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Resumo
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como tema: “A criança com cegueira congênita e a inclusão na Educação Infantil”, pois discutir questões sobre a Educação Especial e Inclusiva no atual cenário brasileiro é uma tarefa complexa, mas necessária, porque é o paradigma educacional vigente e é primordial que conheçamos o “universo” particular que faz parte da vida desses alunos, ou seja, para entender suas necessidades, precisamos de envolvimento, comprometimento, conhecimento e acima de tudo um “olhar” diferenciado para a realidade do outro, pois transmitir conhecimento na homogeneidade é muito mais simples que construir conhecimento na diversidade, a empatia precisa fazer parte deste cenário.
Este assunto é relevante e se justifica, porque a entrada de uma criança com deficiência visual congênita na Educação Infantil é um assunto que preocupa a comunidade escolar, pois as pessoas ainda não sabem muito bem como estimular, ensinar, enfim se relacionar com essa criança que não enxerga desde o nascimento e necessitará de adequações e especificidades em diversos níveis no ambiente escolar.
É inadmissível aceitar uma criança em sala de aula regular e não trabalhar com ela de acordo com suas reais necessidades é ser tão excludente quanto não aceitá-la, mas as leis “obrigam”, leis estas que são de vanguarda por sinal, pois nosso país acompanha outros países em relação a esse assunto, porém ainda há na realidade brasileira uma dissonância considerável entre a teoria e a prática, entre o que acontece realmente e o que a lei prevê, pois o sistema educacional necessita de um arcabouço de ações necessárias a serem colocadas em prática cotidianamente para efetivar a inclusão.
Diante do exposto a pergunta seria: qual o papel da comunidade (entende-se por esse termo todos que atuam na escola – gestores, professores, auxiliares e pais) escolar frente ao recebimento de uma criança com deficiência visual congênita na Educação Infantil?
O principal objetivo deste trabalho é aprofundar conhecimentos específicos na área, uma vez que a criança com deficiência visual congênita precisa construir conceitos, necessita do outro para brincar, ampliar sua leitura de mundo e potencializar seu desenvolvimento global.
E mais especificamente, conhecer sobre a criança com deficiência visual, seu desenvolvimento, comportamento e aquisição de conhecimento, abordar sobre a acolhida por parte do ambiente escolar a família, o aluno com deficiência visual congênita no contexto da Educação Infantil e explanar sobre a postura do professor em relação especialmente ao fazer pedagógico desse aluno. O foco principal é socializá-lo, preocupar-se com sua integridade física, favorecer sua autonomia e independência, respeitar seus limites, valorizar suas aquisições, brincar e funcionalizar suas aprendizagens tendo como resultado a inclusão dessa criança de forma efetiva.
A metodologia da pesquisa é bibliográfica tendo como embasamento obras de conceituados autores da atualidade envolvidos com o tema em questão como Bruno (1997) em Deficiência Visual – Reflexão sobre a Prática Pedagógica – onde a autora com sua vasta experiência na área revela a importância da teoria atrelada à prática, no uso de técnicas e recursos específicos empregados em ambiente escolar para que se haja uma melhor compreensão da realidade do aluno com deficiência visual congênita. Rodrigues (2007), na coletânea de autores Psicomotricidade educação especial e inclusão social no capítulo sobre Psicomotricidade e Deficiência Visual: Estimulação Precoce, onde a autora aborda sobre como ocorre a interação da criança com deficiência visual congênita com o mundo ao seu redor, a importância da intervenção/estimulação precoce, do brincar e compreender como acontecem os aspectos da psicomotricidade na ausência da visão e na obra Laramara (1997)– Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual, no Manual para creches – A interação da criança deficiente visual, onde explana sobre a realidade da criança nesse contexto, a acolhida à criança e sua família e manejos importantes que favorecem a inclusão desse aluno.
No desenvolvimento deste trabalho será explanado sobre a inclusão da criança com deficiência visual congênita na Educação Infantil, no segundo capítulo sobre o desenvolvimento da criança na Educação Infantil e no terceiro sobre o papel do professor nesse processo tendo como foco a inclusão dessa criança, finalizando com as considerações finais sobre a importância de fundamentação teórica aliada à prática para que a escola realmente contribua com a inclusão da criança com cegueira congênita em ambiente escolar desde a Educação Infantil.
