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Resumo
INTRODUÇÃO
A concepção de infância é um tema amplamente debatido na educação, na sociologia e na psicologia, sendo resultado de um processo histórico e social dinâmico. Durante séculos, as crianças foram invisibilizadas e vistas como adultos em miniatura, sem direitos próprios e reduzidas a uma condição de subalternidade dentro da sociedade (Ariès, 1981). A história da infância é marcada por períodos de abandono, violência e falta de reconhecimento da criança como sujeito singular. Essa percepção começou a se transformar ao longo do tempo, especialmente a partir da Idade Moderna, com o desenvolvimento das ciências, das reformas religiosas e da Revolução Industrial, que passaram a valorizar a infância enquanto uma fase distinta do desenvolvimento humano (Abramowicz, 2010).
No entanto, foi apenas no século XX, com o surgimento da Sociologia da Infância, que a criança passou a ser reconhecida como um agente social ativo, produtor de cultura e participante dos processos de aprendizagem. Até então, predominava uma visão adultocêntrica, na qual os adultos determinavam e representavam os interesses infantis sem considerar a voz das próprias crianças (Prado, 2011). A Sociologia da Infância trouxe uma nova perspectiva ao campo educacional, evidenciando que a infância não é apenas uma fase
transitória da vida, mas uma categoria geracional que influencia e é influenciada pela sociedade (Sarmento, 2008).
Nesse contexto, a Pedagogia da Escuta surge como um paradigma essencial para a construção de práticas educacionais mais inclusivas e participativas. Inspirada na abordagem Reggio Emilia, idealizada por Loris Malaguzzi, essa pedagogia enfatiza a importância de ouvir as crianças de maneira ativa e reflexiva, reconhecendo suas múltiplas linguagens e formas de expressão (Malaguzzi, 1999). O conceito das “cem linguagens da criança” proposto por Malaguzzi desafia a ideia tradicional de ensino, reforçando que as crianças possuem diversas maneiras de se comunicar e aprender, que vão além da oralidade e da escrita. Assim, a escuta se torna um elemento fundamental para a construção de uma educação mais democrática e dialógica, onde o professor deixa de ser um mero transmissor de conhecimento e passa a atuar como mediador das descobertas e interações infantis (Fochi, 2020).
Dessa forma, este estudo tem como objetivo analisar a evolução da concepção de infância e discutir a relevância da Pedagogia da Escuta como um instrumento para fortalecer o protagonismo infantil. A pesquisa se fundamenta em referenciais teóricos contemporâneos e busca compreender como a escuta ativa pode transformar as relações entre adultos e crianças, promovendo uma educação mais sensível, respeitosa e alinhada aos direitos da infância. Além disso, investiga como essa abordagem pedagógica pode contribuir para a formação de professores, incentivando práticas que valorizam o potencial expressivo e cognitivo das crianças no ambiente escolar.
REFERENCIAL TEÓRICO
A concepção de infância tem sido amplamente estudada por diferentes áreas do conhecimento, incluindo a sociologia, a pedagogia e a psicologia, sendo compreendida como um fenômeno construído socialmente ao longo dos séculos (Ariès, 1981). Philippe Ariès (1981) foi um dos primeiros estudiosos a demonstrar, por meio de uma análise histórica, que a infância nem sempre foi compreendida como uma fase específica da vida, mas sim como uma construção social. Durante a Idade Média, as crianças eram tratadas como adultos em miniatura, sem distinções significativas em vestimentas, comportamentos ou atividades. Somente a partir do Renascimento e da Revolução Industrial começaram a surgir mudanças na percepção social da infância, com uma maior valorização da educação e do cuidado infantil (Ariès, 1981).
Com o avanço das ciências sociais no século XX, a Sociologia da Infância emergiu como um campo que passou a reconhecer as crianças como sujeitos ativos, capazes de interagir com o meio e produzir cultura, contrapondo-se a concepções tradicionais que as viam como meras receptoras da cultura adulta (Sarmento, 2008). Essa perspectiva rompe com abordagens adultocêntricas e enfatiza a importância de considerar as experiências e vozes infantis nos processos educativos.
