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Resumo
INTRODUÇÃO
Conforme o Censo de 2010 (IBGE, 2019), 23,9% da população brasileira apresenta algum tipo de deficiência, o que corresponde a cerca de 45,6 milhões de indivíduos.
O processo de inclusão escolar e o acesso de estudantes com deficiência na educação torna-se, cada vez mais, uma realidade concreta nas escolas brasileiras, inaugurando uma nova fase na política nacional de uma escola para todos.
O Ministério da Educação tem como meta a efetivação de uma escola inclusiva, visto que deseja uma sociedade que reconheça e valorize a diversidade. De um modo geral, o processo de inclusão busca expandir o acesso de todos os alunos à escola regular, ampliar a participação e assegurar a permanência dos mesmos, independente de suas particularidades.
Nesta direção, os benefícios que a inclusão traz não são sentidos somente pelas pessoas com algum tipo de deficiência, que até então foram excluídas do processo educativo, mas por toda a sociedade.
Há apenas poucas décadas se vê a preocupação de incluir, de se trabalhar para que as diferenças sejam vencidas e integradas ao seio social. Durante a evolução dos estudos sobre a Educação Especial, as posturas eram voltadas às pessoas e suas individualidades, que apenas atendiam a demanda do cotidiano, até ao ponto de não ser isto mais possível e ser necessária a criação de uma política de Educação Especial, com criação de leis e estratégias para um atendimento globalizado (Carneiro, 2008).
Nesse sentido, pretende-se aqui, analisar as oportunidades de inclusão dos educandos no ensino regular, isto é, dos que apresentam deficiências, em especial os que têm deficiência intelectual, conforme determina a legislação e indicar caminhos para melhorar a participação desses sujeitos no desenvolvimento de sua aprendizagem e sua consequente inserção na sociedade.
Diante disto, busca-se discutir neste estudo como vem ocorrendo o processo de inclusão de alunos com deficiência intelectual nos anos iniciais do Ensino Fundamental que, embora seja um tema muito discutido no meio acadêmico e em toda a sociedade, ainda requer maior compreensão e comprometimento.
Sabemos que para atender as especificidades dos alunos com deficiências a instituição escolar deve se adaptar a cada necessidade do aluno e não o contrário, quando o aluno se adapta à escola que, neste caso, trata-se de integração.
Como metodologia foi utilizada a Pesquisa Bibliográfica, baseando-se nos teóricos que discutem o tema, entre eles: Sassaki (1999; 2005), Mazzotta (2001), Raiça (2006), Gotti (2019), entre outros.
DESENVOLVIMENTO
CONHECENDO A DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
Segundo Gomes, Poulin e Figueiredo (2010), os alunos com deficiência são os que necessitam de metodologias de ensino específicas, com recursos e materiais adequados, em virtude do comprometimento visual, auditivo, físico, intelectual e múltiplo.
Os indivíduos com deficiência intelectual podem apresentar dificuldades de aprendizagem em relação aos demais alunos.
Embora muitos autores usam a nomenclatura deficiente mental, optamos neste estudo por usar o termo deficiência intelectual, por considerarmos ser este, de certo modo, menos marcado socialmente. Outras nomenclaturas, já utilizadas por médicos e psicólogos, circularam no meio escolar e social de maneira pejorativa.
Conceituar o que é um aluno com deficiência intelectual é complicado, pois o conceito de deficiência intelectual é amplo e bastante variado. Ocorrem, muitas vezes, equívocos em relação aos alunos com deficiência, pensando-se, serem eles todos iguais entre si e muito diferentes em relação aos demais alunos ditos “normais”.
Entendemos que deficiência é uma imperfeição do corpo, uma insuficiência de alguma parte do corpo.
