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Resumo
INTRODUÇÃO
Os resultados das avaliações padronizadas realizadas com os estudantes, que analisam as habilidades de ler e escrever, mostram que o crescente número de alunos que finalizam os estudos no ensino fundamental, não asseguram que nossas escolas brasileiras formam leitores competentes. Experiências observadas no ambiente escolar indicam que as abordagens utilizadas para atender o grande número de alunos nas escolas públicas, nem sempre favorecem a evolução das capacidades de ler e compreender o universo dos diversos tipos de textos, que são necessários para o desenvolvimento da aprendizagem dos mesmos, que em outras palavras, são essenciais para que ocorra efetivamente o letramento. O fraco desempenho dos estudantes no ensino fundamental, em instituições tanto públicas quanto no ensino particular, com relação a ler e compreender o mundo dos textos, sinaliza a urgência que os estabelecimentos de ensino devem reavaliar a maneira como tem conduzido suas metodologias no âmbito de apoderamento da leitura. Isso significa procurar fundamentos teórico-metodológicos que permeiam entender como ocorre esse procedimento, onde requer necessariamente a percepção da conexão entre alfabetizar e letrar. De que forma os especialistas da área definem esses procedimentos? Interpretar a escrita assegura compreender o conteúdo? De que forma podemos facilitar a inclusão do estudante no universo da escrita, assegurando que ele consiga ler e entender textos em diferentes contextos, não importa qual seja seu grau escolar ou status social, será que ele irá se relacionar com uma comunidade que valoriza a leitura? De que maneira podemos estruturar situações educativas que favoreçam o aprimoramento das competências de leitura e compreensão em estudantes que mesmo já dominando o código escrito, ainda carecem de fluência na leitura e têm dificuldade em interpretar o conteúdo dos textos que são comuns na sociedade? Esse desafio nos incentiva a pesquisar obras de autores que abordam a alfabetização e o letramento, sendo eles: Soares (2006), Kato (2005) e Kleiman (2004), com o intuito de compreender melhor as especificidades desses procedimentos e assim fundamentar a criação de atividades, de ler e interpretar, direcionada aos estudantes. Além disso, buscamos na teoria histórico-cultural, especialmente nas obras de Vygotsky, apoio para entender os métodos de aprendizado e crescimento, e suas repercussões na prática pedagógica. Nesse artigo, compreenderemos um projeto realizado para os alunos de uma sala de recursos, em especial na relação entre à leitura e a compreensão de diversos textos, que representa a conclusão das atividades de um Programa de Desenvolvimento Educacional.
Trata-se de um curso de aperfeiçoamento permanente voltado para os profissionais da educação da rede pública. O intuito é fornecer recursos teóricos e metodológicos que possibilitem a execução de atividades de ensino estruturadas, visando abordar as questões enfrentada no ensino fundamental, reconhecendo os educadores como criadores de novas abordagens para o procedimento de ensino-aprendizagem.
No âmbito deste programa, os educadores do ensino fundamental se afastam completamente do dia a dia em sala com os alunos por um ano, durante o qual passam por programas de cursos oferecidos por estabelecimentos de ensino, ou seja, escolas ou universidades. São organizados grupos de estudos, para discutir seus tópicos de investigações, elaboram um plano de ação educativa e produzem recursos didáticos que serão aplicados no ano subsequente ao do programa, quando voltam para as salas de aulas em suas escolas.
Após entender o percurso realizado para a elaboração deste texto, discutiremos os conceitos que sustentaram a criação de atividades educativas para os alunos da educação básica. Essas circunstâncias dizem respeito à leitura e à análise de materiais que são compartilhados na sociedade. Mas porque focar em ler, escrever e interpretar? No decorrer do tempo, a humanidade desenvolveu diversas maneiras para se expressar, começando por gestos e desenhos até o modo como escrevemos atualmente, a qual serve como um meio de transmitir os conhecimentos culturais acumulados através do tempo, organizados em signos como receitas, escritos, desenhos e gráficos. Conforme Leontiev (1978), ao interiorizar as experiências históricas, cada indivíduo individualmente adquiri habilidades e traços humanos, enquanto se expande a oportunidade de desenvolver funções cognitivas complexas, como atenção voluntária, percepção, memória, raciocínio e sentimentos.
