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Resumo
INTRODUÇÃO
A Educação Física escolar tem passado por um processo de ressignificação, buscando romper com práticas tecnicistas e assumindo um papel formativo crítico e emancipador, estando alinhada à Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 2017) e aos pensamentos de Freire (1996) e Morin (2011), a disciplina amplia sua contribuição para a formação integral dos sujeitos ao valorizar a cultura corporal, a autonomia e os saberes dos estudantes. Nesse sentido, as práticas pedagógicas como o planejamento participativo (Venâncio, 2017), a pesquisa como princípio educativo (Maldonado et al., 2020) e a valorização da experiência e da corporeidade (Charlot, 2000 A; Larrosa, 2022) reafirmam o papel do professor como mediador do conhecimento. A Educação Física se insere, assim, em um movimento de resistência à lógica neoliberal, propondo uma leitura crítica da realidade.
Entretanto, ainda se enfrentam desafios quanto à sua legitimação no currículo e ao reconhecimento de sua intencionalidade pedagógica, a busca por sentidos e significados no processo educativo é uma questão antropológica (Charlot, 2013), que envolve tanto quem aprende quanto quem ensina.
Em relação a isso, ferramentas como metáfora, metonímia e fractais (Thomas; Beauchamp, 2011) podem contribuir para a formação da identidade docente e para o fortalecimento da relação com o saber. Neste trabalho, buscamos refletir sobre essas conexões e apresentar caminhos para uma Educação Física que estimule a formação (auto) critica dos sujeitos e amplie o sentido da aprendizagem escolar.
METODOLOGIA
O presente artigo científico é uma pesquisa de base metodológica qualitativa apresentando um caráter exploratório, ao buscar aproximações iniciais com campos conceituais e fenômenos complexos, proporcionando uma compreensão ampliada e não linear dos objetos investigados (Denzin; Lincoln, 2018). A fundamentação teórico-metodológica se baseia numa perspectiva interdisciplinar, articulando elementos das ciências humanas, como as noções de metáfora e metonímia e das ciências naturais, como o conceito de fractal, compreendido aqui como representação da complexidade e da multiplicidade nos processos educativos (Capra; Luisi, 2016).
No tratamento da complexidade, é adotado o referencial de Morin (2023), que defende a necessidade de diálogos transversais entre os saberes como forma de compreender os desafios contemporâneos da educação. No campo da Educação Física, é se aproximado das reflexões de Kirk (2020) e Larrosa (2022), que problematizam os sentidos atribuídos às práticas corporais na escola e propõem olhares sensíveis e críticos diante dos modos de ensinar e aprender.
A análise dos conceitos, bem como suas possíveis transgressões (Pellegrini; Soares, 2021), buscaram revelar as fissuras dos processos de significação, por meio das múltiplas linguagens mobilizadas pelos sujeitos nas práticas escolares. O ponto de partida da investigação foi uma revisão sistemática da literatura, e a abordagem exploratória adotada é aberta, flexível e não estruturada, conforme sugerem Flick (2018) e Yin (2023) para estudos qualitativos voltados à compreensão profunda de contextos e significados.
Tendo como inspiração a pedagogia do diálogo de Freire (2021), é possível valorizar os saberes construídos a partir da vivência e da leitura crítica do mundo, reconhecendo a identidade de cada sujeito em sua relação com o conhecimento. O procedimento metodológico adotado foi a análise comparativa de três categorias centrais: a metáfora, a metonímia e fractais, em diálogo com a Educação Física escolar e os fundamentos da teoria da relação com o saber (Charlot, 2022).
Essa abordagem permitiu a produção de inferências interpretativas, relevantes tanto para a comparação de atributos qualitativos quanto para a compreensão das razões que motivam as problematizações da pesquisa (Triviños, 2022). As reflexões desenvolvidas são organizadas em torno de três eixos norteadores: (a) a centralidade da problematização; (b) os recursos simbólicos para a leitura crítica do mundo; e (c) o reconhecimento e a transgressão de saberes institucionalizados.
