ao período colonial. Roesler & Fogaça (2020), afirmam que esses elementos, além de constituírem a identidade local, configuram-se como potenciais recursos pedagógicos para o fortalecimento da cidadania nas escolas públicas.
Nas últimas décadas, tem se intensificado o debate acerca do papel da escola na valorização da história e da cultura locais como estratégia para promover o pertencimento e a identidade social dos estudantes. A educação patrimonial, nesse cenário, emerge como uma proposta pedagógica que articula memória coletiva, consciência histórica e vivência comunitária, contribuindo para uma aprendizagem contextualizada. Inserir o patrimônio no cotidiano escolar favorece o reconhecimento da diversidade cultural e aproxima os estudantes de suas raízes (Fonseca, 2009; Diniz, 2018).
Paralelamente, nota-se a ampliação do uso de tecnologias digitais na educação, com o advento de recursos como softwares livres, vídeos interativos, jogos educativos e plataformas colaborativas. Essas ferramentas, quando aplicadas com intencionalidade pedagógica, ampliam o acesso à informação e estimulam o pensamento crítico, a autonomia e a criatividade dos estudantes (Kenski, 2021; Valente, 2018).
Contudo, o uso de tecnologias no ensino ainda enfrenta entraves, sobretudo nas escolas públicas. A ausência de formação continuada para os docentes, a escassez de equipamentos e a limitada inserção das tecnologias nas propostas curriculares representam desafios concretos a serem superados (Moran, 2021). Em municípios como Resende, onde o patrimônio cultural é expressivo, as dificuldades enfrentadas reforçam a necessidade de qualificar e ampliar políticas públicas já existentes, de modo a incentivar o uso pedagógico das tecnologias em diálogo com a realidade local.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) destaca a valorização dos saberes territoriais e o incentivo ao protagonismo estudantil como elementos essenciais da formação integral. Nessa perspectiva, o ensino de história local mediado por tecnologias digitais, como visitas virtuais à AMAN, uso de softwares educativos como o GCompris, ou a produção de podcasts e vídeos com base em entrevistas com moradores, pode contribuir para uma educação mais democrática, participativa e conectada com a comunidade (Brasil, 2018).
Diante do exposto, este artigo tem como objetivo analisar como a história e o patrimônio cultural de Resende-RJ podem ser incorporados ao currículo da educação básica por meio de tecnologias digitais, com base na educação patrimonial e nas diretrizes da BNCC. Especificamente, busca-se compreender o papel da informática educativa na valorização da história local, explorar práticas pedagógicas que utilizem recursos digitais e discutir os desafios de implementação dessas estratégias em contextos escolares.
DESENVOLVIMENTO
METODOLOGIA
O presente artigo foi elaborado com base em uma pesquisa qualitativa, de natureza descritiva, conduzida sob a abordagem da revisão bibliográfica. Esse tipo de investigação tem como finalidade analisar criticamente a produção acadêmica disponível sobre determinado tema, sem a realização de coleta direta de dados empíricos. A opção pela revisão bibliográfica justifica-se pela proposta de reunir e interpretar contribuições teóricas acerca da utilização das tecnologias digitais e da educação patrimonial no ensino da história local, com foco no contexto da cidade de Resende-RJ.
A seleção do material analisado considerou publicações divulgadas no período compreendido entre os anos de 2015 e 2025, com o intuito de assegurar a atualidade e a relevância das discussões. Foram definidos como critérios de inclusão: artigos científicos, livros, dissertações e teses disponíveis integralmente em português ou inglês e que apresentassem aderência temática ao objeto de estudo. Como critérios de exclusão, desconsideram-se resumos simples, artigos de opinião, primeiras impressões, documentos não revisados por pares e materiais duplicados.
As buscas foram realizadas em bases amplamente reconhecidas no meio acadêmico, como o Google Acadêmico, a biblioteca eletrônica SciELO, o Portal de Periódicos da CAPES e bancos digitais de teses e dissertações. Os descritores utilizados incluíram: “educação patrimonial”, “informática educativa”, “tecnologias na educação”, “história local” e “Resende RJ”. A escolha dessas palavras-chave fundamentou-se na sua recorrência nas produções científicas da área e em sua pertinência ao escopo do estudo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A integração das tecnologias digitais no processo educativo tem transformado significativamente a dinâmica de ensino-aprendizagem, exigindo novas formas de interação com o conhecimento. No campo da história, esse movimento é particularmente relevante ao possibilitar abordagens mais atrativas, interativas e contextualizadas, especialmente quando articulado à educação patrimonial. Fonseca (2017) defende que trabalhar o patrimônio no ambiente escolar não apenas fortalece a identidade local, mas também estimula a consciência histórica e a construção da cidadania crítica.