Vygotsky (1999) argumenta que a evolução das atividades cognitivas não ocorre de forma natural nem é um pré-requisito para o aprendizado. Na verdade, é o aprendizado que promove esse crescimento. Para as pessoas conseguir assimilar conhecimentos e as respectivas maneiras de refletir e comportar-se, a intervenção de outra pessoa é fundamental. Isso significa que as funções cognitivas avançadas se manifestam por meio da socialização e através da utilização de signos. É fundamental destacar que não é toda forma de ensino que contribui para o avanço intelectual dos estudantes, e sim a que prepara e guia esse processo. Nesse contexto, a atuação do professor torna-se fundamental para iniciar procedimentos que irão influenciar o crescimento intelectual dos indivíduos, por meio da aquisição de conhecimentos acadêmicos e conceitos organizados. Logo, é possível concluir que a aquisição de conhecimento não se restringe apenas às interações do indivíduo com o meio, mas ocorre, de forma relevante, através das relações sociais, uma vez que, se existe alguém para aprender, há também alguém para ensinar, e a escola é o espaço socialmente estruturado para a efetivação desses momentos. No que diz respeito ao aprendizado de ler, escrever e interpretar, é fundamental enfatizar que como outros conteúdos organizados, não é viável que uma pessoa adquira a habilidade de leitura e interpretação sem um ensino que seja com intenção e sistemático.
Ao ingressar na escola, o aluno possui um saber espontâneo, adquirido nas experiências vividas em diferentes situações e espaços sociais. A escola trabalha com o conhecimento científico e, ao transmitir determinado conteúdo, transmite, também, formas de pensar, analisar, reelaborar e agir. É importante ressaltar, ainda, que para se posicionar conscientemente, diante de qualquer fato, fenômeno ou conceito, é imprescindível o saber sistematizado. É difícil, por que não dizer impossível, o aluno emitir opiniões que ultrapassem o conhecimento empírico, imediato, se os conceitos espontâneos, que ele adquiriu em situações da sua vida cotidiana, forem tomados como pontos de partida e de chegada (Galuch e Sforni, 2006, p.6).
Os conteúdos são transmitidos em contextos estruturados, seguindo normas de escolha e arranjo. O educador não tem a autoridade final, nesse procedimento, mas é quem deve estruturar o aprendizado, ajudando o aluno a compreender o código linguístico e o que ele significa. De acordo com as propostas apresentadas por teóricos dessa abordagem, o aprimoramento dessas habilidades intelectuais ocorre através do aprendizado, por assimilação do conhecimento incorporado nos temas escolares.
O homem não nasce dotado das aquisições históricas da humanidade. Resultando estas do desenvolvimento das gerações humanas, não são incorporadas nem nele, nem nas suas disposições naturais, mas no mundo que o rodeia, nas grandes obras da cultura humana. Só apropriando-se delas no decurso da sua vida ele adquire propriedades e faculdades humanas (Leontiev, 2004, p. 310).
Ao considerarmos que a instituição de ensino é um local onde se trabalha com a cultura já organizada; que a apropriação de conteúdos favorece o crescimento dos indivíduos onde a habilidade de ler e interpretar é fundamental para adquirir saberes em diversas disciplinas, a ação pedagógica relacionada à leitura ultrapassa a mera decodificação dentro do contexto de alfabetizar.