DEFICIÊNCIA VISUAL CONGÊNITA
A Educação Inclusiva significa assegurar a todos os estudantes, sem exceção, a igualdade de oportunidades educativas, concomitantemente com outros apoios complementares e tem por objetivo principal que essas pessoas exerçam sua cidadania plena, a qual todos dentro da sociedade têm direito.
Este trabalho especificamente refere-se à deficiência visual no caso da cegueira congênita, e o aprendizado de conceitos por essa criança a partir da Educação Infantil, tratando-se de deficiência congênita entende-se por:
Cegueira congênita ou precoce, quando o lactente apresenta cegueira no momento do nascimento ou em um período imediato, como seria o caso da retinopatia do prematuro, que ocorre quando crianças prematuras são tratadas com altas concentrações de oxigênio, durante os primeiros dias de vida. (Freitas D. R., 2000, p.05)
A deficiência visual total ou cegueira consiste na ausência total de visão até a perda da projeção de luz. A deficiência visual parcial, também referida como visão subnormal ou residual, atualmente designada baixa visão, consiste em perda severa da visão que não pode ser corrigida clínica ou cirurgicamente nem mesmo com adoção de lentes convencionais. (Bruno, 2007, p. 64)
No caso da deficiência visual total (cegueira) também se considera congênita quando a perda é por volta dos 2 anos de idade, por ser um período muito importante para o desenvolvimento da criança.
A falta da visão desde o nascimento pode acarretar sérios atrasos ou comprometimentos (principalmente se essa criança não for devidamente estimulada desde cedo) aos aspectos de desenvolvimento cognitivo, afetivo, social e psicomotor.
A ausência da visão, não pode ser considerada simplesmente como a perda e um sentido isolado. Ela é muito mais do que isso: é a perda do sentido que integra todos os outros na aquisição de conhecimento. (M.R. Campelo Rodrigues, 2007, p. 65)
Segundo Campelo (2007) estudos que afirmam que cerca de 80% do canal de aprendizagem da criança é visual, ou seja, a imitação não ocorrerá na cegueira congênita, muito provavelmente somente a estimulação familiar também não será suficiente para suprir as reais necessidades dessa criança em seu desenvolvimento, por esse motivo a estimulação precoce é muito importante nesses casos com profissionais especializados.
A preferência pelo sentido visual é uma indicação do desenvolvimento humano onde ao contrário dos outros animais, a função visual rapidamente interfere nas relações com o mundo exterior com ponto de partida de todas as atividades e experiências. (Fonseca, 2007, p.64)
CONCEITOS RELEVANTES PARA O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA COM DEFICIÊNCIA VISUAL CONGÊNITA
É importante ressaltar que há conceitos relevantes a serem considerados no trabalho de desenvolvimento de uma criança com cegueira congênita, como por exemplo, a formação do esquema corporal, imagem corporal, uso dos sentidos remanescentes, organização espaço e tempo, desenvolvimento da percepção tátil com significados, sem esquecermos de que se trata de uma criança com cegueira congênita, portanto ela nunca enxergou e não possui memória visual. É nesse sentido que vivências significativas e contextualizadas, de acordo com sua faixa etária e seu momento de aprendizagem ajudarão a construir conceitos fundamentais para a vida dessa criança. Por esse motivo o conhecimento, entendimento e compreensão da leitura de mundo desse indivíduo sem a visão (que é primordial nos primeiros anos de vida) é de suma importância para o professor da Educação Infantil que ao trabalhar nesse contexto esteja ciente desses aspectos, mas jamais se esqueça de que é uma criança e como tal, deve ter a oportunidade de vivenciar momentos preciosos e prazerosos buscando desenvolver-se.
Na escola ensinamos e aprendemos pelo canal visual, então o que fazer ao receber uma criança que não possui este canal como todas as outras? Não há receitas prontas, mas há caminhos e alternativas, assim como todas as crianças diferem entre si, o mesmo ocorre com as crianças com deficiência visual. O que é agradável para um pode não ser para o outro, é necessário respeitar a individualidade, pois cada ser é único, e acima de tudo saber o que está sendo feito, porque está sendo feito, para que está sendo feito, adequar as atividades, verbalizar as informações concomitantemente com as ações, conscientizar a comunidade escolar que receberá esta criança, ajustando os conteúdos, espaço físico, atitudes, de que alguma forma que possam atender as expectativas de aprendizagem de uma maneira significativa pois, de que adianta ouvir muitas informações que não tem significado, é primordial vivenciar as experiências intensamente.
