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Resumo
INTRODUÇÃO
Este estudo dedica-se a uma análise teórica acerca do preconceito, bullying e do racismo no contexto escolar, explorando como esses fenômenos se manifestam nas instituições de ensino da educação básica no país. Assim, propõe-se uma reflexão crítica sobre a forma como a questão racial se estabelece e afeta o processo de ensino e aprendizagem, interferindo nas relações de cidadania e igualdade entre os indivíduos envolvidos no processo educativo. Além disso, a pesquisa aborda questões essenciais relacionadas à igualdade étnico-racial, envolvendo professores, alunos, gestores e a comunidade escolar que alicerça a educação contemporânea.
A partir dessa delimitação, compreende-se que a investigação sobre a temática representa um campo de estudo que ainda demanda diversas reflexões acadêmicas. Apesar dos avanços realizados nos espaços de ensino em termos de igualdade e inclusão, é indiscutível que existem muitos desafios a serem enfrentados para que a questão racial deixe de ser uma realidade nas instituições de ensino. Assim, levando em conta esses fatores, a pesquisa estabeleceu como problema de pesquisa a seguinte indagação: quais os impactos do bullying, preconceito e discriminação racial nos espaços para a convivência entre professores, alunos e a comunidade escolar como um todo? Esse questionamento poderá ser esclarecido por meio dos resultados obtidos.
Por meio desse problema, foram estabelecidos os objetivos da pesquisa, sendo o objetivo geral “analisar a materialização do bullying e da questão racial nos estabelecimentos de ensino da educação básica, a partir de uma análise teórica sobre o tema”. Esse objetivo geral foi subdividido em específicos, que incluem: entender o racismo e a discriminação nos ambientes escolares como um fenômeno dinâmico e de múltiplas causas; avaliar os impactos dessas problemáticas no cotidiano do processo de ensino e aprendizagem; identificar possíveis soluções para o enfrentamento a questão racial na escola contemporânea.
A metodologia da pesquisa baseou-se na definição dos apontamentos teóricos e conceituais que serviram de base para discutir o fenômeno da questão racial e do bullying no ambiente escolar. Portanto, optou-se por realizar a revisão dos referencias que discutem a temática, como por exemplo: Ávila (2010), Barreto (2014), Santos (2016), dentre outros igualmente importantes. Além disso, a estruturação metodológica que definiu a pesquisa seguiu os seguintes aspectos: configura-se como qualitativa, descritivo-explicativa e de revisão teórica. Qualitativa, porque busca identificar aspectos da existência social que não podem ser quantificados. Descritivo-explicativa por abranger descrições e encaminhamentos que possam explicar a origem desses fenômenos e seus fatores de influência na escola.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA: PRECONCEITO, BULLYING E DISCRIMINAÇÃO RACIAL DO PONTO DE VISTA CONCEITUAL
Conforme mencionado em inúmeras produções acadêmico-científicas, o bullying, o preconceito e a discriminação racial são diferentes manifestações de um mesmo problema: a desigualdade entre os seres humanos que leva em conta aspectos fenotípicos. No entanto, a extensa literatura que busca definir esses conceitos nem sempre esclarece a distinção entre eles. Muitas vezes, é comum observar que os termos preconceito e discriminação são usados de forma indistinta, como se fossem sinônimos de uma única prática, referindo-se à conduta intencional de um indivíduo que viola o direito à existência social e cultural de outra pessoa.
Ávila (2010) acredita que as expressões bullying, preconceito e discriminação racial são abordadas de forma distinta por diferentes correntes políticas e sociais. Essas questões estão imersas em debates que vão desde o senso comum até o ambiente acadêmico, onde cada área do conhecimento – como a educação, psicologia, direito e sociologia – oferece uma nova interpretação da questão racial, que visa identificar as relações sociais e culturais. Portanto, estabelecer uma definição exata para esses conceitos é uma tarefa desafiadora, uma vez que as discussões científicas sobre o tema requerem uma abordagem flexível e dialética na categorização e explicação dos conceitos.