VÁRIAS VISÕES NO SENTIDO DE ALFABETIZAR
Ocorreu um período em que a ideia predominante era que uma pessoa era considerada alfabetizada apenas por saber assinar um documento. O estar alfabetizado era entendido como uma capacidade básica de converter a oralidade em texto e o contrário, um processo automático de escrever e ler utilizando atividades como “Evas E Uvas”, (Soares, 2008, P.119), não se preocupando com o sentido e a interpretação das leituras. Com o tempo, as escolas brasileiras começaram a adotar novas abordagens para a alfabetização, refletindo transformações tanto na maneira como se apropriam da escrita quanto no conceito de alfabetização em si. Isso resultou em mudanças significativas na capacitação que se inicia e que prossegue continuamente na vida dos professores. A implementação de um sistema baseado em ciclos, que tem como objetivo estender o período destinado ao aprendizado de ler e escrever, juntamente com a nova introdução do ensino fundamental de nove anos, foi uma das inovações recentes. Essas mudanças ocorrem em um cenário onde, cada vez mais, a habilidade de ler e escrever o próprio nome ou elaborar uma nota simples não é suficiente para viver e se engajar no meio social.
Paralelamente a este procedimento, amplia-se a discussão sobre a importância do letramento. Mas em que consiste esse procedimento? Quando apareceu? É um procedimento que se assemelha à aprendizagem da leitura e escrita? Dessa forma, quem possui alfabetização também está, por conseguinte, letrado?
Conforme o pensamento de Soares (2006), a identificação de novos fatos ou o aparecimento de idéias inéditas sobre certos fenômenos, solicita a criação de inovações para abordar esses assuntos. Um exemplo disso é a alfabetização: as constantes transformações sociais geraram a necessidade de uma nova abordagem em relação a ler e a escrever, culminando na criação do conceito de letramento, palavra esta que ainda não se encontra presente nos nossos dicionários, pois é uma expressão que surgiu há pouco tempo no idioma português. Nos dicionários mais ultrapassados, esse termo pode até ser encontrado, porém com um contexto diferente do que aplicamos no contexto educacional contemporâneo.
Letramento é, pois, o resultado da ação de ensinar ou de aprender a ler e escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter-se apropriado da escrita (Soares, 2006, p. 17-18).
Discutir o letramento implica reconsiderar as diversas facetas do procedimento de escrever, da leitura e interpretação de textos. Inclui dar um novo olhar a essa jornada, capacitando o indivíduo a realizar a leitura de forma crítica e independente em contextos sociais. Também é essencial examinar a condição presente dos alunos que praticam a leitura nas escolas, reconsiderando as técnicas de ensino e as estratégias utilizadas, especialmente em relação à leitura e aos recursos oferecidos aos educandos. A meta é que eles adquiram o hábito de ler regularmente, um ponto de vista defendido pela autora:
As pessoas se alfabetizam, aprendem a ler e a escrever, mas não necessariamente incorporam a prática da leitura e da escrita, não adquirem competência para usar a leitura e a escrita, para envolver-se com as práticas sociais de escrita: não leem livros, jornais, revistas, não sabem redigir um ofício, um requerimento, […] não conseguem encontrar informações numa conta de luz, numa bula de remédio (Soares, 2006, p. 46).
Perante essa situação, é fundamental que a instituição de ensino foque no letramento, que, conforme Soares (2006), pode ser compreendido como o estado que se estabelece como condição aquela pessoa que adquire habilidades de leitura e escrita. A interação entre leitura e escrita, apesar de serem práticas distintas, estão interligadas e complementam-se mutuamente. Um leitor proficientemente preparado tem grandes chances de se tornar um bom escritor, onde suas leituras serviram de base para sua produção textual. Portanto, a leitura deve estar em primeiro lugar em todas as suas atividades do currículo desde o início da formação do aluno. Segundo Kato (2005), Kleiman (1995) e Soares (2006, 2008), o letramento envolve o papel social da escrita, permitindo ao estudante organizar suas ideias, registrá-las de forma clara e, principalmente, se comunicar com fluidez. Soares rejeita completamente a noção de um letramento em seu grau zero, argumentando que existem níveis de competências, habilidades e saberes que devem ser considerados, dependendo do meio social no qual a pessoa se encontra. Então de que forma ocorre esse procedimento? E como seria a participação da instituição educacional?