No município de Resende-RJ, a pesquisa de Roesler e Fogaça (2020) destaca a relevância da educação patrimonial e turística como instrumento de mediação entre a escola e os espaços de memória da cidade. As autoras analisam como a história e o patrimônio resendense, especialmente o Centro Histórico, podem ser explorados pedagogicamente para desenvolver nos estudantes uma consciência crítica sobre o território que habitam. Ao estudarem os processos de ocupação urbana e as transformações espaciais ocorridas ao longo do tempo, apontam para a importância de valorizar os bens materiais e imateriais como estratégias de ensino e formação cidadã.
A proposta pedagógica apresentada por Roesler e Fogaça (2020) inclui a articulação de roteiros educativos, oficinas de sensibilização, caminhadas históricas e atividades interativas que utilizem tecnologias simples, como a produção de mapas afetivos e registros audiovisuais. Essa abordagem contribui para a ressignificação do cotidiano dos estudantes, que passam a perceber sua cidade como lugar de aprendizagem e construção de identidade. Ainda, ao defenderem a integração entre educação patrimonial e educação turística, as autoras ampliam o debate sobre o uso do território como um laboratório vivo para práticas educativas transversais, que envolvem história, geografia, meio ambiente e cidadania.
Complementando essa abordagem, Barboza e Comarú (2021) apresentam um portfólio de ações práticas do projeto “Aprendendo a História de Resende de Forma Lúdica”, no qual atividades interativas com jogos, dinâmicas e mídias visuais são aplicadas para ensinar história regional. A experiência mostra que mesmo com recursos simples é possível alcançar alto grau de engajamento e aprendizagem, especialmente em escolas públicas com restrições tecnológicas.
Diniz (2022), em sua dissertação sobre o Centro Histórico de São Luís-MA, reforça o uso de ferramentas digitais como meio de aproximação entre estudantes e patrimônio cultural. A autora propõe a adoção de plataformas digitais, vídeos, áudios, redes sociais e mapas colaborativos como instrumentos de resgate da memória coletiva, permitindo que os alunos se tornem sujeitos ativos na construção do conhecimento histórico. Essa estratégia tem como objetivo promover uma leitura crítica do espaço vivido, na qual o estudante compreende o território não apenas como cenário, mas como protagonista da própria formação social e cultural.
O modelo metodológico proposto por Diniz (2022), articula educação patrimonial e letramento digital, favorecendo o protagonismo juvenil e a produção de conteúdos autorais, como podcasts, mini documentários e exposições digitais. Essas práticas fortalecem a relação entre memória, identidade e pertencimento, e contribuem para o desenvolvimento de competências previstas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), como a empatia, a colaboração e o pensamento crítico. Embora o estudo tenha como foco a cidade de São Luís-MA, suas contribuições podem ser replicadas e adaptadas ao contexto de Resende-RJ, sobretudo em ações pedagógicas que envolvam o reconhecimento e a valorização de espaços simbólicos da cidade, como o entorno da AMAN, o Centro Histórico, igrejas centenárias e bairros tradicionais. Essas ações, aliadas ao uso de recursos tecnológicos acessíveis, tornam-se poderosas ferramentas de ensino-aprendizagem baseadas na realidade local.
Kenski (2021) argumenta que o uso das tecnologias na educação vai além da inserção de equipamentos; trata-se de uma mudança de postura pedagógica. O uso de softwares educativos, vídeos interativos, infográficos e ambientes virtuais de aprendizagem fortalece o protagonismo estudantil e permite experiências mais próximas de sua realidade. Valente (2018) acrescenta que, ao desenvolver habilidades como autoria, colaboração e pensamento crítico, as tecnologias contribuem para ressignificar o papel do aluno como produtor de conhecimento.
A cidade de Resende apresenta características históricas singulares, como a presença da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), instituições religiosas seculares, casarões coloniais preservados e manifestações culturais tradicionais. Esses elementos compõem um rico patrimônio histórico e simbólico que, quando mobilizado pedagogicamente, pode fortalecer o vínculo dos estudantes com sua própria comunidade. A história da cidade, marcada por sua relevância no período do ciclo do café, pela diversidade étnica e por processos de transformação urbana, oferece um vasto leque de possibilidades para a construção de saberes escolares ancorados na realidade local.
De acordo com Moran (2021), a aprendizagem acontece quando os conteúdos escolares dialogam com o universo simbólico do aluno, tornando a experiência educacional mais autêntica, envolvente e conectada à vida cotidiana. Nesse sentido, trabalhar a história local por meio da integração entre educação patrimonial e ferramentas tecnológicas permite não apenas ensinar conteúdos históricos, mas também promover a valorização da identidade, da memória coletiva e da participação cidadã. O uso de mapas interativos, visitas virtuais, exposições digitais e registros audiovisuais de histórias orais pode tornar os espaços históricos de Resende verdadeiras salas de aula abertas, onde o passado e o presente dialogam a partir da vivência dos próprios estudantes.