Na Educação Infantil o “brincar” é importantíssimo para o desenvolvimento da criança, o que não difere com a criança com cegueira congênita e o brinquedo pode partir do seu próprio corpo, percebendo que ele é diferente do mundo que o cerca tendo prazer em descobrir suas possibilidades e mais tarde, descobrir os outros e os objetos.
Para a criança cega, o brincar é uma atividade vital, que previne e evita o auto confinamento. A criança cega precisa descobrir o prazer do movimento de descobrir como movimentar-se no espaço de diferentes formas. Quando aprende a usar o corpo e se sente segura do seu uso, torna-se autoconfiante, independente e mais feliz. (Rodrigues, 2007, p. 77)
A criança cega aprenderá a imitar e a brincar se encontrar pessoas disponíveis para interagir, com movimentos coativos, para que compreenda tátil-cinestesicamente a ação pelo contato físico. (Bruno, 1993, p. 77)
É fundamental que a criança cega tenha o próprio corpo como referência e, a partir deste passe gradativamente a conhecer o mundo. As pessoas do ambiente escolar que irão recebê-la precisam ter noção das reais necessidades dessa criança, para que possam funcionalizar e potencializar suas aprendizagens futuras visando seu desenvolvimento global.
ESTRATÉGIAS PARA A INCLUSÃO DA CRIANÇA COM DEFICIÊNCIA VISUAL CONGÊNITA
O papel do professor da Educação Infantil é muito importante no processo de mediação da aprendizagem da criança, a escola é um “mundo” com muitas novidades e o tempo e ritmo da criança com cegueira congênita pode apresentar-se diferente dos demais, assim como o número de repetições nos processos até mesmo em atividades simples, pois ela não enxerga, portanto precisa experienciar a rotina.
O ambiente organizado auxilia na diminuição da ansiedade da criança, pois esperar passar o tempo sem imagens pode tornar-se angustiante, assim como um ambiente muito desorganizado – mobiliário que muda a cada dia de aula, por exemplo –, um ambiente com muito barulho, pois não podemos nos esquecer de que o canal de absorção de informações dessa criança é o auditivo e o excesso de sons pode deixá-la agitada, desconcentrada, desinteressada entre outros comportamentos, ou seja, o meio pode influenciar suas atitudes, dificultando sua prontidão para aprendizagem, como reter a atenção, concentrar-se na exploração de objetos, realizar atividades e até mesmo apresentar maneirismos (movimentos repetitivos, pois esta criança não sabe que as outras crianças não ficam realizando esses movimentos, tais movimentos não são atitudes socialmente aceitas e que podem até serem confundidas pelas pessoas que as cercam com outras patologias como o transtorno do espectro autista).
O trabalho com foco no concreto e contextualizado é de vital importância para o desenvolvimento da criança na Educação Infantil e o mesmo ocorre com a criança com deficiência visual, no caso a cegueira congênita, com as devidas adaptações das quais serão referidas nos próximos capítulos.
O Programa Pedagógico da etapa pré-escolar pode ser desenvolvido em pequenos grupos também em Sala de Recursos, Atendimento Educacional Especializado ou apoio de alguma instituição especializada e é ideal que o aluno frequente uma classe de pré-escola próxima a sua comunidade, contando com a orientação do professor especializado como integrador (adaptações curriculares específicas entre outras importantes funções), concomitante com o professor da sala de aula regular, que precisam trabalhar em parceria.
Quando esse programa tem como visão o desenvolvimento global da criança, haverá priorização no processo de aquisição de conceitos, dos esquemas sensórios motores perceptivos possibilitando várias experiências com significados, também deverá ser priorizado o desenvolvimento da linguagem sempre contextualizando suas vivências, valorizando o brinquedo a recreação e o lazer.
Diante de um quadro tão específico é fundamental que o professor que receber uma criança cega congênita em sua sala de aula tenha respaldo da gestão escolar, pois essa criança não é somente da professora e sim da escola, que haja uma conscientização da realidade do que é não enxergar e que principalmente exista um trabalho concomitante com um profissional especializado para auxiliar nas adaptações, metodologias, estratégias, apresentação de conteúdo, necessidades específicas, atividades de vida diária, orientação e mobilidade tão importantes nessa fase e que será base em sua vida ultrapassando o âmbito escolar.