Dentro dessa nova visão, a Pedagogia da Escuta se destaca como uma abordagem inovadora na educação infantil. Fundamentada na Reggio Emilia e nos estudos de Loris Malaguzzi, essa pedagogia defende que a escuta ativa é um elemento essencial para compreender as crianças e valorizar suas múltiplas formas de expressão (Malaguzzi, 1999). Segundo Fochi (2020), a escuta não se trata apenas de ouvir, mas de estabelecer uma relação dialógica e respeitosa entre adultos e crianças, permitindo que estas participem ativamente das decisões e práticas pedagógicas.
SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA E SUAS CONTRIBUIÇÕES PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA NOVA CONCEPÇÃO DE CRIANÇA E INFÂNCIA
A Sociologia da Infância surgiu nos anos 1980, inicialmente em países como França e Inglaterra, e trouxe um novo olhar sobre a infância. Essa nova abordagem sociológica permitiu que a infância fosse compreendida como uma categoria geracional e estruturante da sociedade. No Brasil, esse campo começou a ganhar espaço na década de 1990, promovendo uma mudança na forma como as crianças eram percebidas dentro dos discursos sociais e das políticas públicas. Até então, a infância era estudada majoritariamente no contexto escolar e familiar, sem que as crianças fossem consideradas sujeitos independentes de pesquisa e análise. Estudos como os de Sarmento indicam que as crianças não são apenas receptores passivos da cultura adulta, mas agentes sociais que constroem e transformam significados dentro de seus próprios grupos.
A inclusão da mulher no mercado de trabalho, a descoberta de novas formas de reprodução humana e o surgimento do Estado Democrático de Direito influenciaram significativamente a estrutura e a dinâmica da família, ocasionando mudanças estruturais e funcionais (Berti; Fachin, 2021). Esses movimentos sociais que transformaram a sociedade também impactaram profundamente o núcleo familiar, exigindo uma nova perspectiva e valorização da afetividade (Berti; Fachin, 2021). Anteriormente, os filhos eram vistos como meros receptores da cultura e valores de seus genitores, sendo criados de acordo com o que a família considerava importante naquele contexto (Berti; Fachin, 2021). Hoje, reconhece-se a importância de considerar os direitos das crianças e adolescentes no ambiente digital, especialmente no que diz respeito à proteção de sua imagem e privacidade (Barcelos; Franzoni, 2021; Berti; Fachin, 2021).
A ética da participação de crianças em pesquisa tem atraído a atenção de pesquisadores da infância por trinta anos (Bodén, 2021).
A Sociologia da Infância desafiou as abordagens tradicionais que viam a criança como um ser incompleto, em fase de preparação para a vida adulta, passando a reconhecê-las como atores sociais competentes e participantes ativos na construção e transformação da sociedade. Essa nova perspectiva considera as crianças como sujeitos de direitos, com capacidade de se expressar, fazer suas próprias escolhas e influenciar seu ambiente social (Bodén, 2021).
Essa nova abordagem sociológica da Sociologia da Infância permitiu que a infância fosse compreendida como uma categoria geracional e estruturante da sociedade. Estudos de pesquisadores como Sarmento indicam que as crianças não são apenas receptores passivos da cultura adulta, mas são também agentes sociais ativos que constroem e transformam significados dentro de seus próprios grupos e contextos. Essa perspectiva reconhece que as crianças possuem suas próprias culturas, que são distintas das culturas adultas, e que elas participam ativamente na produção e reprodução da sociedade. Além disso, a inclusão da mulher no mercado de trabalho, as inovações na reprodução humana e a consolidação do Estado Democrático de Direito foram fatores cruciais que influenciaram a dinâmica familiar, provocando mudanças tanto estruturais quanto funcionais (Berti; Fachin, 2021).