EDUCAÇÃO FÍSICA E A RECONFIGURAÇÃO DO SABER ESCOLAR: CORPO, LINGUAGEM E CRÍTICA PEDAGÓGICA
A problematização central na Educação Física escolar deve ultrapassar os limites de seu enquadramento como uma disciplina meramente equivalente às demais áreas do currículo tradicional. Conforme destaca Charlot (2009), observa-se uma inquietação legítima quanto à valorização docente, sobretudo no reconhecimento do professor de Educação Física como um educador crítico e reflexivo no processo formativo dos estudantes. Tal reconhecimento transita por diferentes dimensões, como a fundamentação teórico-metodológica, a seleção e organização dos conteúdos, os currículos escolares e o planejamento pedagógico, evidenciando o discurso reiterado da intencionalidade educativa da área.
Ainda assim, a especificidade da Educação Física demanda abordagens mais complexas, segundo Venâncio (2019), os corpos dos estudantes manifestam-se como agentes ativos em um espaço-tempo particular nas aulas, inscrevendo experiências por meio de gestos, movimentos e expressões singulares, que podem ser interpretadas como formas de linguagem corporal. Esses corpos registram narrativas próprias e se ressignificam em suas vivências a partir de interações simbólicas, muitas vezes à margem das linguagens hegemônicas da leitura, da escrita e do cálculo, predominantes em modelos educacionais tradicionais.
Nessa perspectiva, se reconhece que os estudantes aprendem por múltiplos meios, se apropriando de saberes que extrapolam os limites físicos da sala de aula, pois cada sujeito estabelece relações distintas com os conhecimentos, aprendendo através de conteúdos mediados por diferentes materiais didáticos, tecnologias e práticas culturais. Assim, múltiplas linguagens convergem para compor um texto educativo singular, fundamentado nas motivações, nos modos e nas razões de aprender de cada indivíduo (Charlot, 2022).
Surge então a necessidade de se questionar: qual deve ser o foco da Educação Física escolar se ela não se enquadra integralmente nas exigências de um sistema educacional centrado em competências ligadas à leitura, à escrita e ao raciocínio lógico-matemático? A resposta a tal questionamento não reside em igualar a Educação Física às demais disciplinas escolares, mas em reconhecer sua potência educativa autônoma. Ao romper com a lógica instrucional da chamada “educação bancária” (Freire, 2021), a área pode assumir a formação integral dos estudantes como seu verdadeiro propósito, promovendo não apenas a apropriação dos conteúdos, mas também o desenvolvimento da consciência crítica frente às realidades sociais, políticas e culturais do ambiente escolar e comunitário.
Assim sendo, o cerne da discussão deve ser deslocado para uma abordagem que reconheça os estudantes como sujeitos de saberes e de direitos, promovendo práticas pedagógicas que favoreçam a escuta, a autonomia e a participação ativa na construção do conhecimento e nesse sentido, à docência compartilhada ou dodiscência, conforme propõe Freire (2021), se torna fundamental para que a Educação Física contribua efetivamente para a emancipação dos próprios alunos.
CRIANDO SENTIDOS NA EDUCAÇÃO FÍSICA: COMO METÁFORAS, METONÍMIAS E FRACTAIS AJUDAM NA APRENDIZAGEM
Na área da educação, Gauthier (2004) entendeu que criar metáforas vivas pode romper com os padrões fixos da linguagem e da realidade, revelando a criatividade da linguagem e possibilitando novos significados e formas de ver o mundo. O autor Paiva (2010), também amplia essa ideia ao apresentar definições que vão desde o uso comum da língua portuguesa até reflexões filosóficas, como as feitas por Aristóteles.
Essa figura de linguagem consiste em usar o nome de uma coisa no lugar da outra e segundo Paiva (2010), para Aristóteles, não havia diferença clara entre metáfora e metonímia. A metáfora seria a troca do nome de algo para outro, criando comparações e analogias, e já a metonímia destaca aspectos mais específicos do que se quer dizer, esses aspectos são compreendidos a partir de referências culturais que influenciam o modo como pensamos e agimos.
Dessa forma, é possível compreender que para entender os fenômenos complexos da vida humana, é necessário valorizar formas não lineares de interpretação. Nas leituras iniciais feitas para escrita do presente trabalho, foram encontrados muitos conceitos sobre metáfora e metonímia, mas foi percebido a necessidade de construir um conceito mais prático, pensando no contexto das escolas, assim, foi feita uma interpretação baseada na leitura positiva e negativa proposta por Charlot (2000).