A tentativa de definir fronteiras conceituais é importante, pois a discussão sobre a questão de raças está intrinsecamente ligada à negação/valorização de direitos. O racismo, por exemplo, manifesta-se através de uma ideologia que estratifica os indivíduos com base em suas condições e características, tanto pessoais quanto sociais. Essa estratificação também inclui elementos materiais, imateriais e históricos, já que sua formação resulta da imposição da vontade de um grupo étnico considerado superior a outro, visto como inferior. Desse modo, os aspectos materiais se refletem na negação da dignidade humana, no acesso a condições de vida adequadas, trabalho, cidadania e educação. Os aspectos imateriais dizem respeito à supressão das culturas raciais, frequentemente desvalorizadas. Por último, os elementos históricos referem-se à cronologia que marginalizou certas classes em razão de sua raça e posição social.
Lima e Vala (2011) destacam que a desigualdade racial (seja por meio da discriminação ou preconceito) se apresenta como uma ideologia que normaliza as distinções entre diferentes grupos. Dessa forma, pode ser compreendida como um mecanismo de estratificação que resulta em hierarquias e na exclusão de indivíduos ou de categorias inteiras às quais pertencem. No contexto do racismo, a distinção entre pessoas consideradas superiores e inferiores é baseada em características físicas externas, fomentando estereótipos que estabelecem um padrão de aceitabilidade. Assim, existe uma forte conexão entre a questão racial e a desigualdade, uma vez que se desenha um paralelo entre o que é considerado aceitável ou não, avaliando o ser humano a partir de sua própria condição ontológica.
Certamente, estabelecer uma definição clara para o termo racismo não é simples. No entanto, há um elemento que o distingue de outros conceitos relacionados, como preconceito e discriminação: a dimensão do estruturalismo. Isso se refere a um fenômeno abrangente, enraizado na sociedade, que se expressa através de uma ideologia que promove a ideia de superioridade entre grupos raciais diferentes, embora todos tenham direitos equivalentes. Segundo Munanga (2002), a interpretação do conceito de racismo é bastante complexa, pois, além de ser um fenômeno que se transforma ao longo do tempo e do espaço, apresenta-se tanto de formas materiais quanto imateriais. Desse modo, embora sua essência seja singular, suas características e expressões históricas são variadas.
A partir da definição conceitual destacada anteriormente, é possível tecer algumas considerações sobre a forma como a desigualdade racial se manifesta cotidianamente em sociedade. O racismo pode ser exemplificado, por exemplo, em atitudes depreciativas nas instituições escolares contra pessoas negras ou na negação de acesso de um indivíduo ou grupo pelo simples fato de sua cultura não estar alinhada a certos “padrões sociais”. Há, um entendimento de que o racismo naturaliza as condições de desigualdade do sujeito e de um grupo em relação à ordem hegemônica:
A desigualdade racial como sistema de relação social apresenta uma prática de exclusão do diferente e visa manter a ordem dominante sustentada, simbolicamente, pelo medo da perda do poder, mesmo que esse seja micro ou pontual. Dessa forma, mais que a mera manifestação de classe, como veiculado no imaginário social, o racismo é uma ação excludente que perpassa o âmbito pessoal, institucional e cultural. Para se contrapor a esse sistema de manutenção da ordem social e racial vigente, existe toda uma resistência política e social. À frente destas manifestações estão os movimentos negros, organizações não governamentais, intelectuais negros e não negros que reforçam posicionamentos e práticas contrárias a existência do racismo à brasileira, como também do racismo mundial (Santos, 2007, p. 23)
Portanto, essa definição teórica acerca do racismo oferece delimitações adequadas para distingui-lo de outros conceitos relacionados ao debate sobre desigualdade racial. Conclui-se, portanto, que o termo preconceito não é sinônimo de racismo, já que, à primeira análise, parece estar ligado a uma visão anterior do indivíduo sobre as diferenças entre raças. O preconceito englobaria um conjunto de impressões e convicções de uma pessoa sobre a condição racial de outra ou de um grupo ao qual ela pertence.