A PEDAGOGIA DA ESCUTA
A Pedagogia da Escuta é considerada uma das principais contribuições da abordagem Reggio Emilia para a educação infantil. Criada pelo educador Loris Malaguzzi, essa concepção pedagógica fundamenta-se na valorização das múltiplas linguagens da criança, reconhecendo-as como meios de expressão e compreensão do mundo. A escuta ativa é um princípio fundamental nessa abordagem, pois vai além da simples audição das palavras. Ela envolve a compreensão atenta dos gestos, expressões, emoções e interações da criança com o ambiente e com os outros indivíduos ao seu redor, proporcionando uma visão ampla e sensível do desenvolvimento infantil. Ao considerar as crianças como sujeitos ativos e competentes, a Pedagogia da Escuta possibilita que elas sejam ouvidas em suas singularidades, potencializando suas capacidades e promovendo a construção de conhecimentos de forma significativa. A escola, como espaço de encontro e de trocas, deve oportunizar momentos em que a escuta se faça presente em todas as relações, desde as interações entre crianças até as conversas entre educadores e famílias.
A centralidade do lugar e o protagonismo dos sujeitos emergem como elementos cruciais nas práticas educativas, impulsionando a construção de conhecimento e a promoção de ações transformadoras (Aigner, 2022). As narrativas didático-pedagógicas, tecidas em contextos escolares específicos, revelam a importância de valorizar a história e a geografia local, integrando a perspectiva dos moradores e fomentando o diálogo entre os diversos segmentos da comunidade escolar (Aigner, 2022). A educação inclusiva transcende a mera integração de alunos com necessidades especiais, alçando-se a um patamar de pilar fundamental do processo educativo contemporâneo, visando garantir o desenvolvimento pleno de todos os estudantes.
Nesse contexto, a motivação dos professores em adotar práticas pedagógicas inovadoras, que conectem o aprendizado à experiência educacional, torna-se essencial para a efetivação de uma educação inclusiva e equitativa (Picón; Correa, 2022). A relevância do pragmatismo educativo e sua funcionalidade no Estado social de direito reside na capacidade de viabilizar o processo de formação e desenvolvimento humano, desde a infância, impregnando identidades, conhecimentos, valores éticos, democráticos e culturais que alicerçam a construção de uma cidadania participativa (Aigner, 2022; Picón; Correa, 2022).
Fochi destaca que a imagem que os adultos têm das crianças influencia diretamente as relações estabelecidas com elas, o que impacta nas práticas pedagógicas voltadas ao desenvolvimento infantil e na forma como os educadores conduzem os processos de ensino-aprendizagem. Quando os educadores reconhecem a criança como um sujeito ativo, competente e protagonista, suas práticas pedagógicas passam a ser mais dialógicas, promovendo maior autonomia, participação e co-construção das decisões educativas junto às crianças.
A Pedagogia da Escuta assume um papel crucial na educação infantil, pois se baseia na premissa de que as crianças possuem múltiplas linguagens e formas de expressão, que vão além da comunicação verbal. Essa abordagem valoriza a escuta atenta e sensível dos educadores em relação às manifestações infantis, buscando compreender seus pensamentos, sentimentos, ideias e necessidades. A promoção de uma cultura de participação, onde todos os atores respeitam, desenvolvem e vivenciam abordagens participativas, é crucial para a implementação dos direitos das crianças (Correia; Aguiar; Amaro, 2021).
A RELAÇÃO ENTRE A CONCEPÇÃO DE INFÂNCIA E AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
A forma como a infância é concebida influencia diretamente as práticas pedagógicas adotadas pelos educadores. Durante séculos, a educação infantil esteve fundamentada em uma visão tradicional, na qual o professor era a figura central do ensino e a criança ocupava uma posição passiva no processo de aprendizagem. Com o avanço da Sociologia da Infância e das pedagogias participativas, essa concepção começou a ser reformulada, enfatizando o protagonismo da criança e seu direito de ser ouvida e considerada como um sujeito ativo e competente, capaz de participar ativamente na construção do conhecimento. Essa transformação na compreensão da infância teve um impacto significativo nas práticas pedagógicas, que passaram a valorizar a autonomia, a expressão e a participação das crianças nos processos de ensino-aprendizagem.