Inicialmente, é possível compreender que metáforas e metonímias são recursos que os professores e os alunos podem usar na escola para criar novos significados e formas de entender os temas e conteúdos trabalhados em sala de aula. Através dessa análise, foi percebido dois caminhos possíveis, no primeiro, esses recursos reforçam a presença da Educação Física na área de Linguagens e Códigos (Nobre et al., 2019), e no segundo, eles abrem espaço para diferentes formas de construir saberes por meio da Educação Física escolar, respeitando o tempo de cada pessoa e suas interações com os outros (Venâncio, 2019).
Na leitura positiva, é possível entender que as metáforas e metonímias são ferramentas importantes para reconstruir saberes, pois ajudam a conectar o que os alunos já sabem com o conteúdo novo e assim, o aprendizado pode ser mais significativo, pois cada aluno se envolve de forma viva e corporal com o conhecimento. Se torna importante diferenciar o que é complicado do que é complexo, algo complicado é difícil por falta de entendimento entre suas partes; já o complexo envolve partes que se relacionam entre si (Ovens; Hopper; Butler, 2013). A complexidade das vivências dos alunos nos permite criar experiências de ensino mais ricas e ligadas à cultura, como brincadeiras, danças, esportes, jogos e outros, considerando também os diferentes aspectos do mundo atual (Santos; Silva, 2019; Sanches Neto et al., 2013).
Por outro lado, a leitura negativa mostra que, se mal utilizadas, metáforas e metonímias podem manter uma visão conservadora do ensino e isso acontece quando os professores não valorizam os significados que os alunos atribuem aos conteúdos, limitando as possibilidades de aprendizado. Mesmo assim, os alunos podem usar esses recursos para dar novos sentidos ao que aprendem, mesmo que isso não seja reconhecido nas avaliações, sendo por exemplo, possível ver essa criatividade quando os estudantes criam significados diferentes, códigos próprios e símbolos durante suas trajetórias de aprendizagem, isso mostra que os sentidos estão presentes nas práticas de linguagem, não nas notas das provas.
A Educação Física, como área da linguagem (Brasil, 2000; BNCC, 2017), também faz parte desse processo de produção de sentidos, quando valorizamos o sentido do “Se-Movimentar”, que representa a forma como cada aluno vivencia o movimento de forma subjetiva, isso possibilita uma aproximação de uma ideia de linguagem entendida como a capacidade de produzir conhecimento por meio de signos, sejam eles sons, imagens, gestos, toques, entre outros (Gomes-Da-Silva; Sant’agostino; Betti, 2005).
O autor Charlot (2000, p. 130) afirma que há muitas formas de linguagem no ambiente escolar e que é necessário reconhecê-la, e essas formas de linguagem se relacionam com o saber, com o mundo, com o outro e com o próprio sujeito. Não são apenas consequências das diferenças sociais, mas também oportunidades para os alunos se apropriarem de novos conhecimentos e expandirem sua liberdade, se a escola se limitar à expressão e comunicação mais comuns, pode até valorizar essas práticas, mas corre o risco de deixar de fora os alunos de classes populares das outras formas de linguagem que permitem uma compreensão mais profunda da vida e do mundo.
Para reconhecer essas diversas formas de linguagem, os fractais podem ser usados como fragmentos, como por exemplo, trechos de vídeos, áudios, fotos, sons, filmes, podcasts, videoclipes etc., que geram sentidos próprios para cada aluno. Esses fragmentos, quando se conectam com outros, criam novos sentidos coletivos nas experiências de aprendizagem, os fractais se ligam diretamente às metáforas e metonímias, pois revelam as relações entre diferentes elementos que convivem dentro de um mesmo processo (Mandelbrot, 1982).
Ainda sobre isso, Venâncio (2019) chama de mo(vi)mentos essas situações na Educação Física escolar em que ocorrem essas interações, são processos que se modificam com o tempo, mas que mantêm uma estrutura essencial. Assim como os fractais, as situações de ensino e aprendizagem podem mudar, mas continuam com suas características básicas, essas situações são parecidas entre si, mas nunca iguais, e apresentam uma complexidade infinita (Baptista, 1998).