Guimarães (2002) caracteriza o bullying como sendo uma forma de intimidação sistemática, psicológica e comportamental que um indivíduo faz em relação a outro, não necessariamente envolvendo a questão racial. Segundo o autor, o bullying pode se manifestar tanto por meio de ações verbais quanto comportamentais, materializando-se inclusive em discriminação. Dessa forma, se revela nas atitudes sem motivação aparente, levando a insultos e a um tratamento desigual entre diferentes indivíduos, ainda que nem sempre o seja feito sob o critério racial. Assim como a discriminação, o bullying pode desencadear atos de violência, perpetuando a segregação e a desigualdade entre indivíduos e grupos por motivos diversos e nem sempre aparentes.
Por sua vez, a noção de preconceito racial surge da presença de uma ideia preconcebida de superioridade entre diferentes, mesmo que essa ideia não seja manifestada abertamente. Assim, a principal distinção entre preconceito e racismo reside em seu aspecto imaterial, ou seja, nas crenças racistas. Assim que uma pessoa começa a segregar ou demonstrar uma atitude agressiva, o preconceito evolui para racismo ou discriminação racial. Segundo Rosemberg, Bazilli e Silva (2003), o preconceito abrange um conjunto de crenças, valores e opiniões que levam o indivíduo a formar juízos negativos sobre determinados grupos e pessoas, unicamente por identificá-los como inferiores tanto racial quanto socialmente.
Ávila (2010) afirma que a forma mais extrema de racismo é a discriminação racial, que se manifesta por meio de atos violentos. Com frequência, a discriminação vem acompanhada de atitudes hostis de um indivíduo racista em relação à sua vítima. Outro aspecto importante da discriminação é a exclusão, que envolve a limitação de acesso a determinadas oportunidades e a definição de preferências pessoais com base em características como origem, etnia, cor ou gostos. Os atos discriminatórios buscam, de maneira insistente, obstruir a igualdade no acesso aos direitos e garantias que são fundamentais para a dignidade humana e a convivência social.
Diante dessas questões, fica bastante implícito que o racismo, o preconceito e a discriminação racial – apesar de serem conceitualmente distintos – faze parte de um mesmo processo de inferiorização do indivíduo por consequência de sua raça. Assim, é praticamente impossível o sujeito racista não praticar uma atitude discriminatória, precedida de uma concepção igualmente excludente. Todos esses conceitos resguardam entre si uma forte relação, ou seja, dependem um do outro para se constituir. Não há como separar o racismo da discriminação e esta última do preconceito:
O preconceito tem sido comumente praticado no dia a dia da população negra, no entanto, é pouco reconhecido até mesmo pelos próprios negros que, muitas vezes, não percebem ou não se sentem encorajados a denunciar discriminações sofridas. A forma sutil como as discriminações acontecem, muitas vezes, colaboram para o não reconhecimento de preconceitos e reforça sua negação, como também dificulta ser assumida pelos envolvidos – discriminado e discriminador. Até se reconhece que o preconceito existe quando se trata de situações, nas quais o sujeito não está diretamente envolvido, ficando difícil reconhecê-lo quando há um envolvimento direto, neste caso, a negação parece ser a saída mais cômoda (Santos, 2007, p. 31).
Dentre as ações decorrentes da discriminação racial, as mais comuns são as agressões verbais, as ameaças, o bullying e a violência física. No caso da violência física, ocorre após sucessivas posturas de inferiorização e ameaças entre alunos e destes para com professores ou funcionários. No geral, a agressão física se concretiza como resposta dos sujeitos vítimas de violência racial, ou quando os insultos raciais se encaminham para o campo da criminalização. Esses atos têm ocorrido frequentemente nas escolas, impactando a comunidade e gerando repercussão negativa para o desenvolvimento de atividades cotidianas.
A questão da agressão física nem sempre está relacionada ao fator racial, ainda que possa ser exercida de forma cumulativa. O que se verifica nesse tipo de situação é que, quase sempre, a vítima de algum tipo de inferiorização também tem contato com a violência corporal. Muito disso se deve a sensação de impunidade que permeia o meio social cotidiano. Em algumas situações, inclusive, a falta de atitude por parte das instituições de Estado acaba piorando ainda mais essa questão. Muitos dos agressores veem a questão racial como algo a ser resolvido internamente, como parte de um processo de naturalização das desigualdades. Isso, inclusive, é percebido nas escolas, conforme é abordado na seção a seguir.