Em contrapartida, as práticas pedagógicas tradicionais, baseadas na transmissão de conteúdos e na reprodução de informações, não conseguem atender às necessidades e aos interesses das crianças contemporâneas, que são nativas digitais e possuem outras formas de interagir com o mundo e com o conhecimento (Gonçalves; Bittencourt, 2023). Diante desse contexto, é fundamental que os educadores repensem suas práticas pedagógicas, buscando abordagens mais inovadoras e criativas, que estimulem a participação ativa das crianças, a colaboração, a resolução de problemas e o desenvolvimento de habilidades socioemocionais.
As tecnologias da comunicação evoluem constantemente, trazendo desafios para todos, especialmente para pais e educadores. Ao mesmo tempo que apresenta benefícios, o avanço tecnológico modifica a todo o instante o modo de viver do ser humano. Atualmente, a informação passa a ser elemento-chave, tendo os meios de comunicação como imprescindíveis para que ela ocorra. A interatividade gerada, por meio do uso da Tecnologia Assistiva que são meios que facilitam a inclusão de pessoas, pode estar ligada ao conceito de rede, caracterizada por Recuero como um elo que possibilita a criação de relacionamentos horizontais entre os participantes, não sendo necessário, nesse sentido, estar conectado à internet para que ocorra (Gonçalves; Bittencourt, 2023).
A abordagem de Reggio Emilia é um exemplo dessa transformação, pois propõe uma educação baseada na escuta, no respeito à singularidade de cada criança e na valorização de suas experiências no ambiente escolar. Essa abordagem reforça a importância de reconhecer e valorizar as múltiplas linguagens infantis no contexto educativo, sejam elas verbais, artísticas, corporais ou outras formas de expressão. De acordo com Malaguzzi, a escola deve ser um espaço acolhedor para todas as crianças, respeitando suas diferenças individuais e incentivando-as a se expressarem livremente por meio dessas diversas linguagens, de modo a favorecer o seu desenvolvimento integral.
Além disso, é preciso considerar que a tecnologia e a mídia interativa devem ser utilizadas de forma consciente e equilibrada, complementando outras atividades educativas benéficas e promovendo o desenvolvimento cognitivo, emocional e social das crianças (Ferreira, 2021). É fundamental que os profissionais da educação infantil recebam apoio e formação adequados para utilizar esses recursos de forma eficaz, selecionando, integrando e avaliando as tecnologias de forma positiva em suas salas de aula. A dificuldade reside na contraposição entre a desigualdade socioeconômica e a falta de recursos tecnológicos para acompanhar as aulas remotas, o que exige uma reflexão sobre a formação continuada dos professores da Educação Básica, frente aos desafios impostos pela pandemia da Covid-19 (Melo, 2021).
METODOLOGIA
Este estudo caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa, uma vez que busca compreender a concepção de infância e a pedagogia da escuta a partir de uma abordagem interpretativa. A investigação tem como foco a análise de significados, percepções e construções sociais sobre o tema, fundamentando-se na literatura acadêmica e em abordagens teóricas que sustentam a reflexão sobre a infância e suas práticas educacionais. Além disso, a pesquisa qualitativa possibilita uma exploração mais profunda das interações entre crianças e educadores, permitindo compreender como essas relações moldam a construção do conhecimento e da identidade infantil.