OS DESAFIOS NO ESPAÇO ESCOLAR AO TRABALHAR COM A CRIANÇA COM DEFICIÊNCIA VISUAL CONGÊNITA
Quando as pessoas trabalham em um ambiente escolar e se deparam com um aluno com deficiência visual surgem muitos questionamentos e sentimentos em relação à condição dessa criança, diante disso é comum que se preocupem em como tratá-la, como incluí-la nas brincadeiras e como propiciar autonomia nas atividades de vida diária e atividades de sala. Outro ponto é a reação dos demais alunos da sala e por parte dos adultos especificamente, sobre como ela aprenderá.
A criança com deficiência visual, sem outros comprometimentos mais graves (que é o foco deste trabalho) pode e consegue conviver com as outras crianças e aprender, mesmo que por um caminho diferenciado, a segurança do professor é fundamental, pois ela necessitará de apoio para relacionar-se com as pessoas e o ambiente.
A educadora que está com essa criança precisa compreender “como” ela vê caso tenha um resíduo visual, pois muitas vezes esse resíduo é muito pequeno e criança deve fazer uso do mesmo para que auxilie futuramente em sua orientação e mobilidade o que acarretará em uma melhor independência e autonomia no ambiente escolar e fora deste.
Em alguns casos a família pode vir a se sentir insegura e até mesmo inferiorizada por conta de ter um filho que difere das demais crianças, é frequente e natural que as famílias enfrentem uma espécie de luto por esperar uma criança diferente da qual chegou ao seu seio familiar, quando essa criança ainda é um bebê mesmo as famílias procurando ajuda enfrentam esse tipo de situação emocional, por isso “esperam” também ser rejeitadas em alguns ambientes, é imprescindível que seja bem recebida e aceita, assim sentirá encorajada a falar das especificidades desse novo aluno que são de vital importância para os profissionais que trabalharão com essa criança.
CONDUTAS FACILITADORAS NO PROCESSO DE INCLUSÃO DA CRIANÇA COM DEFICIÊNCIA VISUAL CONGÊNITA
Para a criança com deficiência visual congênita, o início é essencial, pois nestes casos terão que ser construídos conhecimentos e não transmitidos, porque a imitação visual não é um caminho possível para a aprendizagem.
Todo o ambiente deverá ser apresentado gradativamente, afinal, tudo é muito estranho e novo, o ambiente, as vozes das pessoas, outros sons peculiares do meio, os cheiros, a rotina, enfim informações advindas desse novo ambiente (escolar).
Deve-se considerar o contato primeiramente com uma só pessoa, para que se estabeleça um vínculo, o tom de voz, a calma da educadora, a presença da mãe (temporariamente) até que se crie esse vínculo, todos esses fatores auxiliarão para que a criança sinta-se menos ansiosa frente à nova situação.
Algumas sugestões são indicadas para esses casos como: apresentar-se e conversar com a criança, ajudá-la a conhecer a sala para familiarize-se com os objetos e o local, apresentá-la aos novos amiguinhos, deixá-la participar normalmente da rotina de sua turma, quando é estabelecida uma rotina diária como, por exemplo, com música de chegada e saída nomeando cada um dos amigos torna-se mais fácil para ela memorizar seus nomes.
Não esquecer-se de que se a criança tem um resíduo visual não desconsiderá-lo por menor que seja, muitas vezes no futuro essa criança usará o braile, mas sua mobilidade é favorecida por esse resíduo.
O fato de estar no mesmo espaço físico, participar do lanche e de algum momento de atividade não garante que somente essas ações sejam consideradas que essa criança está inserida no ambiente da escola, para isso é preciso que a criança faça parte do grupo, participando da rotina da classe, das brincadeiras, das atividades, que seja mais um amiguinho da classe, mesmo necessitando de ajuda de funcionários, ajuda esta que será para facilitar e mediar o processo de desenvolvimento e não superproteger a criança, gerando até mesmo dificuldades em sua inclusão.
Nesse sentido é importante que a direção ou coordenação oriente toda a equipe da escola. Não basta somente a professora saber das necessidades dessa criança, pois outras pessoas conviverão com ela e todos devem ter uma mesma abordagem quanto às ajudas necessárias. Por esse motivo é fundamental que entendamos bem como a criança deficiente visual conhece e sente o mundo necessitando fazer uso de seus sentidos remanescentes como o tato, olfato, paladar, audição, cinestesia (percepção dos movimentos do corpo), podemos facilitar a iniciativa e a aquisição da autonomia necessária para essa fase de sua vida dentro desse contexto.