Essa perspectiva ajuda a perceber como a diversidade de propostas na Educação Física podem acabar se unindo, desde que os fenômenos trabalhados em aula sejam contextualizados, mesmo que envolvam o corpo, o movimento, o ambiente ou a cultura (Sanches Neto et al., 2013). Sanches Neto (2003) defende que podemos entender os contextos das aulas como fractais, pois eles revelam repetições com variações e uma complexidade que nunca se encerra e esses fragmentos podem ser criados pelos alunos por meio de seus corpos em movimento (Venâncio, 2019).
Cada mo(vi)mento traz um novo sentido, aplicando isso na prática por exemplo, um aluno pode gravar um vídeo fazendo um saque no voleibol, mostrando seu corpo em ação e pode também mostrar outras pessoas jogando em contextos como uma quadra ou praia. A ideia central não é apenas o movimento, mas o significado que esse movimento tem para o aluno enquanto aprende, isso mostra que o aprendizado não está só na ação física, mas na relação entre essa ação e o saber envolvido, cada aluno acaba interpretando de forma diferente, dependendo de sua vivência e envolvimento.
Isso é o que Venâncio (2019) chama de tempo pedagógico necessário para aprender de verdade: o tempo que cada um precisa para viver e refletir sobre sua experiência. O mesmo autor ainda propõe que as “figuras do aprender”, conceito de Charlot (2000 a), sejam vistas como fractais que representam as experiências vividas nas aulas de Educação Física dentro e fora da sala, essas figuras mostram como os alunos se mobilizam para aprender a partir das suas vivências, reflexões e argumentos, mas esse caminho só é possível se houver diálogo verdadeiro entre professores e alunos, reconhecendo todos como sujeitos importantes nesse processo.
RECONHECER E SUPERAR UMA EDUCAÇÃO BANCÁRIA
É possível identificar sinais de uma educação bancária por meio da forma como se estabelece a relação entre docentes e estudantes, quando essa relação se baseia em uma troca respeitosa de saberes, ancorada na democracia, no diálogo, na liberdade e na consciência crítica, há uma tentativa de romper com a lógica da educação tradicional criticada por Freire (1996). No entanto, os valores reforçados pela sociedade capitalista e globalizados apontam para uma concepção de “boa educação”, como questionado por Charlot (2005), que privilegia o desempenho individual, a competitividade e a adaptação ao mercado, afastando-se de uma formação crítica e cidadã e essa tal concepção tende a silenciar o questionamento, afastar os sujeitos da problematização das desigualdades e desconsiderar a função social da escola.
A educação bancária, como descrita por Freire (1996), se evidencia quando o processo de ensino é limitado à memorização de conteúdos descontextualizados, por exemplo é comum observar ao nosso redor, estudantes que sabem identificar organelas celulares ou nomes de revoluções históricas, mas que não conseguem estabelecer vínculos entre esses conhecimentos e suas realidades. Esse modelo pedagógico reduz o aprendizado a provas padronizadas, ignora os diferentes modos de expressão dos estudantes e desconsidera o contexto social no qual estão inseridos.
Para transformar essa realidade, é essencial reconhecer as contradições do sistema educacional, quando os estudantes identificam que seus desejos não são contemplados na escola, começa o processo de resistência e atribuição de novos sentidos aos conteúdos. Charlot (2000a) afirma que o desejo é o motor da relação com o saber, porém, as condições desiguais de acesso à educação, como revelam os dados de participação no ENEM, reforçam desigualdades e violam o direito à educação de qualidade, previsto pela Constituição Federal e pelas diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
Estudos de Freire (1996), alertam para a influência da lógica neoliberal na educação, que tende a naturalizar a exclusão, a pobreza e a marginalização, essa ideologia sustenta uma educação que não liberta, mas reforça a ordem social vigente, na qual o lucro é mais valorizado que a vida. Charlot (2020) também acrescenta que essa lógica aprofunda a invisibilidade de sujeitos historicamente oprimidos, como se observa nas periferias, onde a ausência do Estado é sentida cotidianamente.