Tendo uma comunidade centrada na escrita, igual a que temos, demanda que as pessoas não apenas tenham o domínio da leitura e escrita, mas também que consigam interpretar uma sequência de pensamentos, fazer comparações, reconhecer a linguagem figurativa, formular hipóteses sobre a interpretação do que se lê, a criação de significados ao combinar conhecimentos anteriores e informações textuais, pensar sobre o conteúdo lido, concluindo e emitindo julgamentos, além de distinguir entre linguagens formal e informal. Esta última é crucial para que consigam se comunicar de maneira clara e direta, facilitando dessa forma sua participação e inclusão nessa comunidade letrada. Diante de toda essa situação, a escola não pode se limitar à alfabetização; é imprescindível que ofereça oportunidades onde os educandos se tornem leitores proficientes. Para muitos, o ambiente educacional é um local atípico, onde se têm a oportunidade de interagir com o universo da leitura e poderem vivenciar suas práticas. Portanto, é essencial garantir que os indivíduos tenham contato com diversos tipos de gêneros textuais e proporcionar aos mesmos, variadas formas para alfabetizar e letrar.
TIPOS DE TEXTOS: A PERSPECTIVA DA LEITURA
Alfabetizar por meio do letramento implica oferecer ao educando a competência necessária para entender e interpretar um processo intrincado de significados através da escrita, permitindo que ele use da língua escrita em várias circunstâncias de sua vida. Dessa forma, ao acessar o saber organizado, o aluno adquire o desenvolvimento de suas habilidades cognitivas e compreende melhor os textos do seu dia a dia.
Bakhtin (2003, p.263) categoriza os tipos de textos em primeira e segunda categoria, sendo eles: os primários e os secundários. Os secundários aparecem em contextos comunicativos mais elaborados, como em papéis jurídicos, acadêmicos e artísticos. Por outro lado, os gêneros primários ocorrem no cotidiano e apresentam características específicas que se trata neste trabalho. Para Bakhtin (2003), os enunciados relativamente estáveis, conhecidos como gêneros discursivos, refletem a mobilidade, dinâmica, fluidez e imprecisão da linguagem. Para falar de um estudo sobre gêneros, é crucial considerar:
A riqueza e a diversidade dos gêneros do discurso são infinitas porque são inesgotáveis as possibilidades da multiforme atividade humana e porque em cada campo dessa atividade é integral o repertório de gêneros de discurso. […] Cabe salientar em especial a extrema heterogeneidade dos gêneros do discurso (orais e escritos), nos quais devemos incluir as breves réplicas do diálogo do cotidiano (saliente-se que a diversidade das modalidades de diálogo do cotidiano […] o relato do dia a dia, a carta (em todas as suas diversas formas) […] documentos oficiais, manifestações publicísticas, as variadas formas de manifestações científicas e todos os gêneros literários (Bakthin, 2003, p. 262).
Com interação entre as pessoas e a rapidez com que as informações se espalham levaram à criação, adaptação e renovação de diversos gêneros textuais, todos voltados para a comunicação. Além disso, atualmente a internet disponibiliza uma enorme quantidade de escritos fazendo parte do cotidiano da maioria dos indivíduos, provocando transformações na forma como lemos, o que está sendo incorporado à nossa metodologia de ensino.
ASPECTOS DA LEITURA NO ENSINO
Aspectos da leitura incluem intenção, informação, coesão, coerência, clareza e intertextualidade-elementos fundamentais que os educandos devem entender desde o início do procedimento de ler e interpretar cada texto e é elaborado em um cenário específico e possui uma intenção clara. Isso remete ao propósito do escritor ao desenvolver um certo tipo de texto: seja para entreter, persuadir, ensinar, informar ou provocar reflexão.