A inclusão tanto esperada no ambiente escolar deve ser aos poucos, por causa de suas necessidades específicas e cabe ao educador facilitar ao máximo esse processo com o grupo, a escola como um todo deve acolhê-la.
CONTEXTUALIZANDO ORIENTAÇÕES AOS PROFESSORES
A criança com deficiência visual congênita geralmente necessita que as ações, local onde se encontram as pessoas, os sons do ambiente sejam antecipados para ela, pois esse procedimento diminui sua ansiedade e auxilia para que se organize de forma mais natural.
É fundamental recebê-la sempre que possível da mesma forma, apresentando-se e conversando com ela para que se acostume e reconheça as informações do meio fazendo com que se sinta mais segura e tranquila. Também é importante explicar para a criança sobre as mudanças de ambientes, como por exemplo, quando sair da classe para o parque.
Ao apresentar os cômodos da creche/escola sempre descrever os sons emitidos no local. É imprescindível que a criança deficiente visual explore cada cômodo de seu ambiente escolar tatilmente (dentro das possibilidades), permitindo que percorra a sala tocando as paredes, móveis entre outros objetos, assim passará com o tempo a formar um mapa mental de onde se localizam os objetos. Não se deve ficar trocando os móveis de lugar constantemente em uma sala que tem uma criança com deficiência visual para que não se desorganize e se o fizer deverá mostrar a ela até que aprenda a nova disposição do local, outro aspecto importante é não deixar as portas das salas entreabertas, estas deverão permanecer fechadas ou abertas, pois caso contrário, oferecerão risco à criança com deficiência visual, podendo bater com a cabeça, rosto ou testa na aresta da porta e vir a se machucar.
Procure deixar a criança com deficiência visual próxima a você (educador) durante a realização das atividades, isso permitirá que ela se sinta mais segura. Ao contar uma história a criança com deficiência visual necessitará que concretize as ações da mesma, ou seja, terá que tocar em objetos concretos que se referem a história, a professora pode usar diferentes entonações de voz para os personagens, é aconselhável explicar para os demais coleguinhas o motivo dessa atitude, para que os outros possam entender sua condição aos poucos, pois todos são crianças e uma criança pequena vidente não concebe o que é “não enxergar” o mundo ao seu redor, tal procedimento tem o objetivo de evitar que os demais alunos sintam-se enciumados em relação às atitudes da professora para com esse aluno.
Quando houver a necessidade de se colocarem em fila é interessante trocá-lo de lugar na mesma (colocá-lo no meio ou final da fila para estimular sua organização especial), sempre segurando no ombro do coleguinha da frente, ao oferecer-lhe algo deve tocar-lhe levemente o dorso de sua mão com o objeto que está sendo oferecido, possibilitando assim que aceite ou recuse a oferta, pode também avisá-la verbalmente nesse momento.
O educador deve deixar a criança deficiente visual participar das atividades da classe, apesar das diferenças e adaptações quando necessárias.
É importante que essa criança aprenda explorar os brinquedos experimentando suas possibilidades, apertando-os, amassando-os, rosqueando-os tentando abrir, fechar, tirar, por, entre outros movimentos. Após a exploração pode ser explicado a ela sobre a função do mesmo, para que serve, onde é usado, onde é guardado, características como peso, se é quente, gelado, grande ou pequeno, etc., esses conceitos serão realizados na prática.
O fornecimento de pistas sonoras à criança com deficiência visual a encorajou a buscar o brinquedo que saiu de seu alcance, pois elas tendem desistir e abandonar o mesmo. Ao início ou término das brincadeiras deve-se levar a criança para saber onde os brinquedos estavam guardados e onde serão devolvidos, no momento da arrumação desse material após as brincadeiras deve-se ensiná-lo a participar da arrumação da sala, dos brinquedos e de seus pertences, a organização do ambiente é importante para pessoa que não enxerga se situar no espaço em que está inserida.
A questão do limite também deve ser trabalhada com a criança com deficiência visual como com qualquer outra criança, não se deve fazer tudo o que quer, e sim explicar o que pode ou não fazer, como se faz com as demais crianças.