Nesse contexto, o trabalho docente deve se opor à lógica bancária, recusando a visão de professor como um mero transmissor de conteúdos e ao contrário, o educador precisa assumir uma postura crítica, engajada e ética, criando oportunidades para que os estudantes se tornem sujeitos ativos na construção do conhecimento (Freire, 1996). Os autores Maldonado et al. (2020), sugerem que o professor também se reconheça como pesquisador, avaliando criticamente sua prática e construindo conhecimento a partir dela. Essa postura colabora para a aproximação entre a universidade e a escola, fortalecendo a valorização dos saberes produzidos na base da sala de aula. As aulas de Educação Física, por exemplo, não precisam se restringir a esportes competitivos, podendo incluir danças, lutas e jogos que valorizem a diversidade cultural, como sugere Maldonado et al. (2019, 2020).
A avaliação da aprendizagem pode ser ampliada com a utilização de estratégias como a auto avaliação, relatórios, pesquisas, criações artísticas e outras formas de expressão, essa diversidade respeita os múltiplos modos de aprender e rompe com a avaliação tradicional baseada apenas em provas. Metáforas, metonímias e fractais, sendo entendidos como expressões simbólicas e movimentos do corpo, podem ser recursos pedagógicos para dar visibilidade às experiências e saberes dos alunos.
Outra possibilidade de transgressão está no planejamento participativo, ao incluir os estudantes na definição dos conteúdos e estratégias de ensino, se rompe com a hierarquia autoritária e se constroi uma educação mais democrática, conforme afirmam Venâncio (2017) e Flor et al. (2020), essa prática reconhece a pluralidade de saberes e valoriza as experiências de cada sujeito, promovendo pertencimento e inclusão.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É possível considerar que as metáforas, as metonímias e os fractais podem contribuir significativamente para o ensino da Educação Física escolar, sobretudo no que diz respeito aos processos identitários e às múltiplas relações com os saberes. Esses conceitos permitem a atribuição de diferentes sentidos à aprendizagem, dialogando com a complexidade dos conhecimentos envolvidos nessa área, como aponta Charlot (2000 a). Além disso, essas ferramentas simbólicas podem ser incorporadas no processo avaliativo construído coletivamente entre os professores e os estudantes, favorecendo reflexões críticas sobre a prática pedagógica, os significados atribuídos às aulas e os saberes produzidos em ritmos singulares pelos alunos.
Em concordância com tais possibilidades, se é defendido que um sistema de ensino que ignora a diversidade de desejos, vivências e contextos dos estudantes não pode ser legitimado. O conceito da “educação bancária”, criticada por Freire (1996), deve ser cotidianamente superada e para que isso se torne possível, é fundamental que as práticas docentes promovam justiça curricular, reconhecendo e valorizando grupos historicamente excluídos. Isso requer autocrítica por parte dos próprios docentes, questionamento dos documentos normativos e criação de situações pedagógicas que favoreçam a produção e ressignificação dos saberes pelos próprios estudantes, utilizando recursos como metáforas, metonímias e fractais como elementos que mobilizam o pensamento e a aprendizagem.
Dessa forma, torna-se urgente uma perspectiva educacional que incentiva o diálogo como ferramenta de transformação, o processo educativo precisa reconhecer cada estudante como sujeito ativo de saberes, com histórias, experiências e argumentos que devem ser escutados e valorizados, quando os alunos têm a oportunidade de mobilizar seus próprios recursos para interpretar e significar o mundo, novas possibilidades de aprendizagem emergem.
As aproximações conceituais aqui apresentadas nos permitem compreender as metáforas, metonímias e fractais dentro das figuras do aprender, conforme proposto por Charlot (2000 a). Tais movimentos favorecem a valorização do diálogo como princípio pedagógico, no entanto, o diálogo não pode ser apenas retórico: ele exige interação verdadeira, abertura para o encontro e disposição para aprender com o outro, o caminhar juntos, nesse sentido, é uma forma de abrir espaço para novas compreensões sobre o ser humano. E ensinar Educação Física, nesse contexto, é também um ato de situar-se no mundo por meio da corporeidade e do encontro com os estudantes, em um constante mo(vi)mento de construção coletiva.
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