A ligação e a lógica das ideias são muito importantes para entender o texto e sempre andam lado a lado. Coesão se refere ao texto não ser apenas um conjunto desconexo de ideias sem relação entre si, e sim, usar frases e períodos arrumados com a ajuda de palavras que conectam as ideias, isso significa unir ideias para criar uma unidade significativa; já a coerência acontece quando organizamos e sequenciamos as ideias, isso cria uma relação entre elas, para que então o texto fique bem organizado no gênero proposto, e assim não tenha contradições e ambiguidades entre eles, assegurando o significado do texto.
A APRENDIZAGEM NA SALA DE RECURSO
É comum pensar que os estudantes ao completar o ensino fundamental 2, já estão aptos a realizar leitura e compreender textos de maneira simples. No entanto, a realidade nas nossas escolas apresenta um cenário distinto. Muitos alunos conseguem decifrar as palavras, mas sem entender o que está lendo. Existem educandos que mesmo aprovados para o próximo ano, não dominaram o código escrito. Essa situação representa um obstáculo que precisamos enfrentar. Se um aluno ainda não consegue realizar leitura e escrita, em outras palavras, se o mesmo não converte letras, sons e palavras, ato fundamental que concretiza o entendimento, a escola deve revisitar os elementos para alfabetizar, que se encontram desconhecidos por ele.
Atualmente nas instituições de ensino brasileiras, é oferecido o Ensino Educacional Especializado (AEE), onde criou-se o programa “Sala de recursos (SRM)” para auxiliar os alunos do Ensino Fundamental que apresentam deficiência, transtorno globais do desenvolvimento, altas habilidades ou superdotação e também pode atender alunos com grandes dificuldades de aprendizagem. O serviço é oferecido aos alunos no período contrário de suas aulas regulares, sendo quatro aulas semanais, duas vezes por semana. Na disciplina de português é desenvolvido no aluno o ato da fala, ler e escrever de acordo com as possibilidades que ele apresenta.
REALIZANDO O ATO DE LER E ENTENDER EM SALA DE AULA
Como mencionado nos elementos iniciais deste trabalho, a capacidade de decifrar não é equivalente à habilidade de ler e escrever. Assim, o obstáculo que temos, não é o das escolas focadas no progresso dos educandos, ou seja, devemos ir além de simplesmente ensiná-los a ler, é fundamental que eles sejam capazes de atribuir significados a diversos tipos de gêneros textuais. Um aluno que ultrapassa a simples decodificação é aquele que consegue entender o tema abordado e o objetivo de diversos tipos de textos.
Realizar um trabalho focado para o ato de ler e interpretar, podemos sugerir aos educandos para realizar uma compilação de vários textos que compõem nosso cotidiano. Mas por que iniciarmos dessa maneira? Porque uma abordagem eficaz é lidar com textos que eles encontram no dia a dia, ou seja, que incluem escritos que eles já conhecem, como: folhetos, receitas, e-mails entre outros e também novos, apresentados pelo professor. Embora essa abordagem de ensino esteja focada no conhecimento, ela pode dificultar o entendimento do educando, pois muitas das vezes ele não se envolve ativamente com o material e acaba por não se tornar ciente do seu próprio entendimento.
Baseando-se nos princípios de Libânio, que afirma que o aprendizado é um procedimento dinâmico e então “[…] educar é intervir na capacidade de ser e agir das pessoas por meio de mediações culturais, ou seja, através de instrumentos simbólicos e materiais, em um contexto de relações comunicativas”. (Libâneo, s/d, p.02).
O ensino deve ser estruturado, de maneira que os educandos possam realmente aprender sobre diversos textos, sem restringir o seu conceito. Dessa forma, abordando diversos gêneros textuais, ressaltando suas particularidades, distinções, estruturas e principalmente o cenário onde são empregados, teremos um ensino que incentiva a reflexão, análise e síntese.