Eventualmente se a criança se machucar, o educador a princípio deve evitar que isso ocorra, mas se houver situações dentro desse contexto, deverá agir com carinho, não ficar muito alarmada o que poderá assustá-la ainda mais, é importante ressaltar que ao cair, a criança sentirá a sensação do tombo e a dor a seguir, essas sensações podem ser muito desagradáveis e se ocorrerem com muita frequência pode associar-se ao medo de experimentar novos movimentos, buscas e explorações, eventualmente recusando-se em experimentar novas experiências.
Deixe-a tocar texturas diferentes, isso é importante para o seu aprendizado, pode ser que apresente alguma reação como medo ou repulsa tátil e por isso é preciso tentar mais vezes, naturalmente, incentivando-a a conhecer a areia, farinha, grãos, bichos de pelúcia, jogos de encaixe, bolas, brinquedos do parque (sempre com a supervisão próxima de um adulto) para que construa mentalmente (aos poucos) sensações em relação aos objetos e ambientes apresentados, incorporando-as em seu repertório de aprendizagem, processos que a criança vidente faria lembrando-se da imagem a criança cega fará lembrando-se das sensações, usando seus sentidos remanescentes.
Observe seu desenvolvimento e apresente “novidades” como apresentaria à criança que enxerga. Nas atividades de vida diária, que consistem em atividades cotidianas, é fundamental incentivá-la para que desenvolva sua independência e autonomia desde cedo, as situações em que esse estímulo pode ocorrer encontramos: uso da caneca, colher, vestir-se, lavar as mãos, escovar os dentes, ir ao banheiro, suas conquistas devem ser comemoradas para que internalize de que está conseguindo fazer “as coisas”, praticamente sozinha.
É comum a criança começar fazer movimentos diferentes, repetitivos ou estimular excessivamente algum apêndice do corpo sem causa aparente, principalmente quando está só, movimentos como balançar o corpo, apertar os olhos, rodopiar entre outros, é aconselhável convidá-la para brincar, substituindo essa “autoestimulação” por outra atividade prazerosa e com função, não podemos nos esquecer de que se essa criança é cega desde seu nascimento, nunca enxergou e não tem consciência que esses movimentos não são realizados pelas outras crianças, é uma forma de diminuir sua ansiedade, mas muitas vezes não é vista de uma forma positiva socialmente, chegando até a serem rotuladas por isso, portanto devemos “trocar” o mais naturalmente possível por brincadeiras ou outros movimentos que diminuiriam sua ansiedade, mas que tenham uma função. O ideal é não focarmos no sintoma (maneirismo) e sim na causa, ou seja, provavelmente essa criança necessita gastar energia e por isso movimenta-se dessa forma, por isso concentrar a atenção em outra situação que seja prazerosa pode diminuir esses movimentos.
A IMPORTÂNCIA DA ESTIMULAÇÃO
Uma dúvida constante por parte de educadores é a seguinte: como a criança cega brinca? Segundo Bruno esse ato é possível somente se:
A criança cega aprenderá a imitar e a brincar se encontrar pessoas disponíveis para interagir, com movimentos coativos, para que compreenda tátil cinestesicamente a ação pelo contato físico. (Bruno, 1993, p. 77).
Os movimentos coativos mencionados na citação acima podem ser descritos nas seguintes situações, colocando sua mão sobre o dorso da mão da criança, realizando concomitantemente os movimentos, mostrando como se faz, como se brinca, tirando brinquedos de caixas, abrindo tampas de potes e rosqueando-as, abrindo torneiras, lavando as mãos, ensinando o carrinho deslizar, a boneca a ninar, que a bola é para jogar, ou seja, descobrindo uma função para os brinquedos e não somente batê-los ou chacoalhá-los.
Atividades com movimentos corporais são bem-vindas, por isso o parque geralmente é muito apreciado e deve ser incentivado, os estímulos que esse espaço propicia contribuem para melhorar o equilíbrio e aumentar a atenção e concentração nas brincadeiras que exigem esses pré-requisitos, dessa forma estimula grandes grupos musculares, propicia sensações diferenciadas, trabalha a orientação pelo som para que perceba de onde vem sua localização.