RESULTADOS E DISCUSSÃO: REFLEXÕES SOBRE O PRECONCEITO, BULLYING E DISCRIMINAÇÃO NO AMBIENTE ESCOLAR
Diversos estudos têm abordado a questão da discriminação, do bullying e do preconceito racial nas escolas, revelando que essa realidade continua sem solução imediata. Ao analisar a origem histórica desse problema, torna-se claro que as instituições educacionais enfrentam desafios para desenvolver estratégias eficazes que minimizem seus impactos nas aulas e em outros ambientes da escola. Observa-se, por exemplo, que, nos anos recentes, houve um progresso na discussão sobre a questão racial; no entanto, essa discussão ainda se apresenta fragmentada e desconectada do dia a dia dos estudantes e profissionais da educação.
Do ponto de vista normativo, ocorreram mudanças importantes para enfrentar de comportamentos discriminatórios relacionados à raça. No entanto, no contexto da educação básica, é inadequado ver o racismo apenas como um problema jurídico. De fato, soluções reais só poderão ser efetivadas quando as instituições educacionais implementarem uma abordagem pedagógica ativa, integrando a discussão sobre essa questão como parte das atividades diárias, conectada ao currículo, às disciplinas e às práticas educacionais que envolvem a comunidade escolar como um todo.
Silva, Pinheiro e Chagas (2016) destacam que a desigualdade racial, o bullying e o preconceito se expressam através de comportamentos discretos entre educadores e alunos, impactando diretamente o desenvolvimento educacional e social dos estudantes que integram o ambiente escolar. Os autores também observam que a abordagem desse fenômeno é bastante desafiadora, uma vez que o racismo institucional frequentemente se revela de forma sutil e ambígua, manifestando-se sob a ótica de preconceitos que muitas vezes passam despercebidos, inclusive por aqueles que vivenciam suas consequências. Essas atitudes contraditórias indicam uma propensão à normalização de determinados discursos que abordam a questão racial como um padrão a ser imposto nas instituições de ensino do país.
Ao examinar a temática da igualdade racial nas instituições de ensino, França (2017) destaca que as dificuldades enfrentadas por estudantes negros vão além das diversas formas de preconceito e discriminação que existem. O autor aponta que os problemas têm início já no momento de acesso às instituições, onde esses alunos lidam com situações de exclusão. Quer no ensino fundamental, médio ou superior, a população negra é a mais prejudicada em relação à repetência e ao abandono escolar, evidenciando que as instituições ainda não estão preparadas para discutir e combater a desigualdade racial. Um exemplo dessa situação, conforme o autor, é a alta porcentagem de alunos negros que não conseguem se alfabetizar em sua faixa de idade. A citação a seguir reforça essa visão:
A escola é costumeiramente concebida como um espaço cuja principal função reside na oferta de conhecimentos relevantes em civilidade, crescimento pessoal e, ainda, formação para o mercado de trabalho. Por isso, a violência no âmbito escolar tornou-se foco de preocupação, interesse e estudos por ser considerada um problema social grave e complexo. Nesse contexto, destaca-se o bullying, o racismo e a discriminação, fenômenos mais ou menos velados que, tendo adquirido notoriedade, muitas vezes passam despercebidos pelos profissionais da educação. Trata-se do emprego de violência física e psicológica realizada contra um indivíduo específico ou grupo, de modo intencional, ocorrendo em diversos contextos de interação social e envolvendo pessoas de idades distintas (Chaves; Souza, 2018, p. 3).