Acreditamos que “[…] o ensino e a aprendizagem são momentos fundamentais para o desenvolvimento das características psíquicas humanas nas crianças” (Palangana, Galuch e Sforni, 2002, p.119)
Nas aulas, trabalhar um texto específico, realizar leitura e identificar as principais ideias, relembrar informações, buscar entender o vocabulário no contexto e utilizar o dicionário sempre que necessário, proceder assim com a interpretação, enfatizando a temática do texto e as particularidades de cada tipo de texto, até alcançar a uma análise sobre o gênero textual, seu contexto e formas de apresentação, todo esse procedimento de ler deve sempre estar vinculado a situações que dêem ênfase a elementos de alfabetizar, considerando sempre que se referem a alunos que estão em processo de aprendizado e também que ainda não aderiram completamente ao sistema de escrita. Uma das tarefas que consiste em ler e interpretar, a ser desenvolvidas com alunos em sala de recurso, deve ser as atividades trazidas por eles através de seus familiares, ou seja, receitas, contas, bulas de remédios utilizadas em casa, papéis, textos informativos, entre outros. Essas atividades valorizam aquilo que os educandos, trazem do seu convívio social.
Ao trabalhar esse contexto juntamente com os estudantes, o exemplo das contas, bulas etc. É possível envolver a disciplina de matemática, trabalhando o medidor de litro como o metrô cúbico de água, a bula de remédio para a quantidade que deve ser tomada e dessa forma pode surgir a oportunidade de aprofundar os estudos sobre tal tema. Além de abordar o conceito em si, também pode ser trabalhado tópicos sobre cobranças nas contas, envolvendo questões de multiplicar, dividir, somar e subtrair. Analisando uma conta de água, pode ser trabalhado uma atividade de siglas que encontramos no dia a dia. A sigla pode gerar uma curiosidade nos alunos, como por exemplo a sigla “SABESP” (uma companhia de água) e assim levar os educandos a pesquisar diferentes siglas, envolvendo a matéria de português, iniciando assim uma atividade que pratica o ato de ler, levando os mesmos a procurarem variados tipos de siglas em textos novos.
O professor pode começar a trabalhar em suas aulas, a análise de um tipo textual “recados”, pedindo aos estudantes para compartilharem as maneiras pelas quais interagem por escrito com pessoas, sejam pessoas de suas famílias ou até mesmo em sala de aula com seus colegas. Ao realizar essa atividade em sala com os alunos, também pode-se discutir, como é feita a comunicação em dias atuais, sendo destacado que hoje em dia podemos nos comunicar, tanto de forma impressa como quanto virtual, já que muitas pessoas recorrem ao Msn, Orkut, E-Mail, Whatsapp, entre outros. Fazendo uma relação juntamente com os alunos, entre os dias atuais e com os tempos em que eram usados por seus pais e avós, os “recados” é uma forma de comunicação por escrito, que ainda permanece na vida cotidiana dos indivíduos em tempo contemporâneo.
Esta atividade, com o tema “recados”, faz com que os alunos relembrem as situações do seu meio social familiar, configura-se o que Vygotsky descreve como a expansão dos conceitos inatos a caminho dos científicos.
Diferentemente dos conceitos espontâneos, os científicos são desenvolvidos a partir de procedimentos analíticos e não pela experiência concreta imediata. Estes conceitos são adquiridos por meio do processo da instrução, requerendo atos de pensamento inteiramente diversos, associados ao livre intercâmbio no sistema de conceitos, à generalização de generalizações, enfim, a uma operação consciente e arbitrária com os conceitos espontâneos: ‘a questão está justamente aí, pois o desenvolvimento consiste nesta progressiva tomada de consciência dos conceitos e operações do próprio pensamento’ (Vygotsky, 2001, p. 279).