Conforme Sprovieri e Assumpção Jr. (2005, p. 25), deficiência “diz respeito a uma anomalia de estrutura ou de aparência do corpo humano e do funcionamento de um órgão ou sistema, independente de sua causa, tratando-se, em princípio, de perturbação de tipo orgânico.” Deste modo, pode-se dizer que deficiência intelectual é uma “anomalia” (no sentido de ser um déficit) do sistema intelectual do aluno.
Em um passado recente, uma pessoa era considerada deficiente intelectual quando apresentava um comprometimento intelectual significativamente abaixo da média como: QI entre 75 e 70 ou menos. Segundo Raiça (2006), este diagnóstico de quociente intelectual (QI) ganhou destaque por Alfred Binet, em 1905. Seus estudos visavam classificar as crianças de acordo com o seu QI. Esta classificação repercutiu até a década de 1990, “controlando” o sistema educacional. “Ou seja, durante muitos anos, crianças com baixo índice de QI não tinham acesso à escolarização básica, pois se preconizava que seriam incapazes de aprender.” (p.22).
Podemos perceber as marcas que tal classificação deixou na educação, uma vez que corrobora com a marginalização de alunos, que por diferentes motivos, não conseguem atingir aos objetivos propostos pela escola. Estes testes identificavam o potencial acadêmico dos alunos, selecionando aqueles com potencial daqueles, cujo teste indicava com baixo potencial. Tal classificação acarretava a separação dos alunos por salas, ou seja, os “bons” alunos numa sala e os “menos bons” em outra. Os alunos “menos bons”, por serem rotulados, não recebiam incentivo e apoio dos professores. Prática esta que perdurou até o final do século XX, e ainda persiste nos dias de hoje (Evangelista, 2009).
O mecanismo do processo formal de educação realiza um modo de promover uma parte dos alunos, enquanto outra é definitivamente excluída. Isso porque a escola é, por natureza, uma instituição discriminatória e elitizada, que tem dificuldades para aceitar, receber e trabalhar com a diversidade, embora utilize um discurso contrário. “Qualquer criança que se afaste levemente da média – tanto em razão de um desempenho inferior como por um desempenho superior – deverá enfrentar problemas em algum momento” (Goes; Laplane, 2004, p. 11). Isso porque, tradicionalmente, a escola trabalha numa perspectiva linear em busca de resultados, o que faz com que a presença de alunos “diferentes” desestabilize os objetivos e a estrutura dessa instituição.
Portanto, os alunos com o índice abaixo da média, identificados com deficiente, não podiam permanecer na escola regular.
Em relação à deficiência intelectual, a OMS (Organização Mundial da Saúde), citada por Raiça (2006), classifica a deficiência em: profunda (QI abaixo de 20), severa (QI entre 21 a 36), moderada (QI entre 37 a 50) e leve (QI entre 51 a 70). Porém, em virtude das mudanças sociais e educacionais, o teste de QI não é o único fator necessário para o diagnóstico da pessoa deficiente, visto que, há uma valorização das potencialidades e um olhar para os aspectos sociais de cada pessoa.
Schalock (2006, apud Raiça, 2006, p.22), membro da Associação Americana de Deficiência Mental (AAMR), entende que:
A deficiência intelectual não é uma condição estática, nem um traço pessoal, por isso não pode ser vista somente pelos “déficits”. Ela deve ser compreendida dentro de uma abordagem ecológica que considere o funcionamento da pessoa na interação com o mundo em que vive, observando as oportunidades e o apoio recebidos ao longo da vida.
É considerado um deficiente intelectual, para AAMR, de acordo com Nascimento (2007, p.42), a pessoa que possui um:
Funcionamento intelectual significativamente inferior à média, acompanhado de limitações significativas no funcionamento adaptativo em pelo menos duas das seguintes áreas de habilidades: comunicação, autocuidados, vida doméstica, habilidades sociais, relacionamento interpessoal, uso de recursos comunitários, auto-suficiência, habilidades acadêmicas, trabalho, lazer, saúde e segurança.