As principais consequências desse processo contraditório podem ser percebidas por meio do baixo desempenho na aprendizagem dos educandos, na maior frequência em aulas de reforço estudantil, nos índices de repetência anual e, principalmente, no abandono da escola pelos alunos ainda nas séries iniciais. Esses problemas são o resultado de questões estruturais que impedem a discussão da igualdade racial na escola e entre os sujeitos que a constituem, seja por meio da negação de que existem diferenças de desempenho entre alunos negros e brancos ou pela pouca importância a um tema que deveria ser diuturnamente abordado entre os seus pares e a comunidade escolar.
Gomes (2001) observa que o fenômeno mencionado anteriormente resulta da discriminação sutil que se manifesta na escola de várias formas. No entanto, sua expressão mais clara ocorre pela disseminação da falsa ideia de que a escola moderna conseguiu atingir a igualdade e o respeito pelas diversidades, apresentando uma perspectiva em que todos são igualmente valorizados e não há distinção no tratamento entre estudantes brancos e negros. Esses argumentos, de acordo com o autor, acabam se revelando frágeis, já que no dia a dia as instituições de ensino frequentemente são cenários de discriminação e preconceito racial. Além disso, os dados de pesquisas em nível nacional mostram que o rendimento escolar de alunos negros ainda é desigual em comparação aos de outros grupos populacionais.
No que tange ao racismo nas instituições de ensino, Catarino (2010) aponta que as principais repercussões desse fenômeno contraditório se manifestam por intermédio do desempenho insatisfatório dos estudantes, do aumento na frequência de aulas de reforço, das altas taxas de repetência e, especialmente, do abandono escolar nos primeiros anos. Tais dificuldades são consequência de fatores estruturais que dificultam o debate sobre a igualdade racial no ambiente escolar e entre os indivíduos que o formam, seja pela negação das disparidades de desempenho entre alunos de diferentes etnias ou pela falta de atenção a um assunto que deveria ser constantemente discutido entre os colegas e a comunidade educativa.
Assim, as questões relacionadas à discriminação e ao preconceito racial no ambiente escolar decorrem, em grande parte, da negação das desigualdades no tratamento entre alunos brancos e negros. Ao investigar os discursos que legitimam a segregação racial, percebe-se uma função dupla: primeiramente, eles tentam estabelecer um discurso frágil que apresenta a escola como um espaço de diversidade e nega a presença do racismo socioinstitucional; em segundo lugar, buscam responsabilizar as famílias dos alunos pelo baixo rendimento escolar e pelos altos índices de repetência e abandono. Essas ações dificultam ainda mais a busca por soluções eficazes para as questões raciais nas instituições de educação básica do país.
A superação da discriminação racial nas instituições de ensino requer a implementação de diversas abordagens e práticas educativas que devem ser interligadas entre a escola, as autoridades públicas e a comunidade em geral, representada pela comunidade escolar. Esse processo começa com a conscientização de que o ambiente educacional, assim como outras instituições sociais, também reproduz o racismo de várias maneiras. Esse entendimento é fundamental para estabelecer estratégias de combate ao problema, visando abordar suas causas fundamentais, que têm gerado exclusão e prejudicado o desempenho escolar de muitos estudantes em nosso país.
Além de reconhecer a presença do racismo e seu impacto no dia a dia de muitas instituições educacionais, é fundamental adotar outras ações que promovam um debate amplo sobre o tema, visando à transformação da mentalidade dos indivíduos envolvidos. Essa transformação mental é essencial antes da elaboração de programas escolares que, por sua vez, devem implementar iniciativas concretas para eliminar o preconceito e a discriminação racial nas escolas. Os projetos que abordam a diversidade cultural e racial precisam enfatizar a participação da comunidade, das famílias e dos estudantes, uma vez que o racismo não se limita a esses ambientes e sua resolução não se restringe a debates isolados.
A opção política para a superação da discriminação nas escolas deve focar na busca por estabelecer uma ação revestida de conteúdo significativo que implique no aprendizado para além dos mediadores institucionais locais, ou seja, que tenha como foco não apenas na “comunidade escolar” em todos os níveis, mas a extrapole. Assim, para que a estratégia de promoção da igualdade racial não seja abortada, impõe-se partir do conhecimento acumulado, do pensado e do vivido por educadores e pela sociedade, que não são imunes ao racismo. Deve-se fazer uma escolha que também exija a intervenção sobre as concepções de senso comum da comunidade local onde se pretenda atuar, definindo medidas para a sua formação e procurando conhecer experiências de mobilização comunitárias já em andamento, para potencializá-las (Valente, 2005, p. 74).