Neste trabalho com “recados”, os educandos estão se familiarizando com um tipo de recado individual, sendo um tipo de texto de comunicação, que está presente entre familiares e colegas. Embora possamos discutir sobre diversas formas de comunicação, os mesmos podem e devem ser apresentados aos alunos, como forma de desenvolver um trabalho em grupo na sala de aula.
Ao trabalhar essa atividade com recados, o professor pode sugerir para os estudantes que formem duplas na turma e escrevam um recado para seu colega de sala. Pensando nesse aprendizado prévio, ainda pode aparecer as seguintes questões: “De que forma se inicia um recado?” “Qual é o significado de um recado?” ” É necessário assinar?”
Nesse momento, com a intervenção do professor, as dúvidas devem ser resolvidas gradualmente.
Quando uma palavra nova é apreendida pela criança, o seu desenvolvimento mal começou: a palavra é primeiramente uma generalização do tipo mais primitivo; à medida que o intelecto da criança se desenvolve, é substituída por generalizações de um tipo cada vez mais elevado- processo este que acaba por levar à formação dos verdadeiros conceitos. O desenvolvimento dos conceitos, ou dos significados das palavras, pressupõe o desenvolvimento de muitas funções intelectuais: atenção deliberada, memória lógica, abstração, capacidade para comparar e diferenciar […] (Vygotsky,1991, p.71-2).
Ainda nas atividades com vários tipos de textos, o professor pode propor trabalhos com o manuseio de revistas e jornais, mas é necessário especificar claramente o que se deseja que os estudantes aprendam. Existe uma forte inclinação do estudante para se concentrar em coisas fúteis, especialmente em imagens. Esta questão pode ser melhor entendida através da seguinte citação:
O que deve desafiar e ocupar os professores não são as atividades nas quais os alunos desempenham sozinhos com declarada competência, pois essas pouco ou nada acrescentam ao desenvolvimento. Cabe a eles, isto sim, preocuparem-se e ocuparem-se com os conteúdos, as atividades, nos quais o desempenho do aluno depende de mediação, de ensino (Palangana, Galuch E Sforni, 2002, p. 119).
Lendo e analisando, o estudante pode identificar os sinais linguísticos, localizar informações, entender a classificação e reconhecer o papel social dessa maneira de comunicação, que envolve a adoção de uma postura crítica em relação a um acontecimento. Cada aluno deve ter a oportunidade do ato de ler e assimilar como se desenvolve o procedimento da elaboração de construção de um cenário, exemplo: “RECADO”. Assim diante das novas palavras encontradas nos contextos, podemos inferir outras interpretações e examinarmos novas informações com os educandos.
O acesso aos sistemas ortográficos e gramaticais permite à criança tomar conhecimento de sua própria atividade como usuária da língua e, assim, alcançar um nível superior no desenvolvimento da linguagem de modo geral. A apropriação desses sistemas, todavia, não é espontânea, ela exige a mediação intencionalmente organizada tal como podemos depreender das reflexões de Leontiev (1983), possibilitando o desenvolvimento de funções psíquicas superiores como a atenção arbitrária, a memória lógica e o pensamento abstrato. Nisso evidenciam-se as inter-relações apontadas por Vygotsky entre ensino, aprendizagem e desenvolvimento (Galuch E Sforni, 2009, p.11).
O progresso dessas tarefas, induz os educandos a fazerem novas deduções sobre a intenção do texto, a coesão e a coerência. Também é uma oportunidade para o estudante entender a função social da escrita, interpretando textos em contextos reais de uso, ou seja, em contextos de alfabetização.
Conversar sobre letramento implica reconsiderar o aprendizado de ler e escrever, atribuindo significados novos de ensino, a partir de leituras do dia a dia, ou seja, de sabedorias inatas.