Estas limitações são resultantes de inúmeras causas e fatores de risco, tais como: pré-natais, perinatais e pós-natais. Conforme a AAMR (apud Raiça, 2006):
O diagnóstico de deficiência intelectual é realizado por psicólogos envolvendo os preceitos da etiologia (investigação das causas de determinada doença). Mas, é de fundamental importância que o professor esteja atento ao comportamento do aluno, pois, percebendo que o mesmo apresenta uma dificuldade no aprendizado significativamente superior aos demais, entre outros comportamentos, deverá procurar ajuda junto à equipe gestora e posteriormente encaminhá-lo ao psicólogo, pois quanto antes for “detectada” a deficiência, as possibilidades de intervenção serão melhores. O conhecimento das causas da deficiência intelectual é importante para sua prevenção. Muitas ações podem ser desencadeadas de modo a evitar a ocorrência de deficiência ou amenizar suas consequências.
De acordo com Mazzotta (2001), existem as prevenções primárias, secundárias e terciárias, conforme segue:
Para o Brasil (1997), a prevenção primária é a mais importante, pois as ações realizadas podem evitar o desencadeamento de deficiências.
Adotar medidas de prevenção à criança e à sua mãe contra doenças provocadoras de deficiências, orientações para reduzir casamentos consanguíneos, acompanhamento pré-natal, cuidados médicos no momento do parto e apoio ao recém-nascido, prevenção de acidentes e traumatismos, vacinação, prevenção de carências nutricionais e afetivas, controle do uso do álcool e de drogas por parte da mãe, eliminação de perigos ambientais, melhoria da nutrição da mãe e da criança, são exemplos de medidas de prevenção primária, ou seja, de evitação do aparecimento de deficiências. (p.35).
As medidas de prevenção devem incluir a família, a escola, os serviços de saúde, os órgãos de comunicação e toda a sociedade visando a divulgação de informações e a mudança atitudinal, para que no futuro, possamos viver numa sociedade consciente sobre a importância da prevenção e, sobretudo, uma sociedade mais inclusiva.
INCLUSÃO: DESAFIO DA ESCOLA
Na visão de Oliveira (2019), para tratar da inclusão escolar, o primeiro desafio a vencer é a questão da acessibilidade. Acessibilidade implica vencer as barreiras que impedem o aluno com deficiência de ter acesso aos ambientes escolares e apropriação do conhecimento.
As principais barreiras, de acordo com Sassaki (2005), a serem vencidas na escola são:
Para eliminação das barreiras curriculares e atitudinais, a política educacional brasileira vem enfrentando o desafio de construir uma escola de qualidade para todos, que reconhece e reafirma o direito que todos têm à educação.
O processo de inclusão, de acordo com Gotti (2019), pressupõe uma reestruturação do sistema de ensino, que deverá adequar-se às diferentes necessidades dos alunos. Cada escola, por meio do projeto pedagógico, organiza os tipos de apoio ou suportes que pode oferecer e organizar, como as adequações ou adaptações curriculares para que eles tenham acesso ao currículo. Essas adaptações são de pequeno e grande porte. Segundo Nascimento (2007), são vinculadas a diferentes responsáveis, sendo que, as adaptações de pequeno porte são de responsabilidade do professor e as de grande porte são de responsabilidade de instâncias político-administrativas superiores. As adaptações de pequeno porte, conforme Nascimento, referem-se basicamente a:
E as adaptações de grande porte, segundo Nascimento (2007), referem-se a: adaptação de acesso ao currículo, adaptação de objetivos, adaptação de conteúdos específicos, adaptação do método e organização didática, adaptação do sistema de avaliação e adaptação de temporalidade. Geralmente, as secretarias de educação indicam as escolas que já organizaram esses serviços, para servirem de referência, ou seja, as escolas inclusivas vão sendo construídas gradualmente.