Diante disso, é possível conceber que a superação da discriminação racial, do bullying e do preconceito não irá ocorrer caso a escola ou a comunidade trate as referidas problemáticas como algo específico de seus intramuros. Assim como outras questões sociais, estas também se estabelecem em variados níveis e escalas, sendo a escola mais um espaço institucional em que se pode perceber a sua constituição. Toda e qualquer proposta de solução presume a articulação participativa entre diferentes atores, seja por meio do desenvolvimento de políticas, programas e ações que ocasionem uma mudança de perspectiva na forma de as pessoas entenderem o racismo e seus impactos nas condições de emancipação social do sujeito negro.
De acordo com Amorim (2019) o racismo, a discriminação e o bullying fazem parte do cotidiano da maioria significativa das instituições de ensino do país, se apresentando muitas das vezes de forma velada, em atitudes cotidianas que evidenciam esse traço negativo presente no cotidiano de professores e alunos. E mesmo com a instituição de diversas políticas públicas em âmbito estatal para combater essas condutas segregadoras, ainda assim, todas elas continuam a se fazer presente sob variadas formas e feições no ambiente de ensino e na sociedade como um todo, mas sem perder a sua essência: excluir, negar ou segregar indivíduos ou grupos pelo simples fato de pertencerem a determinada categoria.
Portanto, enfrentar a problemática do preconceito e discriminação nos espaços de ensino demanda um comprometimento abrangente por parte de todos os atores que fazem a educação. Nesse percurso, dificuldades deverão ser encontradas considerando que a discussão racial possui um conteúdo histórico e social que promoveu inúmeras contradições. Contudo, mesmo com eventuais dificuldades, não se pode perder o objetivo principal das mudanças gestadas nas instituições de ensino: transformar esses espaços em um lócus sinônimo de igualdade e inclusão não apenas racial, mas do conjunto da diversidade que se constitui nos educandos que fazem parte da escola.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao final da pesquisa foi possível constatar que o preconceito e a discriminação continuam a marcar cotidianamente as relações sociais estabelecidas no espaço escolar. As análises corroboraram para demonstrar que a discriminação, o bullying e o preconceito racial não são fenômenos isolados, mas uma realidade compartilhada por parte significativa das escolas. As situações desse tipo se reproduzem cotidianamente, em variados níveis, escalas e formas de materialização. Ainda assim, muitas vezes tais problemas passam despercebidos, mas impactam na reprodução desigualdade e inferioridade entre alunos negros/pardos e brancos, expondo a escola a situações que desvalorizam as condições de identidade do aluno negro e, por fim, reproduzem um sistema de desigualdade em um espaço que deveria ser verdadeiramente inclusivo.
A pesquisa também demonstrou que, apesar das inúmeras práticas normativas para atender o enfrentamento à desigualdade racial, os diversos problemas sociais e institucionais contribuem para que este fenômeno continue a se reproduzir. A violência racial é o resultado de uma contracultura manifestada pelo preconceito, bullying e discriminação, que levam a perda da identidade do sujeito e sua consequente inferiorização no ambiente escolar, uma vez que ele passa a perceber que a sua cultura é hierarquizada quando comparada as demais, isto é, menos valorizada socialmente.
Para concluir, ressalta-se que a pesquisa trouxe algumas considerações importantes sobre o tema, mas de nenhuma forma objetivou-se encerrar a discussão sobre a temática. Na verdade, essa discussão foi apenas o início de muitas outras que deverão vir futuramente. Para o momento, espera-se que as análises feitas possam auxiliar em outros estudos por parte de acadêmicos que se interessem pelas questões da igualdade racial. As contribuições dadas poderão servir de base para ampliar entendimentos sociais acerca da maneira como o fenômeno tem impactado as escolas nos dias hodiernos.
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