Ao discutirmos sobre documentos pessoais e pagamentos de contas, podemos perceber que os estudantes se mostram mais interessados, justamente porque esses temas fazem parte de suas realidades diárias. Portanto, alfabetizar através do letramento significa facilitar a interpretação da leitura que, muitas vezes, podem parecer complicados, mas, com a prática adequada, tornam-se acessíveis. Segundo Kleiman (2000), uma iniciativa focada no letramento deve incluir uma série de tarefas que surjam de interesses reais dos educandos, onde a execução implica em ler, escrever e interpretar textos diversos. Reiterando a concepção de Oliveira (2005, p.27), a interação do ser humano com o ambiente a sua volta não é direita, mas sim intermediada. Os principais processos psicológicos possuem uma estrutura que envolve mediadores, instrumentos que auxiliam as atividades humanas entre o indivíduo e a realidade.
Ao examinar escritos, contas, recados e documentos pessoais, estamos disponibilizando ao aluno ferramentas que promovem o acesso ao saber e assim de forma gradual, conseguimos identificar o seu grau de intuição e entendimento. Ao expor suas ideias, oralmente ou escrevendo, o educando revela seu ato de entendimento, conduzindo-nos a possibilitar e realizar intervenções adequadas para ajudar a superar suas dificuldades. É importante lembrar que no ensino fundamental 1, os estudantes ainda são crianças e que estão em procedimento de adquirir e desenvolver inicialmente a linguagem escrita, da oralidade e da interpretação. Portanto, é fundamental oferecer leituras variadas, investigações e discussões que visem resolver as dificuldades de aprendizado dos estudantes. Dessa forma, devemos criar oportunidades educacionais que proporcionem aos mesmos enfrentar suas dificuldades, permitindo que eles transitem do saber inato para patamares mais elevados de separação, possibilitando o entendimento de informações acadêmicas.
Sabemos que a ajuda mútua, as discussões, a formulação de hipóteses e a interação em sala de aula são momentos de grande aprendizagem. E ao solicitar a ajuda do professor, o aluno utiliza recursos legítimos para promover seu desenvolvimento, bem como a ajuda de seus colegas do grupo. Os grupos de crianças são sempre heterogêneos […] e umas podem contribuir para o desenvolvimento das outras. (Oliveira, 2005, p. 64).
CONCLUSÃO
Ao longo da elaboração deste estudo, em conjunto com as propostas do aprimoramento no ambiente escolar, podemos afirmar que o ato de o estudante ser capaz de desvendar textos curtos, não implica que ele também tenha habilidade para interpretá-los. Para efetivamente cultivar a habilidade de ler e interpretar, é fundamental que estabeleçamos cenários de aprendizagem de forma sistemática, com metas claras e intenção explícita. Quando nos aventuramos no universo dos tipos de textos, reconhecemos suas características e funções e é imprescindível que tenhamos um bom domínio tanto do conteúdo específico, quanto dos aspectos que envolvem a conexão entre o procedimento de ensino, aprendizado e evolução.
No momento atual, há uma infinidade de debates sobre aprender ler e escrever, e a implementação dessas práticas é uma preocupação constante nas escolas. A expectativa é que as propostas apresentadas aqui, juntando-se a várias outras já presentes, especialmente às vivências dos educadores que estão em constante aprendizado, auxiliem na união entre conceito e execução de forma mais eficaz.
Um dos requisitos básicos para vivermos em sociedade é a capacidade de nos comunicarmos, ajudando nossos queridos educandos a aprimorar suas competências para o ato de ler e interpretar e assim incentivar o crescimento de um pensamento mais complexo. É essencial apoiar os estudantes que enfrentam dificuldades nessas áreas, permitindo que avancem na direção ao domínio dessa competência vital, para o seu envolvimento na cognição da escrita. Portanto, é necessário trabalhar essas habilidades de maneira sistemática, por meio de intervenções pedagógicas, fazendo com que todos os participantes envolvidos atuem com responsabilidade nesse procedimento, sejam eles diretos ou indiretos.
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