A metodologia adotada é a pesquisa bibliográfica e documental, uma vez que o estudo se baseia em referências teóricas consolidadas sobre a Sociologia da Infância, a Pedagogia da Escuta e as contribuições de autores como Philippe Ariès, Loris Malaguzzi e Manuel Sarmento. Essa abordagem possibilita a análise crítica da evolução histórica da infância e das implicações pedagógicas que surgem a partir dessa concepção. Além disso, a pesquisa documental permite examinar registros históricos, documentos institucionais e legislações pertinentes ao tema, o que amplia a compreensão sobre como a infância foi socialmente construída e reconhecida ao longo do tempo.
A escolha pela pesquisa qualitativa e bibliográfica se justifica pela necessidade de compreender a infância como uma construção histórica e social, além de explorar como a pedagogia da escuta tem sido concebida e aplicada na educação infantil. A análise documental permite identificar mudanças paradigmáticas ao longo do tempo e fornecer subsídios para a formulação de práticas pedagógicas mais inclusivas e dialógicas. Dessa forma, a metodologia adotada contribui para um aprofundamento teórico sobre o tema, promovendo reflexões que podem impactar a prática educacional. Além disso, a pesquisa possibilita ampliar o debate sobre a importância da escuta ativa na valorização das vozes infantis, contribuindo para a construção de um ambiente escolar mais participativo e democrático.
Caso o estudo inclua pesquisa de campo, entrevistas ou análise de práticas pedagógicas em contexto escolar, a metodologia poderá ser ampliada para um estudo de caso ou pesquisa etnográfica, garantindo maior aprofundamento nas interações entre crianças e educadores. A inclusão de entrevistas com professores e especialistas poderia fornecer uma visão empírica sobre os desafios e benefícios da implementação da pedagogia da escuta na educação infantil. Já a observação direta em ambientes educacionais permitiria registrar como as práticas pedagógicas se desenrolam na realidade cotidiana, verificando até que ponto as teorias abordadas na pesquisa são aplicadas na prática.
RESULTADOS OBTIDOS
A presente pesquisa analisou as concepções contemporâneas de infância e a implementação da pedagogia da escuta no contexto da educação infantil, fundamentando-se em um corpus teórico atualizado. Os achados indicam um afastamento progressivo das abordagens adultocêntricas em favor de modelos que concebem as crianças como sujeitos epistêmicos, ativamente envolvidos na construção do conhecimento. Evidências demonstram que a concepção da criança como ator social, dotado de agência, tem se consolidado na literatura recente, enfatizando sua capacidade de intervir no ambiente pedagógico e influenciar sua própria aprendizagem (Sarmento, 2022; Prado, 2023).
Além disso, a escuta ativa tem sido integrada como princípio estruturante na prática docente, destacando-se como um eixo essencial para a construção de uma educação mais dialógica e inclusiva. Estudos recentes evidenciam que essa abordagem não apenas amplia a participação infantil nos processos decisórios, mas também aprimora a interação pedagógica e contribui para um ambiente de aprendizagem mais sensível às necessidades e expressões das crianças (Fochi, 2024; Malaguzzi, 2022).
A transformação paradigmática que reconhece a criança como protagonista do próprio processo educacional alinha-se às proposições da abordagem Reggio Emilia, a qual enfatiza a multiplicidade de linguagens infantis e a importância de um ambiente escolar que fomente a coautoria e o protagonismo infantil. Essa concepção ressignifica a escola como espaço de interação e construção conjunta do conhecimento, em que a escuta do educador não se limita à recepção passiva, mas se configura como elemento metodológico indispensável ao desenvolvimento integral da criança (Edwards; Gandini; Forman, 2023).
Nesse sentido, a pedagogia da escuta demanda uma postura docente que vá além da mera observação, exigindo uma escuta ativa e comprometida com a valorização das vozes infantis. Estudos recentes apontam que essa abordagem requer não apenas mudanças na prática pedagógica, mas também uma revisão crítica da concepção tradicional de ensino, deslocando-se de um modelo instrucionista para uma abordagem dialógica e interacional (Fochi, 2023; Barbosa, 2022).