Rodrigues (2015) aponta que a identidade coletiva é constantemente alimentada por narrativas culturais e espaços de memória. Ao incluir esses elementos no currículo da educação básica, os docentes não apenas ensinam história, mas constroem com os alunos um vínculo afetivo com sua cidade. Halbwachs (2015), ao tratar da memória coletiva, reforça essa dimensão comunitária da aprendizagem, indicando que a vivência no território é parte constitutiva da formação da consciência histórica.
Brusadin (2017) defende que o turismo cultural pode ser uma ferramenta educativa valiosa quando articulado ao currículo escolar, principalmente nas disciplinas de história e geografia. A visitação a museus, centros culturais e patrimônios arquitetônicos, combinada com atividades de registro audiovisual e uso de mapas digitais, permite ao aluno compreender o tempo e o espaço como dimensões vividas e interpretadas.
Adicionalmente, Freitas (2020) lembra que o êxito da articulação entre patrimônio, tecnologia e escola depende do engajamento dos professores e da gestão escolar. A formação docente continuada, o planejamento interdisciplinar e a inserção curricular de temas locais são apontados como estratégias para consolidar práticas educativas baseadas no território. Lima (2023), por sua vez, ressalta os desafios enfrentados por professores de cidades do interior ao tentar integrar tecnologia e história local, sugerindo que políticas públicas mais robustas são essenciais para a superação dessas barreiras.
Dessa forma, observa-se que a educação patrimonial mediada por tecnologias digitais é um caminho promissor para o ensino de história local. A experiência de Resende, somada aos exemplos de outras regiões, demonstra que é possível construir uma escola que valorize o território, estimule o protagonismo estudantil e promova uma aprendizagem contextualizada, crítica e transformadora.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Refletir sobre o ensino da história local mediado por tecnologias digitais, com foco na cidade de Resende-RJ, permitiu ampliar o olhar sobre as possibilidades educativas que emergem quando a escola se conecta ao território em que está inserida. A proposta deste artigo foi transitar entre os marcos da tradição e os recursos da inovação, buscando compreender como a educação patrimonial, aliada à informática educativa, pode tornar o processo de ensino-aprendizagem mais significativo, sensível e coerente com a vivência dos alunos. Constatou-se que o estudo da história local, impulsionado por tecnologias acessíveis, estimula o engajamento, o pensamento crítico e a valorização da identidade cultural dos estudantes.
Ao longo da análise, observou-se que o uso pedagógico das tecnologias digitais, embora ainda enfrente obstáculos como a escassez de infraestrutura e a carência de formação docente específica, tem se mostrado uma via fértil para a renovação das práticas educativas. Os dados coletados na literatura demonstraram que a valorização da história e do patrimônio local por meio de recursos como vídeos, jogos, visitas virtuais e softwares livres contribui para a construção de uma aprendizagem ativa, dialógica e contextualizada. Assim, o objetivo geral da pesquisa foi plenamente alcançado ao indicar caminhos viáveis e inspiradores para integrar tecnologias digitais ao ensino da história local em Resende-RJ.
Importa destacar que os desafios enfrentados pelas escolas públicas não são pontuais, mas revelam uma realidade estrutural que demanda políticas públicas efetivas, investimentos contínuos e, sobretudo, o reconhecimento do professor como sujeito estratégico da inovação pedagógica. A realidade de Resende se apresenta como um terreno fértil para a articulação entre história, tecnologia e comunidade, mas essa transformação só será efetiva com o envolvimento coletivo e o compromisso institucional.
Considerando os limites desta pesquisa, centrada na revisão bibliográfica, recomenda-se que estudos futuros se debrucem sobre experiências práticas em curso nas escolas municipais de Resende, com vistas a documentar, analisar e difundir iniciativas que materializem o que aqui se propõe. Também se sugere a produção de materiais didáticos digitais voltados à história da cidade, bem como o fortalecimento de projetos interdisciplinares que envolvam estudantes, professores, famílias e agentes culturais locais. Somente assim será possível consolidar uma escola conectada ao território, onde a aprendizagem se configure como experiência coletiva, viva e transformadora.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARBOZA, Silvia Marina Linhares; COMARÚ, Michele Waltz. Aprendendo a história de Resende de forma lúdica: portfólio de projeto de extensão. IFRJ, 2021. Disponível em: https://educapes.capes.gov.br/handle/capes/602400. Acesso em: 10 de abril de 2025.
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