Acreditamos que as escolas inclusivas que todos queremos, abertas à diversidade, ainda estão em processo de construção. À universidade, como afirma Gotti (2019), cabe a formação adequada dos profissionais. Os professores deverão conhecer as formas de aprender e as potencialidades de cada educando, nos diferentes níveis de ensino.
O MEC tem elaborado documentos que explicitam essa política de inclusão escolar, como os Parâmetros Curriculares Nacionais, os Referenciais para a Educação Infantil, os Referenciais para a Formação de Professores e as Adaptações Curriculares, estratégias para a educação de alunos com deficiência (Gotti, 2019).
A inclusão é um desafio que, na opinião de Fávero (2004), se for efetivado provocará melhorias na qualidade da educação, “pois para que os alunos com e sem deficiência possam exercer o direito à educação em sua plenitude, é indispensável que essa escola aprimore suas práticas, a fim de atender às diferenças” (p. 30). Entendemos, portanto, que a inclusão escolar é benéfica para todos, é um processo gradativo que caminha para a construção de uma sociedade inclusiva.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A igualdade de condições, em qualquer domínio da vida humana coletiva ou individual, supõe necessariamente igualdade de todos os seres humanos, no sentido de que não seja apenas formal ou não esteja apenas nas leis ou resoluções, mas que, pelo princípio de equidade, sejam reconhecidas a diferença e a necessidade de haver condições diferenciadas para que as práticas sociais e, particularmente, o processo educacional contemplem as dificuldades e possibilidades dos alunos em seus vários níveis, sejam elas físicas, sociais ou culturais.
Durante a realização deste estudo, percebemos que a inclusão do aluno com deficiência intelectual requer formação e capacitação dos professores, para que possam trabalhar efetivamente de forma inclusiva, atendendo assim, às necessidades de cada aluno.
A inclusão escolar está diretamente vinculada a ações políticas, pedagógicas, culturais e sociais, que torna possível a interação de crianças deficientes com crianças consideradas normais convivendo no mesmo espaço escolar, aprendendo e respeitando as diferenças.
O princípio essencial da inclusão é a valorização da diversidade e da comunidade humana. A partir do momento em que a inclusão escolar é totalmente adotada, abandona-se a ideia de que as crianças precisam se tornar normais para dar alguma contribuição para o mundo em que vivem.
As deficiências não impedem sua participação e contribuição na sociedade. Elas podem ser parte ativa da sociedade e agente participativo em seu próprio desenvolvimento.
Porém, para que aconteça efetivamente a inclusão, faz-se necessário o rompimento de algumas barreiras, arquitetônicas, atitudinais e curriculares. Podemos verificar que para eliminar as barreiras arquitetônicas as escolas adaptam rampas, banheiros e estacionamento. Sobre as barreiras atitudinais, um professor comentou sobre seu fazer pedagógico, ou seja, a prática docente é responsável pela eliminação desta barreira. E a eliminação das barreiras curriculares está voltada à ação didática, às adaptações de currículo, que é feita de acordo com cada professor.
Portanto, o processo de inclusão dos alunos com deficiência intelectual nos anos iniciais do Ensino Fundamental se dá de forma lenta e gradativa, uma vez que os professores, sem uma formação “adequada”, buscam incluir os alunos na escola regular. Sendo assim, nem sempre esse processo ocorre de maneira satisfatória, pois falta aos professores capacitação e formação continuada. Observamos que os professores devem estar preparados para receberem esses alunos e que só assim o processo de inclusão acontecerá efetivamente no ensino regular.
A construção de uma escola inclusiva se dá a partir do momento em que as diferenças foram potencializadas, pois a partir daí as pessoas com deficiências verão a sua diferença valorizada e poderão começar a sentir-se incluídos e verdadeiros cidadãos.
Por fim, devemos olhar para as pessoas buscando o que elas têm de melhor, ou seja, analisando seus potenciais. Devemos incluir os alunos, resgatando e valorizando seus potenciais.
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