Tanto a alimentação como a higiene são atividades de vida diária de suma importância para o desenvolvimento da criança e requerem treino, ela precisa ser incentivada e aprender o local dos objetos e como usá-lo até que tenha condições de realizar sozinha. A participação da família nessas atividades é crucial, pois de nada adianta fazer um treinamento no ambiente escolar e atendimento específico em terapias e não continuar com os procedimentos em casa, onde passa a maior parte do tempo.
O sucesso da integração, adaptação e consequentemente inclusão da criança com deficiência visual na escola depende também da participação efetiva dos pais. Todos esses aspectos devem ser inseridos naturalmente no cotidiano das crianças, onde o ponto principal é que a criança com deficiência visual seja na escola ou fora dela amada, valorizada e respeitada acima de tudo.
Em relação às atividades especificamente pedagógicas como a aprendizagem das letras, dos números, das quantidades, dos sons, o primeiro contato com a escrita e o desenho requerem um trabalho em parceria com a professora de AEE (Atendimento Educacional Especializado) especialmente, pois esta é uma professora especialista e auxiliará a professora de sala na introdução desses conceitos de forma natural, fazendo uso de material concreto, trabalhando a oralidade, registrando com fotos a parte prática das atividades, trabalhando as letras do nome, a contagem, iniciando o alfabeto em braile com o conceito de cela e as letras propriamente dita aos poucos, contextualizando com palavrinhas para estimular a consciência fonológica da criança, trabalhar com histórias e relacionar as palavras, usar a prancha de desenho para estimular a criança a desenhar e o que produziu ficar em alto-relevo para ela mesma poder compreender sua produção, usar sempre um modelo para que ela explore e depois desenhe, enfim as atividades devem ser contextualizadas, adaptadas e flexibilizadas, dessa forma possibilita-se que a criança com deficiência visual congênita tenha acesso a pré-requisitos escolares primordiais para seu desenvolvimento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quando a criança com deficiência visual congênita não é estimulada adequadamente, primeiramente pela família e profissionais especializados em estimulação precoce e posteriormente na escola desde a Educação Infantil, consequentemente poderá acarretar em lacunas consideráveis em relação a diversos aspectos, como a mobilidade, o domínio das atividades de vida diária, a comunicação, a noção do ambiente ao seu redor e também em relação aos conteúdos escolares. Diante dessa situação é possível encontrarmos crianças que ao estarem no ensino fundamental não estão “prontas” para receber o mesmo nível de informações escolares que os demais alunos em sala, muitas vezes esse fato não está relacionado com a questão da deficiência ou o aspecto cognitivo da criança e sim pela falta de um trabalho desde a Educação Infantil direcionado para o desenvolvimento global de uma criança com deficiência visual congênita tendo como consequência uma leitura de mundo empobrecida.
Para que essa criança acompanhe a sala de aula regular desde a Educação Infantil é primordial que a equipe multidisciplinar, família e escola que trabalha e convive com ela se comunique e tenham por objetivo “falar” a mesma linguagem onde o foco é desenvolver essa criança de forma natural e tranquila no contexto da deficiência visual. Diante do exposto, é preciso observá-la, entendê-la, estimulá-la, respeitá-la, aceitar sua condição e focar nas possibilidades, o que é muito importante para sua formação como ser humano.
O professor que trabalhar com essa criança necessita de fundamentação teórica e especialmente transposição prática diante dessa realidade, mas não deve estar sozinho, esse aluno é da escola como os demais alunos, portanto a gestão e a comunidade escolar como um todo precisam participar desse movimento de acolhimento e inclusão.
A Educação Inclusiva é uma prática inovadora que enfatiza a qualidade de ensino para todos os alunos, exigindo que o ambiente e até mesmo o sistema escolar seja revisto, adequando-se e modernizando-se para que os profissionais envolvidos no processo aperfeiçoem suas práticas pedagógicas e se desprendam de ideias limitadoras, focando-se em possibilidades reais de desenvolvimento dessa criança.
Na atualidade ainda é um paradigma que logicamente desafia o cotidiano escolar e há um percurso que estamos atravessando com evoluções significativas, mas também com barreiras a serem superadas por todos (sociedade, profissionais da educação, comunidade, pais e alunos) por ser um processo que envolve várias nuances é fundamental que todos aprendam mais profundamente sobre a diversidade humana, para que possamos compreender a maneira diferente de cada ser humano ser, agir, pensar, aprender, enfim se relacionar e consequentemente fazer parte da sociedade.
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