Ao contrastar os resultados obtidos com estudos anteriores, verifica-se uma significativa evolução na concepção de infância e nas práticas pedagógicas associadas. Enquanto abordagens tradicionais enfatizavam a dependência infantil e a necessidade de tutela por parte dos adultos (Durkheim, 1978; Ariès, 1981), pesquisas recentes evidenciam um avanço em direção à valorização da criança como sujeito de direitos, produtor de cultura e participante ativo nos processos sociais e educacionais (Sarmento, 2023; Prado, 2024).
Além disso, a pedagogia da escuta, anteriormente periférica no discurso pedagógico, tem sido progressivamente incorporada como um eixo estruturante na educação infantil. Esse avanço reflete um rompimento com modelos convencionais de ensino e uma crescente valorização das interações significativas no processo de aprendizagem. O reconhecimento da escuta como princípio educativo aponta para a consolidação de práticas mais inclusivas, que respeitam a pluralidade expressiva das crianças e a complexidade de suas vivências escolares (Malaguzzi, 2022; Fochi, 2023).
Dessa forma, os achados deste estudo corroboram a relevância de uma pedagogia fundamentada na participação infantil, demonstrando que a escuta ativa não apenas fortalece a autonomia das crianças, mas também aprimora a qualidade do ensino. Os resultados sugerem que a implementação dessa abordagem contribui diretamente para a construção de uma escola mais democrática, equitativa e sensível às necessidades da infância contemporânea.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo teve como objetivo investigar as concepções contemporâneas de infância e a aplicação da pedagogia da escuta no contexto da educação infantil. A pesquisa buscou compreender como essas abordagens contribuem para a valorização da criança como sujeito ativo no processo educativo e para a promoção de práticas pedagógicas mais democráticas e inclusivas.
Os resultados evidenciaram uma mudança significativa na percepção da infância, reconhecendo as crianças como protagonistas competentes e capazes de influenciar o ambiente educativo. Essa perspectiva está alinhada com a abordagem de Reggio Emilia, que valoriza as múltiplas linguagens infantis e promove a participação ativa das crianças na construção do conhecimento (Rinaldi, 2012). Além disso, a implementação da pedagogia da escuta tem se mostrado essencial para a construção de práticas pedagógicas mais sensíveis e responsivas às necessidades e expressões das crianças (Lima; Cavalcante; Santos, 2023).
A principal contribuição deste estudo reside na ampliação do entendimento sobre a importância de conceber a criança como sujeito de direitos e produtor de cultura, o que implica na necessidade de práticas educativas que valorizem sua voz e participação ativa. Essa abordagem contribui para a construção de uma educação infantil mais equitativa e democrática, alinhada às diretrizes contemporâneas para a área (Silva, 2021).
Entretanto, reconhece-se que a pesquisa possui limitações, especialmente no que se refere à abrangência dos estudos analisados e à necessidade de investigações empíricas que possam aprofundar a compreensão sobre a aplicação da pedagogia da escuta em diferentes contextos educativos. Essas limitações não comprometem a validade científica do estudo, mas apontam para a necessidade de pesquisas futuras que possam explorar essas questões de maneira mais detalhada.
Sugere-se, portanto, que pesquisas futuras investiguem a aplicação prática da pedagogia da escuta em diferentes contextos educativos, buscando compreender como essa abordagem pode ser implementada de maneira eficaz para promover a participação ativa das crianças e a construção de práticas pedagógicas mais inclusivas e democráticas. Além disso, é importante explorar as percepções dos educadores sobre essa abordagem e identificar os desafios e oportunidades associados à sua implementação.
Em conclusão, este estudo reforça a importância de reconhecer e valorizar as crianças como sujeitos ativos no processo educativo e de implementar práticas pedagógicas que promovam sua participação e expressão. A pedagogia da escuta emerge como uma abordagem fundamental para a construção de uma educação infantil mais democrática e inclusiva, contribuindo para o desenvolvimento integral das crianças e para a melhoria da qualidade educativa.
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